Indústria já negocia diretamente com lojistas 31% do volume de aparelhos comercializados
Está em alta a participação do varejo nas vendas de celulares no Brasil. Com promoções e modelos exclusivos, supermercados, magazines e até lojas de roupas avançaram em um mercado que, há poucos anos, era centralizado pelas operadoras de telefonia.
Os fabricantes já negociam diretamente com o varejo o equivalente a 31% do volume e 37,2% do valor dos celulares vendidos no país. Os dados, divulgados pelas empresas do setor, se referem ao mês de outubro e constam de levantamento da empresa de pesquisas GFK. Em outubro do ano passado, os números eram de 25,8% e 30,8%, respectivamente.
Não é de hoje que os celulares podem ser encontrados nas prateleiras de redes como Pão de Açúcar, C&A e Carrefour. No entanto, o modelo de vendas está em transformação. Antes, as negociações eram feitas quase exclusivamente entre varejistas e operadoras. Agora, estão em expansão os contratos diretos entre comércio e indústria, sem a intermediação das teles. Os quiosques de cada operadora continuam existindo dentro das lojas, mas dividem espaço com o balcão dos celulares negociados sem vínculo com as teles. Se somados os dois formatos, o varejo representa 55% da venda de celulares no país.
Ao ultrapassar a barreira de um telefone móvel por habitante, o setor é, hoje, movido mais por trocas de aparelhos que pela venda de novas linhas. Ao mesmo tempo, os celulares desbloqueados ganharam a preferência do consumidor, que dessa forma pode usar, no mesmo terminal, o chip de várias operadoras.
Nesse contexto, as teles reduziram os subsídios à venda de aparelhos. Por consequência, caiu a diferença em relação aos preços praticados no varejo. Hoje, um celular na operadora sai, em média, 15% mais barato que numa loja não especializada. Essa diferença já foi superior a 30%. "Em geral, os celulares são de R$ 50 a R$ 100 mais baratos nas operadoras. Muitas vezes o consumidor prefere pagar um pouco mais caro no varejo para comprar o aparelho desbloqueado e parcelar em 12 vezes", afirma o diretor de marketing da Motorola, Rodrigo Vidigal.
Em alguns casos, as negociações diretas são mais vantajosas para a indústria. O varejo tem grandes redes, mas é mais pulverizado, enquanto as operadoras nacionais se resumem a apenas quatro: Vivo, Claro, TIM e Oi. "Está quase proibitivo vender para as operadoras. As margens são muito estreitas", observa o diretor de celulares da LG, Marcus Daniel.
As vendas para o varejo já chegam à metade do total comercializado pela LG. Eram 30% no ano passado. As negociações com os varejistas são especialmente interessantes para a empresa coreana, que também produz refrigeradores, TVs e aparelhos de som. Ou seja, a LG tem um contato natural com o comércio. "Isso ajuda na hora de conversar", afirma Daniel.
No entanto, a concorrência entre varejo e operadoras não implica uma queda generalizada nos preços dos celulares. "As pessoas estão trocando um modelo simples por outro mais sofisticado. O consumidor se dispõe a pagar mais para ter mais recursos", afirma o diretor de marketing das divisões de telecomunicações e tecnologia da informação da Samsung, Hamilton Yoshida. Segundo ele, é diferente do que ocorre com os computadores, que baixaram drasticamente de preços quando se disseminaram no varejo. Os PCs ainda têm adesão pequena no Brasil. Com os celulares não é assim: há mais de 194 milhões de linhas habilitadas no país e um número ainda maior de aparelhos.
Essa mudança no mercado não quer dizer que as operadoras tenham deixado de fazer promoções. Em suas lojas próprias ou mesmo nas redes varejistas, as teles oferecem aparelhos em condições especiais, desde que atrelados a algum pacote de serviços. É comum que fabricante, loja e operadora conversem para criar ofertas específicas para um determinado aparelho ou rede varejista.
"As teles percebem que, trabalhando juntos, é possível montar pacotes atrativos e com um custo melhor", diz Carmine Silvestri, diretor de vendas da Nokia para o varejo. A empresa finlandesa tem 30% de seu volume de vendas originado no varejo, sem a participação de operadoras. Para Silvestri, o patamar no qual o mercado se encontra não deve variar muito no curto prazo. "Seria necessário um maior amadurecimento para isso acontecer", afirma.
A avaliação do presidente da Sony Ericsson no Brasil, Magnus Anseklev, é diferente. "Em 2010, o varejo foi importante e em 2011 será mais ainda", afirma. O executivo diz que a chegada das operadoras móveis virtuais (MVNOs) vai mexer com o mercado. A expectativa é de que as redes varejistas tenham interesse em atuar como prestadoras de telefonia móvel, o que deve reforçar a importância desse canal. As vendas diretas representam entre 25% e 33% dos negócios da Sony Ericsson no Brasil.
Para o coordenador de telefonia da rede Extra, Fabio Stefanini, a expansão das vendas por meio do varejo ficou "muito nítida" desde o ano passado. O volume de telefones móveis comercializado por essa divisão do grupo Pão de Açúcar aumentou 20% na primeira metade de 2010. Os modelos desbloqueados contribuíram para essa alta. "Hoje, o varejista procura anunciar quando o aparelho é desbloqueado", afirma Stefanini.
No Nordeste, onde as vendas de celulares crescem acima da média nacional, a rede Eletroshopping - com 140 lojas em seis Estados - está satisfeita com a demanda por aparelhos. Segundo o vice-presidente da empresa, Fernando Freitas, entre janeiro e novembro foram comercializados 20% mais telefones móveis que no mesmo período de 2009. "Há uma procura muito forte, especialmente pelos desbloqueados", diz.
Apesar disso, as vendas de celulares por meio das teles não devem sumir, dado o contato direto que as operadoras têm com seus assinantes. "Talvez elas subsidiem menos, mas são um canal que vai continuar existindo", afirma Vidigal, da Motorola.
Veículo: Valor Econômico