O preço da ação da SABMiller subiu muito na semana passada, devido a rumores de que ela estaria de olho nas operações africanas do grupo de bebidas francês Castel. Não importa que a especulação tenha surgido em um relatório de analistas - a mais recente de uma longa série envolvendo produtores de álcool. Os investidores aplaudiram porque a história, ou uma versão dela, deverá se concretizar em algum momento. O setor continua pronto para mais uma rodada de consolidação.
Isso porque os fabricantes de cerveja e destilados, famosos por gerarem bastante caixa, estão subalavancados - a tolerância dos investidores aos níveis de endividamento é relativamente alta dada a capacidade do setor de livrar-se de caixa. Os apetites estão aguçados e os investidores começam a ficar um pouco inquietos, especialmente com as companhias que não têm uma exposição decente aos mercados emergentes, que vêm crescendo em ritmo acelerado.
E, diferentemente, de muitos outros setores, esse é um negócio em que as fusões e aquisições podem cumprir suas promessas, direcionando mais bebidas aos canais de distribuição estabelecidos.
A inércia não se deve à falta de interesse. A SABMiller já demonstrou sua vontade de aumentar a relação de endividamento sobre o lucro antes dos impostos, juros, depreciação e amortização (lajida) da atual 1,9 para 3,5, se um alvo adequado for encontrado. Diante dos níveis de endividamento no fim do ano, de US$ 8,4 bilhões, isso significa que ela poderia contrair outra dívida de US$ 7 bilhões - convenientemente, um número que não fica muito longe do que ela precisaria para comprar a Castel.
A fabricante de destilados Diageo também está subalavancada, em cerca de 2,3 vezes seu lajida e andou flertando com a Moët Hennessy e a United Spirits da Índia. Adotar um múltiplo parecido de 3,5 vezes implica em espaço para um novo endividamento líquido de 3 bilhões de libras, além dos 6,9 bilhões já existentes. "A Diageo e a SABMiller adorariam fazer o negócio certo pelo preço certo", diz Trevor Stirling, analista da Bernstein na Europa especializado no setor de bebidas. "Mas o ponto de impasse é as famílias controladoras que não querem vender pelos preços que os compradores estão dispostos a pagar aos acionistas."
Há muitas empresas em que a Diageo gostaria de por as mãos. No topo da lista talvez esteja a Moët Hennessy, a produtora de champanhe na qual ela tem uma fatia de 34% e o restante está em poder da LVMH, da França. Quando as expectativas de um acordo atingiram o ápice, em abril de 2009, a posição de 66% da LVMH estava sendo avaliada em cerca de € 8 bilhões.
"Esse seria um negócio transformador para a Diageo em termos de mercados emergentes", diz Melissa Earlam, analista do UBS, referindo-se à liderança de mercado da Moët Hennessy na China e na Rússia; cerca de um quarto de suas vendas são feitas na Ásia emergente.
Analistas apontam para outros buracos no portfólio da Diageo, como o segmento de tequilas, que poderiam ser preenchidos via aquisições. O problema - assim como para a SABMiller - é que os alvos escolhidos são tentadores, mas estão além do alcance.
Por conseguinte, a Castel preenche todos os requisitos da SABMiller (de fato, ela já controla 20% da companhia francesa) - bem mais do que a disponível mas relativamente cara Foster's.
As operações africanas da Castel são grandes: o Deutsche Bank calcula que elas vendem cerca de 21,6 milhões de hectolitros de cerveja por ano. Isso é mais que o dobro das estimativas para o volume geral da SAB Africa, que exclui sua participação na Castel e na África do Sul.
Mas a Castel é uma empresa de controle familiar e, embora uma nova geração esteja para assumir seu controle, há pouquíssimos sinais de que haverá uma mudança de mentalidade. O mesmo se aplica para muitos dos ativos escolhidos, depois dos negócios frenéticos de 2008, quando a InBev comprou a Anheuser-Busch para formar a AB InBev, a Heineken comprou a Scottish and Newcastle e a Pernod Ricard, da França, pagou € 5,6 bilhões pela Vin & Spirit, fabricante da vodca Absolut.
O Grupo Modelo, do México, cujas marcas incluem a cerveja Corona, é um bom exemplo. Ele é controlado em 50,2% pela AB InBev e uma aquisição integral era visto como mais provável por analistas depois que a companhia mexicana perdeu um julgamento de arbitragem contra o grupo americano em julho. O Grupo Modelo discorda, deixando claro em uma carta enviada à bolsa de valores mexicana na ocasião, que não tem interesse em fazer negócio.
O controle familiar também é um problema para a Diageo. Além da Moët Hennessy, que a LVMH não parece disposta a vender, há a tequila Jose Cuervo, controlada pela família Beckmann, que mais uma vez não tem uma compulsão óbvia por vendê-la. A Diageo tem direitos de distribuição, mas analistas acreditam que ela poderia dobrar as margens operacionais adquirindo o controle integral.
Os esforços para a compra da United Spirits no ano passado deram em nada. Banqueiros, e alguns investidores, afirmam que o problema da Diageo é que ela é muito sovina. Mas outros aplaudem sua disciplina: o grupo pretende obter um retorno sobre a média ponderada do custo de capital (de 9%) depois de três ou quatro anos.
Tudo isso sugere um caminho de estabilidade, em vez de emoções: recompras de ações, dividendos decentes e melhoria dos benefícios. Isto é, até que um velho patriarca passe o comando para as volúveis gerações mais novas.
Veículo: Valor Econômico