Arroz e feijão mais baratos afetam produtores

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Quem cultiva os itens básicos do prato do brasileiro enfrenta queda de rentabilidade, enquanto observa a valorização das commodities
 


Os agricultores, grandes ou pequenos, integrados às cadeias de commodities, terão um ano bom. Aqueles voltados ao mercado interno terão problemas para pagar seus financiamentos

 

Enquanto os preços internacionais dos alimentos atingem recordes históricos, segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), produtores alguns dos principais itens do prato do brasileiro sofrem com preços baixos. “As culturas internas não costumam acompanhar o preço internacional das commodities”, diz a economista Amaryllis Romano, especialista em agronegócios da Tendências Consultoria.

 

A situação divide os produtores brasileiros em dois grupos, que exigem políticas públicas diferentes. “Os agricultores integrados às cadeias das commodities terão um ano significativamente bom, enquanto muitos voltados apenas ao mercado interno terão problemas para pagar seus financiamentos”, afirma o secretário de política agrícola da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Antoninho Rosares. A entidade representa a agricultura familiar. Assim, preços como os da batata e do feijão apresentam patamares até abaixo do mínimo estabelecido pelo governo. Já a soja, o milho e até a mandioca — cuja fécula compete com o amido de milho — surfam na onda da forte demanda internacional.

 

Intervenção

 

A situação considerada mais grave é a do arroz. Começando a colheita de uma safra recorde, o Rio Grande do Sul cobra atualmente em torno de R$ 22 por saca de 50 quilos, bem abaixo do mínimo estabelecido pelo governo, de R$ 25,80. “O preço atual obriga o governo a realizar fortes intervenções para atingir esse valor”, diz o analista Élcio Bento, da consultoria Safras & Mercado.

 

A discrepância de rentabilidade em relação a outras culturas deve afetar mais a produção de arroz do Centro-Oeste, onde há disputa por terra com milho e algodão, por exemplo. “O governo pretende melhorar preço mínimo em regiões que tem potencial para crescer em produção, como é o caso do Mato Grosso”, diz Regina Celia Gonçalves Santos, analista de mercado da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). “Pará e Maranhão também poderiam entrar na lista, mas não têm a qualidade necessária para comercialização”.

 

Nas várzeas do Rio Grande do Sul, no entanto, não há como outras culturas agrícolas roubarem espaço do arroz . É justamente porque suas terras, em geral alagadas, são menos disputadas que o arroz não disparou como as outras commodities. Nos últimos 12 meses, a cotação na bolsa de Chicago subiu apenas 7,7%, ante as estrondosas valorizações de 63% no trigo, 54% na soja e 97% no milho.

 

Dupla tradicional do arroz, o feijão também começa a sofrer por conta dos preços baixos, afirma o presidente do conselho administrativo do Instituto Brasileiro do Feijão (Ibrafe), Marcelo Lüders. “Há um desestímulo à produção de feijão e um forte estímulo ao plantio de outras culturas”, diz. “Se não ocorrer um fenômeno climático, teremos redução da área plantada na próxima safra de verão”, diz Bento, da Safras & Mercado. O governo está atuando na comercialização do feijão, como fez na semana passada no arroz, e deve realizar um leilão de escoamento nos próximos dias na tentativa de conter a desvalorização.

 

No ano passado, o preço médio do feijão carioca tipo 2 subiu 42%, para R$ 109,55. “Para este ano, projetamos uma média de R$ 84,55”, diz Amaryllis. No primeiro bimestre, a média foi de R$ 75,50, já aproximando do mínimo de R$ 80.

 

A mandioca, que também não está ligada diretamente às bolsas de mercadorias, aproveita a disparada das commodities. Mesmo com a produção estável, o preço subiu 50% no ano passado, comercializado, em média, a R$ 256,78 a tonelada. A demanda da indústria, que pode usar a fécula da mandioca em substituição ao amido de milho, explica o aumento. ■
 


MANDIOCA
50%
foi o aumento do preço em 2010; valorização foi puxada pelo milho, cujo amido concorre com a fécula como insumo no setor alimentício.
 
FEIJÃO
R$ 84,55
é o preço médio projetado para 2011, bem abaixo dos R$ 109,55 observados no ano passado.
 


Consumidor inclui qualidade no cardápio
 


Nova regra do arroz e elevação no padrão de consumo do feijão preocupam produtores
 


A diferença de preço entre o feijão carioca nota 10 e os notas 7 e 8 chega a 30%. Enquanto o primeiro falta no supermercado, os outros sobram nos armazéns
 


Na busca por um prato de melhor qualidade, o consumidor observa a queda de braço entre o produtor e o varejo para saber quem vai pagar esta conta. No caso do feijão, o carioca nota 10 chega a custar 30% a mais que o tipo comum, que sobra nos armazéns dos produtores. No arroz, os produtores alegam que a nova classificação oficial, que torna mais rígidos os padrões de qualidade e tolerância de defeitos, vai reduzir o preço do produto.

 

Os rizicultores estão pleiteando o adiamento por mais um ano da Instrução Normativa 12, que altera a classificação do cereal passando a ter como referência 60 grãos inteiros para o arroz negociado como base (hoje a referência é 58 grãos). Se confirmado, o novo padrão passa a ser um dos critérios para participar, com base nos preços mínimos, da aquisição de produtos agropecuários pelo governo federal.

 

O tema foi um dos destaques da abertura oficial da colheita de arroz no Rio Grande do Sul. O setor estima que a nova medida poderia desvalorizar entre 6% e 10% os preços ao produtor, de acordo com o grau de umidade, impurezas e defeitos dos grãos em casca entregues à indústria. Essa possível desvalorização colaboraria para reduzir ainda mais a rentabilidade do rizicultor. O Indicador de preços do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) revela que, em 12 meses, o preço pago ao agricultor gaúcho caiu cerca de R$ 11 a saca.

 

Às vésperas do início da safra, a pesquisadora do Cepea Maria Aparecida Braghetta afirma que a situação se complica devido ao alto volume de arroz da safra passada que ainda está armazenado. “O produtor se viu com um custo de produção maior que o preço do arroz comercializado, acabou vendendo parceladamente esperando preços maiores, o que não se concretizou”, diz. Para agravar o cenário, as exportações diminuíram e as importações aumentaram.

 

Exigência

 

A busca por produtos de maior qualidade também afeta os produtores de feijão carioca, que veem sobrar grãos de notas 7 e 8, que até poucos anos eram muito consumidos pela população. “Hoje a dona de casa só quer o feijão bem branquinho, nota 10, que historicamente representa apenas 15% da produção da Região Sul”, diz o presidente do conselho administrativo do Instituto Brasileiro do Feijão (Ibrafe), Marcelo Lüders.

 

A diferença de preços entre os dois tipos de feijão chega a ser de 30%, e se acentua em momentos como agora, quando o excesso de chuvas diminui a oferta do feijão carioca nota 10. O problema só poderia ser resolvido com a adoção de uma nova variedade de feijão, conhecida como paulistinha, defende Lüders. “Esse grão é muito semelhante ao carioca e tem mercado internacional, de forma que poderíamos importar ou exportar quando necessário, diminuindo as oscilações de preço”, afirma. ■ P.M. e L.S.
 
 


Veículo: Brasil Econômico


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