Juros no mercado futuro, que balizam operações dos bancos, chegaram a 9%, quase 1,5 ponto percentual mais alto do que em abril e com spreads apertados instituições preparam repasse
O mercado futuro de juros, que baliza as operações de crédito, está embutindo nos preços uma Selic de9%ao ano e os bancos já preparam o repasse de custo para as linhas de crédito.A queda dos spreads, a diferença entre a taxa básica de captação dos bancos e a que efetivamente remunera os empréstimos, chegou a um limite e por isso a decisão, mesmo dos bancos públicos, é de repassar o custo do dinheiro. A alta do crédito será maior do que a própria Selic, hoje em8,25% ao ano, porque os mercados já estão considerando que o Banco Central fará novas elevações dos juros, em função da dura ata do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada ontem que revela que ainda há preocupação com a inflação. Na própria ata, os membros do Copom consideram “oportunas iniciativas no sentido de moderar concessões de subsídios por intermédio de operações de crédito”, já que é um dos pilares para segurar a inflação.
A expectativa é de que o custo do crédito se eleve também para o crédito destinado ao investimento, de mais longo prazo. “Não dá para fazer omeletes sem quebrar os ovos", diz Marcelo Giufrida, diretor do BNP Paribas. "O governo teve de escolher entre segurar o crédito agora ou deixar a inflação seguir sua trajetória.
"A queda dos spreads chegou ao limite", diz Carlos Macedo, analista do Goldman Sachs. Ou seja, os bancos não estão mais dispostos a espremer mais suas margens de ganho. No caso das linhas comerciais, os maiores bancos brasileiros já admitiram ao Brasil Econômico que estão revendo suas taxas.
No caso dos empréstimos para investimento, o efeito pode até ser menor, mas igualmente inevitável. Boa parte dos financiamentos hoje são obtidos no BNDES - e, embora o presidente Luciano Coutinho tenha afirmado em São Paulo no dia 3 que a alta da Selic não influenciaria os custos das linhas do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), cujas taxas estão definidas em 3,5% ao ano até dezembro, a TJLP, que corrige quase 90% dos empréstimos do banco, pode sofrer um ajuste no final deste mês, quando o Conselho Monetário Nacional (CMN) se reúne para definir a taxa válida até 30 de setembro. Além da Selic, um dos componentes do cálculo da taxa é a própria inflação. As captações por meio de debêntures e de captações externas também já estão mais caras, influenciadas ainda pelo ajuste do fluxo global de moedas.
Segundo dados do Banco Central, o custo médio de captação de todos os empréstimos do sistema financeiro nacional (incluindo linhas do BNDES) subiu de 6,4% ao ano em janeiro para 6,8% em abril - e foi em maio que a deterioração das expectativas se acentuou. Já a taxa dos empréstimos está patinando - mas terminou abril em 18,5%, ante18%registrado em dezembro.
Bancos públicos e privados vão elevar juro para consumidor
Depois de liderar no último ano o ritmo de concessão de empréstimos ao consumo, os bancos públicos devem ser os primeiros a repassar a alta da Selic para o crédito. E serão seguidos pelos bancos privados, todos eles com níveis de spreads que não estão mais dispostos a baixar para segurar taxas. Em nota, o Santander informou que está avaliando os impactos da decisão da última reunião do Copom e a eventual necessidade de realinhamento de sua linha de produtos, conforme as condições do mercado. E o mercado já aponta para uma Selic de 9%ao ano, uma alta de 1,5 ponto percentual desde que o Banco Central começou a elevar juros. Itaú e Banco do Brasil seguem a mesma tônica.
A Caixa Econômica Federal também não descarta elevar as taxas. “Temos feito algumas políticas buscando minimizar o impacto, mas isso não quer dizer que não vamos aumentar os juros. De qualquer maneira, asseguramos que a Caixa sempre vai ter as melhores taxas de mercado”, afirma Marcio Percival, vice-presidente de Finanças do banco. “Para isso, estamos revendo nossos processos a fim de reduzir custos,melhorar a nossa eficiência e garantir a rentabilidade no fim do ano.”
Nesse novo cenário, os bancos privados,que já estavam mais cautelosos na concessão de crédito, podem enxugar ainda mais a liberação de crédito para tentar mitigar a possível alta da inadimplência. Com isso, seguem a recomendação feita pela própria ata do Copom que sugere o fim de subsídios para o crédito, como bjetivo de segurar inflação.
“Os bancos públicos estavam mais blindados, tanto é que a carteira cresceu em apenas um dígito, enquanto, nos privados, o crescimento foi de dois dígitos”, afirma José Augusto Salles, analista da Lopes Filho Associados. Os bancos públicos, que respondem por quase metade do mercado de crédito do país, aumentaram em 29,1% a sua carteira de empréstimos nos últimos 12meses até abril, de acordo como BC. Já nos bancos privados o avanço foi de 6,3%. Ao mesmo tempo, houve queda de 6,6% nas receitas do Bradesco, Itaú e Santander com crédito no primeiro trimestre do ano.
“No caso dos bancos públicos, está cada vez mais difícil matar no peito uma alta de juros e não repassar. Precisariam, por exemplo, ter mais exposição a risco para compensar o achatamento de crédito”, complementa Luis Miguel Santacreu, analista da Austin Rating. Outra consequência é que a inadimplência, que vinha dando sinais de estabilização, pode voltar a ter uma inclinação para cima. Segundo dados do BC, os calotes ficaram em 3,6%, em abril, março e fevereiro. “A expectativa era de que houvesse uma queda na inadimplência, no segundo semestre, e essa alta da Selic pode retardar isso”, diz Aloisio Lemos, analista da Ágora.
Cenário externo, já afeta financiamento de longo prazo
A alta dos juros vai atingir também as fontes de financiamento de longo prazo para investimentos, ainda que em menor grau do que nos empréstimos comerciais, segundo analistas. As captações por meio de debêntures são automaticamente afetadas, já que acompanham a taxa Selic. Já as captações externas também estão sendo afetadas pelo cenário internacional, com os juros do tesouro americano influindo nos custos que já subiram um ponto percentual. Além disso, boa parte dos financiamentos para investimentos são obtidos no BNDES, que são corrigidos basicamente pela Taxa de Juros de Longo Prazo.A cada final de trimestre essa taxa é reajustada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). A alta é considerada inevitável já que um dos componentes do cálculo da taxa é, exatamente, a inflação.
De qualquer maneira, o governo deu sinais de que pretende continuar abrindo as torneiras do seu banco de desenvolvimento para irrigar o mercado de crédito que, com juro maior, tende a secar. Ontem, o Tesouro Nacional foi autorizado, pela MP 618, a injetar mais R$ 15 bilhões em títulos públicos para reforçar o capital BNDES. A última operação desse tipo foi em dezembro, quando o Tesouro emprestou R$ 15 bilhões para o banco. De acordo com o texto da MP, o aporte de recursos permite o enquadramento do BNDES dentro dos limites de segurança para ampliar o patrimônio de referência e continuar a emprestar recursos sem pôr em risco o capital da instituição financeira. Os desembolsos do BNDES atingiram R$ 54,4 bilhões entre os meses de janeiro e abril, com aumento de 59% em 12 meses. A alta abrangeu todos os setores apoiados pelo Banco, com destaque para a indústria, que respondeu por 37% dos desembolsos totais no período (R$ 20,2 bilhões e expansão de 113% em relação ao mesmo período do ano anterior).A infraestrutura ficou com participação de 27%.Os desembolsos do BNDES PSI atingiram R$ 28,5 bilhões em janeiro/abril deste ano, com quase 90 mil operações efetuadas. Nos últimos 12 meses, até abril, as liberações do PSI acumularam R$ 65,1 bilhões, com alta de 94% na comparação com os 12 meses anteriores.
As debêntures, alternativa de financiamento de longo prazo no mercado de capitais, também será afetada pela alta dos juros,uma vez que o CDI é o indexador preferido pelos investidores. Neste ano, 78das 90operações foram indexadas ao CDI, que segue de perto a Selic. O volume captado em 2013 já vinha fraco - até dia 16 de maio, segundo dados do portal debentures. com.br, mantido pela Anbima, o total era de R$ 21,1 bilhões. Em2012, o total superou R$ 88 bilhões.
Veículo: Brasil Econômico