Ata deixa de recomendar "cautela" e analistas preveem que a Selic no final do ano estará em no mínimo 8,75%
Copom citou 'tendência de apreciação do dólar', ausente no texto de abril, mas não tratou do impacto nos preços
O Banco Central não acha mais que a fragilidade da economia, no Brasil e no mundo, recomenda "cautela" na alta dos juros para combater a inflação doméstica.
Ou, pelo menos, não se deu ao trabalho de repetir a palavra, destacada em março e abril, na ata da reunião da semana passada de seu Comitê de Política Monetária, que elevou a taxa de juros de 7,5% para 8% ao ano.
Divulgado ontem, o documento encorajou apostas de analistas numa escalada mais agressiva da taxa do BC, que, pelas opiniões coletadas pela Folha, deve fechar o ano entre 8,75% e 9,25%. Até a semana passada, a expectativa mais consensual para dezembro era de juros de 8,5%.
Com a perspectiva de juros mais altos, as projeções para o crescimento econômico do país entraram em queda.
Os recados do BC --e as tentativas de interpretação no mercado-- se concentram em apenas 4 dos 75 parágrafos da ata, escrita na tradicional linguagem cifrada, em boa parte com trechos idênticos aos de atas anteriores.
No 28º, observações sobre as incertezas da conjuntura e a importância de uma política monetária cautelosa deram lugar a uma exposição dos riscos inflacionários e da necessidade de "intensificação do ritmo de ajuste das condições monetárias".
Na leitura do Bradesco, o BC deixou de lado a hipótese de que uma piora da crise no mundo desenvolvido pudesse esfriar ainda mais a economia do Brasil e reduzir o fôlego da inflação. O banco elevou de 8,75% para 9% sua projeção para os juros.
André Perfeito, da corretora Gradual, tem a mesma previsão para o patamar da taxa em dezembro. "Pelo que nos parece do tom do documento, serão mais duas altas de 0,5 ponto percentual."
Para a LCA Consultores, o aperto monetário pode ser até maior. Mais enfática, a corretora Nomura subiu sua conta de 8,25% para 9,25%.
Em relatório, a Nomura menciona o 33º parágrafo da ata, no qual foi introduzida a afirmação de que "o balanço de riscos para o cenário prospectivo [para a inflação] se apresenta desfavorável".
A frase não chegou a impressionar o Itaú, para o qual a inflação acumulada em 12 meses recuará no segundo semestre e os juros do BC não passarão de 8,75%.
Em outra novidade, o BC aponta no 24º parágrafo que os gastos privados e públicos ("absorção interna", no economês) têm crescido mais que o Produto Interno Bruto, ou seja, a produção nacional.
A observação pode sinalizar preocupação tanto com o aumento das despesas do governo quanto com o das importações de bens e serviços --um dos motivos da alta das cotações do dólar.
No parágrafo anterior, o BC cita a "tendência de apreciação do dólar", que inexistia até abril, mas não trata do impacto do câmbio sobre os preços. Foi mantido, com poucas alterações, o trecho que trata do aquecimento do mercado de trabalho --trunfo político do governo-- e do peso inflacionário dos reajustes.
Veículo: Folha de S.Paulo