O Grupo Pão de Açúcar aceitou rever os pontos críticos levantados pela Casas Bahia no acordo de fusão fechado entre as duas redes em dezembro do ano passado. A família Klein não concorda com três questões gerais do contrato: a disparidade no valor dos ativos da Casas Bahia e do Ponto Frio na nova empresa; a ausência de mecanismos de governança corporativa para proteger os interesses da família Klein nas tomadas de decisão; e um plano de saída dos acionistas da Casas Bahia, com a garantia de liquidez das ações da companhia resultante da fusão na Bolsa de Valores de São Paulo.
Fontes ligadas à negociação disseram que, até meados deste mês de abril, Pão de Açúcar e Casas Bahia estavam na iminência de encerrar as discussões e levar o assunto à câmara de arbitragem da bolsa de valores, foro criado para resolver disputas societárias do mercado de capitais. Mas depois que as discordâncias começaram a ser publicadas pela imprensa, o Pão de Açúcar teria decidido ceder. A varejista comandada por Abilio Diniz é de capital aberto e sofreu imediatamente com as informações do possível rompimento: no pregão do dia 13, a queda de 4,97% no preço dos papéis do Pão de Açúcar foi a maior do Ibovespa.
O ponto mais crítico, segundo uma fonte próxima à negociação, diz respeito ao valor que cada companhia aportou na nova empresa. Enquanto o patrimônio de Casas Bahia somou R$ 2,7 bilhões, o do Ponto Frio, controlado pelo Pão de Açúcar, foi avaliado em R$ 1,3 bilhão. A questão é que os R$ 2,7 bilhões de Casas Bahia representam um valor contábil, enquanto que os R$ 1,3 bilhão do Ponto Frio referem-se ao valor da companhia na bolsa. O valor contábil da Ponto Frio é de R$ 400 milhões.
Ainda assim, a família Klein recebeu 49% das ações da nova companhia (representadas por ações da Globex), enquanto o Pão de Açúcar ficou com os demais 51%. O problema é que apenas 4,5% das ações da Globex são negociadas em bolsa. E, embora o Pão de Açúcar já tenha demonstrado a intenção de fazer uma nova oferta pública das ações da Globex no mercado, até agora nada foi definido formalmente. A busca por um valor de aluguel das lojas da Casas Bahia acima dos R$ 130 milhões definidos no contrato original seria uma forma de compensar os Klein nesse sentido.
Essa situação dá origem ao segundo maior problema para os Klein: ter uma "porta de saída" da nova empresa. Da maneira como está, diz uma fonte, os donos da Casas Bahia não podem vender as ações para ninguém, a não ser para o controlador Pão de Açúcar, mesmo decorrido o prazo inicial de 12 meses previsto no contrato de origem, assinado em dezembro e redigido pelo escritório Tozzini Freire.
E o controlador não teria motivo nenhum para comprar, uma vez que já detém a maioria das ações e, pelo acordo original, poderia tomar quaisquer decisões, mesmo sem o consentimento dos donos da Casas Bahia. Esse é outro calcanhar de Aquiles para os Klein. Numa decisão sobre aporte de investimentos, por exemplo, ou a família Klein acompanha o movimento do Pão de Açúcar, ou verá a sua fatia diluída na empresa, caso o controlador faça o movimento sozinho. Cada lado tem cinco representantes no conselho de administração, no qual Michael Klein é o presidente. Mas ele não tem o "voto de Minerva", ou seja, em caso de empate, vale quem tem a maioria das ações.
Veículo: Valor Econômico