Empresas apostam em 2ª marca para classe C

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Estratégia é cada vez mais usada em vários tipos de produtos, como chocolates e torneiras

 

Antes restrita a roupas, a estratégia das indústrias de lançar uma segunda marca do mesmo produto vem ganhando cada dia mais adeptos. De chocolates a torneiras, passando por sapatos femininos, é crescente o número de empresas donas de marcas tradicionais que decidiram apostar numa outra marca para conquistar a nova classe média brasileira, que ascendeu das camadas D e E para a C.

 

Depois da crise, a segunda marca também virou alternativa para ampliar as vendas das companhias em países desenvolvidos, mas no sentido oposto. No mês passado, por exemplo, a Starbucks Corp. anunciou que vai lançar nos Estados Unidos uma segunda marca de café mais barata, a Seattle"s Best Coffee. A intenção é atrair consumidores que perderam poder aquisitivo por causa da recessão.

 

"O dinheiro está mudando de mãos", afirma Renata Vichi, vice-presidente executiva do Grupo CRM, que é dono da Kopenhagen, fabricante de chocolates fundada em 1928. Depois de fazer pesquisas, a empresa constatou que havia uma lacuna no mercado de lojas especializadas em chocolates no atendimento das classes B e C, fora das grandes marcas industrializadas vendidas em supermercados.

 

Por isso, decidiu criar uma nova marca, a Brasil Cacau, com produtos entre 30% e 50% mais baratos em relação aos da marca principal, sem arranhar o posicionamento de mercado da Kopenhagen, voltada para o público classe A. "Jamais abriríamos uma loja da Kopenhagen na Vila Formosa (bairro paulistano caracterizado como de classe C)", observa Renata.

 

Quando a empresa mudou a produção de São Paulo para Extrema (MG) e triplicou o tamanho da fábrica, a oportunidade de ter uma nova marca tornou-se factível com a maior escala de produção. Em janeiro de 2009 foi aberta a primeira loja da Brasil Cacau. "Tivemos uma aceitação fantástica", conta Renata.

 

Hoje são 80 lojas, sempre localizadas em ruas de grande fluxo de pedestres. A meta é fechar o ano com 180 pontos de venda. Do faturamento do grupo previsto para este ano de R$ 214 milhões, menos de 10% virão da segunda marca. Mas, até 2013, diz Renata, a nova marca deverá responder por metade da receita da companhia.

 

A Fortti, cria da quase centenária Lorenzetti, é outra marca que acaba de estrear no mercado da classe C. De carona no boom do mercado imobiliário, em abril deste ano a companhia decidiu fabricar torneiras, válvulas sanitárias, assentos sanitários e acessórios de banheiro em plástico de engenharia, material mais resistente que o plástico comum.

 

Ao todo, são 40 produtos com preços bem mais acessíveis, que têm como alvo a classe C. O preço da torneira de plástico da nova marca, por exemplo, corresponde a 20% do preço de uma torneira em latão da marca Lorenzetti, voltada para as classes A/B.

 

"Até dezembro, chegaremos a 60 produtos da marca Fortti", prevê o vice-presidente da Lorenzetti, Eduardo Coli. Ele conta que a empresa investiu até agora R$ 38 milhões na nova marca. Além do desenvolvimento dos produtos, a cifra inclui a compra de uma nova planta de produção.

 

Os itens da marca Fortti estão sendo produzidos na antiga fábrica de fogões da Bosch, no bairro paulistano da Mooca, que foi adquirida pelo Grupo Lorenzetti para essa expansão de marcas.

 

Segundo Coli, o projeto da Lorenzetti de ter uma marca para classe C é anterior ao programa habitacional do governo, Minha Casa Minha Vida, que prevê a construção de 1 milhão de casas populares. "Quando o programa saiu, aceleramos os investimentos", diz o executivo.

 

Luxo. A Claudina, que há 40 anos fabrica sapatos femininos de luxo, também é outra novata no mercado da classe C. Em fevereiro deste ano, a companhia lançou a marca Vitória Ometto. Apesar de ter um nome mais imponente que Claudina, os produtos da nova marca têm preços bem menores e são vendidos em lojas multimarcas. Enquanto um par de sapatos da Claudina custa entre R$ 280 e R$ 500, o preço do calçado Vitória Ometto gira em torno de R$ 90, porque leva maior volume de componentes sintéticos.

 

"Lançamos inicialmente a nova marca nas Regiões Norte e Nordeste e já tivemos pedido de reposição dos lojistas", diz a gestora de marketing da empresa, Sansara Nyaya Nunes. Segundo ela, a nova marca já está em todas as regiões do País e com perspectivas promissoras.

 

Atualmente, metade dos 1.600 pares de calçados produzidos diariamente na fábrica de Jaú (SP) levam a marca Vitória Ometto. A outra metade é Claudina. A meta da companhia é que a nova marca responda por 60% da produção diária de 2 mil pares de calçados programada para a coleção de verão.

 

Há um ano no mercado com a marca de maquiagem Intense, o Boticário não revela os números da sua investida na classe C. Mas, ao que tudo indica, a estratégia deu certo. A companhia tem hoje 69 itens sob esse novo guarda-chuva e, em fevereiro, ampliou o número de produtos. A diferença entre o preço dos produtos da marca Intense e Boticário é significativa. Exemplo: enquanto o batom da marca Boticário custa no varejo R$ 22,90, o da marca Intense sai por R$ 9,90.

 


''É estratégia de ocupação de espaço'', diz especialista

 

Com a facilidade de obter informações de preços, margens de venda estão se achatando, diz Claudio Felisoni, da FIA/USP

 

Mesmo sem estatísticas disponíveis, analistas especializados em mercado de consumo não hesitam em afirmar que ter uma segunda marca é uma tendência entre as indústrias de bens de consumo."É uma estratégia de ocupação de espaço", diz o presidente do Conselho do Programa de Administração do Varejo (Provar) da Fundação Instituto de Administração da Universidade de São Paulo (FIA/USP), Claudio Felisoni.

 

Ele observa que essa tendência é crescente entre as companhias porque, com a redução dos custos para obter informações e comparar preços na hora de ir às compras, as margens de venda dos produtos estão se achatando. Por isso, as empresas não podem manter preços tão elevados em relação à concorrência e precisam ter uma segunda marca para ganhar volume nas vendas.

 

Atualmente, diz Felisoni, o custo de comparação é muito baixo e "se resume a um clique", fazendo alusão ao uso da internet na pesquisa de preços. De toda forma, a ascensão das classes D e E à classe C, a nova classe média brasileira, é o principal motivo alegado pelas companhias para ter uma marca mais popular e com preços em conta, sem arranhar a marca tradicional.

 

"Existe uma aceleração da tendência entre as companhias de bens de consumo em geral lançar uma segunda marca", afirma o consultor da Mixxer Desenvolvimento Empresarial, Eugênio Foganholo. Além de atingir o consumidor da classe C, ele observa que a estratégia também está sendo usada pelas empresas para "blindar" o mercado da entrada de novos concorrentes.

 

Um dos efeitos positivos de ter uma segunda marca é aproveitar a capacidade da fábrica com uma nova linha de produção e otimizar algumas despesas, como a distribuição de produtos.

 

Para o sócio da consultoria Top Brands, Marcos Machado, não é possível uma empresa ser líder de um setor tendo apenas uma única marca. "Com uma marca só não é possível atender ninguém direito. O consumidor está se diversificando."

 


Veículo: O Estado de S.Paulo


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