O luxo da classe C

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Pesquisa aponta que consumidores desse grupo gastam entre 30% e 60% da renda com marcas e produtos e veem o consumo como inclusão social

 

Aldine Paulino de Freitas, promotora de eventos da Penha (zona leste), deu-se ao luxo de ter uma sandália Carmim e um jeans Opera Rock.

 

Carlos Eduardo Mortari, supervisor de cobrança de Perus (zona norte), acha um luxo poder trabalhar de camisa e gravata de segunda a sexta-feira. Aos finais de semana, o luxo é usar tênis de marcas "gringas" de skatista.

 

Dione Silva, ex-secretária-executiva da Casa Verde (zona norte), tem uma coleção "luxuosa" de cem pares de sapatos e bolsas -que inclui de uma original Louis Vuitton a réplicas de até R$ 700 de marcas como Prada.

 

Unhas de porcelana que custam até R$ 400, com desenhos em alto relevo com cristais Swarovski, e produtos para "mega-hair", um investimento de R$ 1.000 na cabeça, são luxos que ela "não abre mão" de se dar.

 

Para a nova classe média, não basta mais a segmentação de categoria "popular". Ela almeja mais, quer brilhar e quer acesso ao luxo.

 

São brasileiros que se preocupam com a aparência, que chegam a gastar entre 30% e 60% de sua renda com marcas e produtos considerados luxuosos e que, por meio do consumo, buscam a inclusão social. Estão incluídas na classe C pessoas com renda familiar entre três e dez salários mínimos.

 

"O luxo para a nova classe média está ligado principalmente a autoestima e pertencimento. O primeiro passo, para esse consumidor, é poder comprar o produto que antes não comprava", afirma André Torretta, publicitário e sócio-diretor da Ponte Estratégia, consultoria especializada em baixa renda. Depois, diz ele, vem a preocupação desses consumidores em saber escolher a roupa certa e combiná-la.

 

"Ser bem recebido e estar pronto para frequentar os lugares de maneira digna é um luxo para essa classe, o que mostra como é importante ser aceito e vencer preconceitos", diz o publicitário, que a pedido da Folha fez a pesquisa sobre luxo na classe C.

 

Quando produtos e acessórios que ajudam a ter estilo, e luxo, são "financeiramente inatingíveis", os consumidores emergentes não se incomodam em recorrer a réplicas -mas de qualidade.
"A minha bolsa não é original, mas é uma réplica da Louis Vuitton de R$ 550, comprada à vista pelo meu marido", diz Claudia Vieira da Silva Costa, vendedora.

 

MAIS QUE O PADRÃO

 

Em outra pesquisa feita no ano passado com 500 consumidores de todas as faixas de renda, o Provar (Programa de Administração de Varejo) da FIA constatou que, para 80% dos entrevistados, luxo é ter um produto de qualidade.
"Não é mais aceitável só o produto padrão. Com a melhora na renda e no crédito, produtos sofisticados estão mais acessíveis. Não é à toa que os grandes varejistas anunciaram investimentos de R$ 2 bilhões para esse público", diz Claudio Felisoni, coordenador do Provar.

 

O crediário é a forma escolhida para que esses consumidores comprem os artigos.
"Comprei minha TV 52 polegadas da LG em 12 vezes. O home theater da minha mãe paguei em cinco parcelas. Se não tenho condições de adquirir à vista tudo aquilo que considero meus luxos, faço o parcelamento", afirma Beth Mendonça, que trabalha na área financeira de uma empresa.

 

Na lista de anseios da nova classe média brasileira, estão viagens a Fernando de Noronha, Florianópolis e Disney.

 

Campos do Jordão, reduto de empresários e socialites paulistas, também aparece no roteiro considerado de luxo desses consumidores. "Em Campos só tem grã-fino. Se decidir ir até lá, é preciso estar impecável, vestir as melhores roupas. O luxo está estampado na cara das pessoas", diz Beth.

 

Empresas investem nesse consumidor

 

Empresas dos setores automobilístico, imobiliário, de cosméticos e de bebidas já investem para elevar o padrão de seus produtos -populares- e atender de forma diferenciada os consumidores emergentes do país.
"Quem não investir nesse consumidor vai perder espaço. Vejo que há um movimento, de alguns setores, para levar a essa base da pirâmide diferentes formas de ter acesso a produtos a que antes não tinham", afirma Carlos Ferreirinha, presidente da MCF, uma das principais consultorias do setor de luxo do Brasil.

 

"Estamos vivendo em um mundo emergente, em que a base de consumidores novos está explodindo em todas as regiões, inclusive do país", diz ele.
"Se as empresas não olharem de forma criteriosa e estratégica para esse público, perderão a chance de vender para essa base, que fará a diferença nos próximos anos."

 

Para se aproximar desse consumidor, empresas de perfumes e cosméticos, por exemplo, abriram corners de vendas em lojas de departamento, como a Renner, ou em supermercados, como nos hipermercados Extra.
"São exercícios pontuais para atingir esse consumidor", diz o consultor.

 

A Natura, por sua vez, abriu espaços -as chamadas Casa Natura- para que consultoras e consumidoras da marca possam conhecer melhor e provar seus produtos.

 

Já as Casas Bahia optaram em fazer, no final do ano, um evento destinado a atender as classes C, D e E de forma diferenciada.
"A Super Casas Bahia é um grande exemplo de como esse público é atendido com shows especiais da Disney, parques, monitores para seus filhos. O consumidor recebe algo nesse evento a que não teria acesso no dia a dia", diz.

 

No ano passado, a C&A fechou uma parceria com o estilista Reinaldo Lourenço para desenvolver uma coleção exclusiva para a rede.
"Foi uma forma de traduzir um estilista conceituado do país e permitir que a base da população acesse produtos criados por um estilista top", diz Ferreirinha.

 


Veículo: Folha de S.Paulo


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