Em nutrição, Nestlé corre atrás da Danone

Leia em 7min 20s

Alimentos: Grupo suíço lança produto na Europa e, segundo analistas, poderia fazer aquisições no setor

 

A Nestlé começará a vender bebidas para combater a desnutrição entre os mais idosos numa tentativa de revitalizar o seu setor de nutrição, que tem ficado abaixo das projeções de vendas e de lucros em cada ano, desde que as projeções foram criadas, em 2006. Suplementos como o SeniorActiv serão colocados à venda na Suíça neste ano, disse a divisão de nutrição da companhia, em comunicado. O produto tem proteínas, cálcio e vitamina D e ajuda a fortalecer múculos e a evitar fraturas ósseas, disse a maior companhia de alimentos do mundo.

 

O lançamento faz parte da estratégia da fabricante dos chocolates Suflair e do café Nescafé para enfrentar a rival de menor porte Danone, no setor de nutrição médica e de prevenção da saúde - um mercado que, segundo a consultoria Britânica Sanford C. Bernstein, está crescendo a taxas de 9% ao ano. O faturamento de vendas da divisão de nutrição da Nestlé aumentou 2% nos nove primeiros meses de 2009, abaixo do crescimento de 11% na divisão de nutrição médica da francesa Danone, e um quinto da meta de longo prazo da companhia suíça.

 

"A divisão de nutrição está claramente frustrando as expectativas da empresa e Nestlé não pode continuar assim", disse Stephen Pope, estrategista-chefe global de renda variável do Cantor Fitzgerald Europe, que tem feito a cobertura da Nestlé por seis anos. "Em relação ao conjunto da companhia, a nutrição é uma unidade muito importante e é uma área a qual eles estão tentando fazer deslanchar". A porta-voz da Nestlé Nina Backes não quis fazer comentários sobre o desempenho da unidade de nutrição ter ficado abaixo das expectativas dos analistas.

 

O CEO da companhia com sede em Vevey, na Suíça, Paul Bulcke, que em 2008 se comprometeu a tornar a Nestlé a maior companhia de produtos alimentícios saudáveis do mundo, está sendo criticado pesadamente depois de indicar que a companhia suíça provavelmente ficará abaixo das metas de crescimento em 2009. No início do mês, ele comprou os negócios de pizza congelada Tombstone e DiGiorno da Kraft por US$ 3,7 bilhões, uma iniciativa que acelerará o crescimento do faturamento, mas que agrega ao portfólio de produtos da empresa pizzas com até 70% da quantidade diária recomendada de gordura saturada.

 

Já a Nestlé Nutrition tem linhas de produtos como o programa de emagrecimento Jenny Craig - que enfrentou uma debandada de clientes devido à recessão nos EUA. O setor de nutrição da Danone, por sua vez, está focado em produtos de margens mais elevadas, segundo Carl Short, analista de renda variável do Standard & Poor's.

 

"A Danone se sairá melhor simplesmente porque a companhia toda agora está realmente orientada para a nutrição", disse Jean-marie L´Home, analista da corretora Aurel-Leven, com sede em Paris. "A Nestlé é grande demais para se concentrar apenas em nutrição". As vendas da Nestlé são cerca de quatro vezes maiores que as da Danone. A Nestlé disse que planeja lançar também o SeniorActiv em outros países europeus, uma vez que até 40% dos pacientes hospitalizados estão desnutridos. Aproximadamente 90% dos idosos são deficientes em vitamina D, e metade não recebe proteínas ou cálcio suficientes, segundo dados da companhia. O produto também inclui ingredientes que estimulam a saúde digestiva.

 

A companhia ainda não investiu o suficiente em mercados emergentes, onde o crescimento nas vendas de produtos nutritivos é o mais veloz, de acordo com Patrik Schwendimann, analista no Zuercher Kantonalbank. Richard Laube, executivo-chefe da Nestlé Nutrition, estabeleceu em 2006 uma meta de 10% de crescimento em vendas e 20% de lucro operacional, sem estipular um período de execução. A rentabilidade de nutrientes esportivos é de apenas 10%, ao passo que a da linha Jenny Craig é de aproximadamente 12%, estima o Bank Vontobel. A margem operacional dos produtos de nutrição médica da Danone foi de 21% no primeiro semestre, enquanto a lucratividade da linha de alimentos infantis foi de 19%.

 

"Para estimular o crescimento, a Nestlé deveria usar parte dos US$ 21 bilhões que captou ao vender uma participação na Alcon no começo do mês para levantar recursos para as suas compras no setor de nutrição", disse a analista Claudia Lez, do Vontobel. A Nestlé poderia fazer uma proposta de compra pela Mead Johnson em conjunto com a americana H.J. Heinz, famosa opor sua mostarda, disse o analista Marco Gulpers, do ING Wholesale Banking. "A Nestlé teria de enfrentar temas antitruste se se oferecesse para comprar sozinha a companhia, que está avaliada em aproximadamente US$ 9,4 bilhões", disse ele. A linha Enfamil, da Mead Johnson, é a marca de suplementos infantis mais vendida do mundo, e mais de metade das vendas da companhia vêm do faturamento desse produto na Ásia e América Latina. Nem a Mead Johnson, nem a Heinz ou tão pouco a Nestlé comentaram o tema.

 

O grupo suíço também poderia comprar o setor de nutrição infantil da Pfizer, ou a divisão de alimento intravenoso Kabi, que pertence ao Fresenius Group, disse Lenz. A Pfizer tem marcas de nutrientes infantis como o Gold e o Promil e é a maior fabricante de alimentos infantis no Reino Unido, Filipinas e Austrália, de acordo com Lenz. O Kabi da Fresenius permitiria à Nestlé ingressar no mercado de alimentos administrados por meio intravenoso, acrescentando um novo segmento de produtos.

 

A Danone vendeu uma divisão de biscoitos em 2007 para se concentrar em alimentos mais saudáveis como o iogurte que ajuda na digestão Activia. A venda também ajudou a prover recursos para a compra da fabricante de alimento infantil Royal Numico, que impulsionou o crescimento das vendas da Danone naquele segmento para 8,1% nos nove primeiros meses de 2009. A Nestlé perdeu 3 pontos percentuais de participação de mercado no setor de alimento infantil na Europa Ocidental desde aquela aquisição, de acordo com dados da Bernstein.

 

A Nestlé não conseguiu crescer organicamente de forma suficientemente veloz em alimentos infantis. Sua mais recente adição de vulto no setor de nutrição, a NaturNes, "não deu muito certo", segundo Gulpers, pois a companhia não criou um leque de produtos amplo o bastante. A Nestlé introduziu o NaturNes em embalagem plástica em substituição aos alimentos de desmama vendidos em latas.

 

A companhia, entretanto, rebate o comentário informando que NaturNes está "se saindo bem", e que a Nestlé introduziu o produto em cinco novos mercados, depois de lançá-lo na França e Espanha.

 

Um dia antes de anunciar a compra da operação de pizza, o executivo-chefe Paul Bulcke disse que a venda da participação na Alcon ajudaria a companhia a "se concentrar na aceleração do desenvolvimento da posição da Nestlé como companhia líder mundial em nutrição, saúde e bem-estar". As ações da Nestlé caíram 5% nos três dias seguintes à compra do negócio de pizza, maior queda em mais de quatro meses, devido à decepção dos investidores com o fato de a primeira aquisição com o caixa obtido com a Alcan não ter sido no setor de nutrição, na opinião de analistas.

 

"A Nestlé corre o risco de se tornar apenas mais uma companhia de alimentos se ela comprar mais operações fora do setor de nutrição", disse Andrew Wood, analista no Sanford C. Bernstein em Nova York. O mercado total para produtos nutricionais, incluindo os que melhoram a pele e o cabelo, gira mais de US$ 174 bilhões, disse ele.

 

"A aquisição do segmento de pizza da Kraft não constitui um sinal de que estejamos nos distanciando do nosso foco em nutrição", disse o principal executivo de finanças da Nestlé, Jim Singh, em 7 de janeiro, acrescentando que a companhia reduzirá o conteúdo de gordura saturada e sal nas pizzas.

 

A fabricante do Leite Moça continuará prospectando negócios do tipo "bolt-on" (aquisição de empresa para sua transformação em unidade, geralmente para incorporar inovação tecnológica ou vantagem comparativa a custo mais reduzido) e acelerou a sua busca por pequenas compras em mercados emergentes, disse Singh. "O setor de nutrição precisa começar a crescer mais rápido", disse Lenz, do Vontobel. "Eles têm o poder de fogo, portanto deveriam verificar as possibilidades" (Tradução de Robert Bánvölgyi)
 

 

Veículo: Valor Econômico


Veja também

BNDES negocia compra de participação na Hypermarcas

Entrada no capital faz parte da estratégia do banco de criar um grande grupo farmacêutico nacional   ...

Veja mais
No Brasil, empresas lideram em balas e gomas

Cadbury e Kraft são duas grandes competidoras não apenas no mercado americano, mas também no Brasil...

Veja mais
Kraft fecha compra da Cadbury por US$ 19,5 bi

Negócio cria a maior fabricante de chocolates e doces do mundo   A companhia britânica de doces Cadb...

Veja mais
Mais seguro, eletroportátil também será mais caro

Eletrônicos: Certificação pode subir em até 10% o custo de produção   Im...

Veja mais
DuPont e JBS fazem aliança para produzir metilato de sódio no país

Estratégia: Grupos apostam no mercado para biodiesel no país, hoje de 2,4 bilhões de litros  ...

Veja mais
No Brasil, farmácia vende a maior parte do portfólio

Desconhecida do consumidor comum, a linha de produtos da divisão de Nutrição da Nestlé Brasi...

Veja mais
Brasil ajuda o Casino

A cadeia francesa de supermercados Casino, que é sócia no Brasil do Grupo Pão de Açúc...

Veja mais
Volta às aulas

A fabricante de material escolar Mercur espera aumento de vendas de 10% em 2010. A maior parte desse faturamento se conc...

Veja mais
Americana Cargo Ventures terá entreposto em Pecém

A empresa americana Cargo Ventures, sócia da zona franca de Miami, está perto de fechar um investimento de...

Veja mais