De janeiro a julho de 2009, o Brasil importou da China um volume de vestuário e confecções 9,7% maior do que o total desembarcado no mesmo período de 2008. Esse aumento de volume em um contexto de retração de consumo no mercado mundial poderia ser explicado por um assédio maior dos fornecedores chineses, com preços mais baixos que os cobrados anteriormente. Não foi exatamente isso, porém, o que aconteceu. Nem no vestuário, nem no total das importações de bens de consumo.
Dados levantados pela Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex) revelam elevação dos preços médios de bens de consumo duráveis e não duráveis importados da China no segundo trimestre de 2009 em relação ao mesmo período do ano passado e até mesmo na comparação com o terceiro trimestre de 2008, quando os termos de troca atingiram o patamar mais elevado dos últimos anos. Os preços médios de importação de bens não duráveis da China ficaram 7,8% acima daqueles praticados no segundo trimestre de 2008 e 2% acima dos valores do terceiro trimestre. No total dos não duráveis importados pelo país (todas as origens), o preço andou na direção oposta e caiu 1,1% em relação ao segundo trimestre do ano passado.
Também em bens duráveis o preço médio dos itens importados da China aumentou. Entre abril e junho deste ano, esses bens registraram o maior nível de preço médio desde o terceiro trimestre de 2001, com alta de 6,9% em relação a igual período de 2008 e de 3,4% em relação ao terceiro trimestre do ano passado. No conjunto das importações de bens de consumo duráveis o preço também subiu, mas menos do que os chineses: 3,3% em relação ao segundo trimestre do ano passado.
Um mercado interno que se manteve capaz de consumir produtos mais sofisticados em um momento de crise mundial possibilitou uma mudança no mix de importados da China e o país importou produtos de maior valor agregado mesmo com a valorização do real. O quadro acelerou um fenômeno que é considerado, pelo governo, uma tendência. Para Welber Barral, secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento (MDIC), a elevação de preços dos produtos chineses é uma tendência a médio e longo prazos. O aumento é puxado por adequação paulatina da legislação chinesa, inclusive das leis trabalhistas, aumentando o custo dos produtos, além de um controle maior sobre os subsídios dados pela China.
Barral lembra que a China tem fabricado produtos de maior valor agregado e o mercado interno brasileiro absorveu essas mercadorias durante os primeiros sete meses de 2009. Ele exemplifica com os produtos de toucador, cujas importações triplicaram em termos de volume nos primeiros sete meses deste ano em relação ao mesmo período de 2008. A elevação de quantum foi acompanhada pelo aumento do preço por quilo, que passou de US$ 2,83 de janeiro a julho de 2008 para US$ 3,4 na média de 2009. Para Barral, produtos mais sofisticados e menos tradicionais na pauta de importação do Brasil, antes mais vendidos para EUA e Europa, foram desovados no Brasil e levantaram a média de preços dos bens de consumo.
Importadora e fabricante de eletroportáteis, a Mallory compra da China cerca de 40% do que vende no Brasil. Alberto Betrian, gerente-geral da empresa, diz que não houve redução de preços das mercadorias chinesas importadas. "Os preços do primeiro semestre mantiveram-se praticamente iguais aos do mesmo período de 2008", informa. Somente em relação ao terceiro trimestre do ano passado, quando os preços estavam elevados, houve queda média entre 5% e 10%.
Para Betrian, não houve queda de preços no primeiro semestre porque a empresa manteve a política de importar produtos de maior valor agregado do ponto de vista tecnológico. Ele explica que a Mallory fabrica no Brasil alguns produtos que também importa, mas as mercadorias trazidas da China são mais sofisticadas. Ele exemplifica com o multiprocessador. "No Brasil fabricamos modelos mais simples e importamos da China os mais modernos, com mais funções", diz.
Mesmo com a crise, diz Betrian, a empresa renovou os modelos importados. Segundo ele, apenas algumas renovações foram adiadas em razão da crise porque o mercado interno brasileiro manteve a demanda por produtos com maior agregado tecnológico. "Há um mercado gourmet crescente no Brasil e que tem demanda por eletrodomésticos com maior desenvolvimento. As pessoas também querem mais design, o que aumenta o preço do produto."
Os dados do MDIC confirmam a tendência de elevação de preços dos importados da China. O quilo dos bens de consumo não duráveis aumentou de US$ 6,33 (janeiro a julho de 2008) para US$ 7,44 nos primeiros sete meses de 2009. Na mesma comparação, o quilo dos bens de consumo duráveis aumentou de US$ 4,46 para US$ 4,6.
A explicação do fenômeno dos preços não é uniforme para todos os tipos de produtos. A Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit) confirma o aumento de preços dos importados da China em 2009, mas credita isso à fiscalização e não à mudança no mix de importados. "O controle maior sobre os valores declarados no desembaraço aduaneiro começou em 2007 e tem provocado aumento nos preços dos tens chineses", defende Aguinaldo Diniz Filho, presidente da Abit. Segundo os dados da associação, o preço por quilo dos desembarques de vestuário da China têm subido. De janeiro a junho de 2009 o quilo do vestuário chinês custou US$ 13,68. No mesmo período de 2008, ficou em US$ 13,09; e em 2007, e, US$ 9,55.
José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), acredita que a fiscalização explica a tendência de elevação de preços no caso das confecções. Castro, porém, considera surpreendente o aumento de preços verificados dos bens importados da China. Ele lembra que durante o primeiro semestre de 2009 o valor médio do dólar estava mais alto. Isso, na verdade, teria desestimulado as importações. "É surpreendente que mesmo com o câmbio mais valorizado e com crise, o mercado brasileiro tenha sido capaz de absorver produtos mais sofisticados do que os que costumava importar."
Veículo: Valor Econômico