Orgânicos conquistam os supermercados

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Sem a figura do atravessador, agricultores orgânicos estão conseguindo colocar seus produtos nas gôndolas de supermercados. A preocupação do grande varejo em aliar consciência social e ambiental a uma melhor qualidade de vida para o consumidor tem estimulado o investimento em marcas próprias e na divulgação dos benefícios desses alimentos, dando visibilidade a produtores de frutas e hortaliças.

 

O fornecimento direto para o varejo é feito, normalmente, por meio de parcerias com distribuidoras certificadas. "A distribuidora dá assistência técnica, acompanha o cultivo e responsabiliza-se pela compra de 100% da colheita. O agricultor sabe para quem vender", diz o sócio da Rio de Una Alimentos, em São José dos Pinhais (PR), Marco Giotto.

 

Canal principal. Ex-produtor orgânico, Giotto fundou a Rio de Una, certificada pelo Instituto Biodinâmico (IBD), que hoje conta com 113 agricultores, responsáveis por 450 hectares. O volume de produção é de 400 toneladas de frutas e hortaliças por mês. "Cerca de 60% dessa produção abastece supermercados." Ele diz que os supermercados são o principal canal de comercialização. "As feirinhas orgânicas ainda são pouco representativas do ponto de vista do escoamento da produção", avalia.

 

As vendas, via distribuidora, normalmente são consignadas e o comprador é exigente. "Não é porque o produto não recebeu agrotóxico que o agricultor pode entregar salada com bicho. Eles cobram qualidade."

 

A questão logística é outro desafio. "Entregamos de loja em loja, três vezes por semana. Para o produto chegar às gôndolas fresco há um esforço logístico tremendo."

 

No varejo. No Brasil 90% do consumo é por meio do varejo, diz o produtor Fernando Ataliba, do Sítio Catavento, em Indaiatuba (SP). O sítio possui 36 hectares e há cultivos de mais de 30 itens. Certificado pela Ecocert, escoa 70% da produção - 200 toneladas por ano - via distribuidora, que embala com a marca do varejista e distribui nas lojas. "Varia, mas o produtor fica, em média, com 10% do valor com que o produto chega ao consumidor."

 

Sem o intermédio de uma distribuidora, o agricultor Joaquim Pires Bueno, de Tietê (SP), negocia diretamente com uma grande rede de supermercados toda a produção de lichia orgânica - 5 toneladas.

 

"Entrego tudo para o supermercado. Antes vendia via atravessador, mas agora é muito melhor, pois recebo três vezes mais, diz ele, que tem 5 hectares, é certificado pela Fundação Mokiti Okada e cultiva outros 15 itens, como cenoura, abobrinha, ervilha-torta, rabanete e quiabo.

 

Ele investiu no sítio para se ajustar às exigências do comprador. "Tenho packing house e água de boa qualidade. O cultivo deve seguir uma cartilha de boas práticas de produção. A colheita de hortaliças, por exemplo, deve ser feita no horário certo para garantir a qualidade do produto até o consumidor."

 

Visibilidade. Para o proprietário da Cio da Terra, em Jarinu (SP), Zuco De Luca, o varejo dá visibilidade aos orgânicos. "Além disso, o agricultor planeja a produção", diz ele, que trabalha com 100 produtores, em 200 hectares. Cerca de 70% das 10 mil bandejas de produtos são destinadas ao varejo.

 

Os produtores parceiros recebem ainda noções de gestão. "Para atender a uma grande rede, tem de ser profissional, ter os custos no papel", diz o proprietário da Horta & Arte, em São Roque (SP), Luis Carlos Trento. Ex-produtor, ele tem parceria com 40 agricultores, responsáveis pelo cultivo de 200 hectares, com um volume de 100 toneladas de produtos por mês.

 

O proprietário da Cultivar Orgânicos, em São Roque (SP), Cristiano Nicolau Psillakis, tem 150 produtores parceiros e fornece para o varejo 70 itens. "O varejo exige qualidade, o que estimula a profissionalização do agricultor", defende Psillakis.

 

PARA LEMBRAR
Produtor deve se adaptar às novas regras

 

O prazo para os agricultores se adaptarem às novas regras de produção e comercialização de orgânicos termina dia 31 de dezembro. A regularização baseia-se em normas de armazenamento, rotulagem, transporte, certificação e fiscalização. Cumpridas as regras, o produtor receberá o selo do Sistema Brasileiro de Conformidade Orgânica. Mais informações no site www.prefiraorganicos.com.br, do Mapa.

 

Marcas próprias confirmam potencial do setor

 

A criação de marcas próprias por grandes redes de varejo para produtos orgânicos confirma o crescimento do setor. Na rede Carrefour, esse mercado tem crescido 20% ao ano, estimulado pela profissionalização dos agricultores produtores de frutas, legumes e verduras (FLV), informa o gerente de Inovação e Qualidade das Marcas Próprias, Fernando Augusto Del Grossi. A rede trabalha com mais de 100 itens orgânicos, em 100% das lojas, entre alimentos in natura e industrializados. "A marca de orgânicos, que compõe a linha de produtos saudáveis, tem embalagem moderna e apresentação diferenciada, para mostrar ao consumidor que os benefícios do alimento orgânico vão além da não aplicação de agrotóxicos, mas que também obedece a critérios sociais."

 

Na rede Pão de Açúcar o mercado de orgânicos passou de R$ 6 milhões, em 2002, para R$ 58 milhões em 2009. "Desse total, 65% são hortifrutigranjeiros", diz a gerente comercial de Alimentos Orgânicos do Pão de Açúcar, Sandra Caires Saboia. Nos últimos dois anos a venda de orgânicos cresceu, respectivamente, 40% e 45%, segundo Sandra ? hoje, a marca do grupo possui 40 itens orgânicos. "Os orgânicos já são encontrados em todas as lojas do grupo e também em 100% das lojas Extra. Temos buscado fornecedores locais, para reduzir a limitação de abastecimento de lojas no interior", diz Sandra. Os fornecedores seguem uma cartilha de produção. "Têm de ter, por exemplo, packing house, com salas higienizadas, azulejadas e água disponível." / F.Y.

 

Visibilidade no grande varejo

 

Supermercados difundem os orgânicos, mas marcas próprias tiram identidade do produtor

 

Segundo a engenheira agrônoma Priscila Terrazzan, produtores orgânicos de hortaliças não têm como abastecer, sozinhos, o grande varejo. "O grande varejo quer qualidade, volume e continuidade no fornecimento. Se os agricultores não se associarem, a venda em supermercados torna-se inviável", diz ela.

 

Com mestrado em Agroecologia e Desenvolvimento Rural, Priscila é autora, com o pesquisador da Embrapa Meio Ambiente Pedro José Valarini, do trabalho Situação do mercado de produtos orgânicos e as formas de comercialização no Brasil. "As distribuidoras são agentes fundamentais para o agricultor escoar a produção", diz ela, que ouviu as três maiores redes de varejo do País, oito distribuidoras e agricultores. O setor supermercadista é abastecido por 11 distribuidoras, que fornecem, em média, 1.187.000 unidades de frutas e hortaliças por mês. Os supermercados absorvem 89% do total comercializado pelas distribuidoras.

 

Sazonais. "A produção orgânica respeita a sazonalidade da lavoura e a vocação agrícola da região. Não há como mudar o manejo para atender à demanda do varejo", diz Priscila. Para ela, a grande vantagem é que o varejo "vende muito" e investe em marketing. Por outro lado, diz, a criação de marcas próprias para orgânicos coloca todos os produtores sob essa mesma marca.

 

"O grande varejo tem tratado o mercado de orgânicos como estratégico no curto e médio prazos. Além da relação de marcas orgânicas com o conceito de segurança alimentar, busca-se garantir posições de mercado, agregando valor a produtos diferenciados do ponto de vista ético e ambiental." / F.Y.

 

Veículo: O Estado de São Paulo


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