Mais seguro, eletroportátil também será mais caro

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Eletrônicos: Certificação pode subir em até 10% o custo de produção

 

Imagine usar uma cafeteira que lança chamas quando acionada. Ou apertar o botão do liquidificar e levar choque, depois que o líquido escorreu para dentro do motor e por cima dos botões. E pior ainda: usar um secador que esquenta demais, a ponto de alterar a cor do cabelo ao longo do tempo e até provocar o desprendimento de mechas do couro cabeludo.

 

Esses são alguns dos casos críticos relatados por consumidores ao Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) nos últimos dois anos. As ocorrências contribuíram para que a entidade tornasse obrigatória a certificação de aparelhos elétricos em relação a requisitos de segurança, conforme a Portaria 371, publicada no Diário Oficial da União em 31 de dezembro. Até hoje, a norma que trata do assunto (ABNT NBR NM 60335-1) era adotada voluntariamente. A partir de 1º de julho de 2011, no entanto, a certificação é compulsória e o produto, tanto nacional quanto importado, deve ser reavaliado anualmente por um dos laboratórios acreditados pelo Inmetro.

 

O consumidor deverá pagar mais caro para ter em casa um aparelho que não solte fogo ou dê choque. A Eletros, associação das principais fabricantes de eletroeletrônicos e eletrodomésticos, estima que a certificação possa encarecer entre 3% e 5% os custos de produção. "Esse aumento certamente deve recair sobre o preço do produto final", afirma Luiz Zanardi, coordenador técnico da Eletros. O custo aumenta devido à adaptação do processo produtivo às novas exigências e à necessidade de contratação de um organismo certificador. Há quem já estime gastos 10% maiores.

 

É o caso da Mallory. A empresa, controlada pelo grupo espanhol Taurus e com fábrica em Maranguape, região metropolitana de Fortaleza (CE), ainda vai fazer as contas do quanto será preciso para readequar sua produção às novas exigências, algo que pode variar de acordo com a categoria. "Mas em ventiladores, com certeza, o impacto será de, no mínimo, 10%", afirma Luis Sancho, diretor de produtos da Mallory. Será necessária não só a revisão da parte elétrica, com maior uso de matéria-prima para isolamento dos fios do aparelho, como também a redefinição do design do produto.

 

"Pela nova norma, os ventiladores precisam ter grades mais fechadas, para impedir o contato com a hélice, que não podem ser desencaixadas facilmente como hoje", diz Sancho. Dos oito itens da linha de ventiladores da Mallory, talvez um seja descontinuado, segundo o executivo, porque os altos custos de adaptação não compensariam. "Falar entre 3% e 5% de aumento é conservador", afirma Sancho.

 

A Mondial também acredita que o reajuste no custo vai superar os 5%. "O plástico que recobre o motor dos aparelhos deve ser autoextinguível, ou seja, não pode propagar o fogo", diz Giovanni Cardoso, diretor comercial e de marketing da Mondial. Esse plástico, explica, é pelo menos o dobro do preço da matéria-prima convencional utilizada hoje. "Nas nossas linhas de ventiladores, liquidificadores e batedeiras essa alteração, entre outras, deve aumentar o custo em mais que 5%", diz Cardoso, que só pretende começar a produzir segundo as novas exigências no limite do prazo estipulado pelo Inmetro. "O giro dos meus produtos é de seis meses, assim, tenho até o início de 2011 para fazer as mudanças", diz. O varejo, por sua vez, tem até 1º de julho de 2012 para desovar o que foi produzido fora das normas.

 

As mudanças na produção chegam em um momento em que a indústria de ventiladores trabalha com capacidade máxima. Só de janeiro a novembro do ano passado, segundo a GfK, a venda do produto cresceu 33% frente ao mesmo período de 2008, chegando a movimentar R$ 543 milhões. "Já começa a faltar ventiladores nas lojas", comenta Andre Felype Castanheira Silva, analista da GfK. Em outras 13 categorias de eletroportáteis acompanhadas pela consultoria a venda de janeiro a novembro superou R$ 2 bilhões.

 

As chapinhas e os secadores de cabelos estão entre os eletroportáteis mais vendidos no país, em número de unidades, segundo a GFK. Este é o mercado da paulistana Taiff, que exporta para a Europa, América do Sul e até para a China. "Nós já atendemos as normas internacionais, mas vamos ter custos com a certificação periódica", diz Nilton dos Santos, gerente de desenvolvimento da Taiff. Segundo ele, o custo do produto pode aumentar em até 6%. "Isso compromete muito nossa margem, que já é muito baixa, entre 2% e 4%", diz.

 

Grandes fabricantes de eletroportáteis, como Arno, Philips e Electrolux, afirmam que já seguem todas as normas voluntariamente. Para o diretor de pesquisa e desenvolvimento do Grupo SEB, dono da Arno, a medida vem "moralizar" o setor. "Fabricantes que não respeitam o consumidor vão ficar de fora do mercado", diz Jose Carlos Veneziano. "Muitas marcas que hoje oferecem preço menor são aquelas que não fazem todos os testes necessários", afirma Veneziano.

 

Laurent Vergneau, diretor de marketing de eletroportáteis da Electrolux, acredita que apenas os gastos da certificação não serão suficientes para gerar impacto no custo do produto. "Vamos trabalhar para não fazer qualquer repasse, uma vez que podemos diluir os custos com o nosso volume de produção", diz Vergneau.

 

Segundo Fabián Yaksic, gerente do departamento de tencologia e política industrial da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), cerca da metade da indústria de eletroportáteis é de importados. "Nesse caso, os produtos terão que ser certificados no exterior por laboratórios que tenham filial aqui e sejam acreditados pelo Inmetro", afirma Yaksic, que também é membro do conselho da International Electrotechnical Comission (IEC), organização que é referência mundial em padronização do setor eletroeletrônico. A portaria 371 do Inmetro cita normas da IEC, ainda não publicadas pelas Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

 

Embora tenha sido pega de surpresa pela adoção da norma, a filial brasileira da italiana DeLonghi garante que todos os seus produtos atendem os requisitos de segurança. "Os aparelhos já são certificados no exterior, de acordo com as normas da IEC", diz João Zangrandi, presidente da empresa.

 

A nova exigência envolve especialmente os eletroportáteis, uma vez que as linhas branca, de áudio e vídeo e de informática já seguem outros programas que abrangem a questão da segurança, diz Leonardo Rocha, chefe substituto da divisão de programas de avaliação da conformidade do Inmetro. "Todos os aparelhos agora estão cobertos pelas normas de segurança, sejam as brasileiras, já publicadas pela ABNT, sejam as internacionais, no âmbito da IEC", diz Rocha.
 

 

Veículo: Valor Econômico


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