Além do mercado em expansão há 15 anos, grupos estrangeiros aumentam apostas no país atraídos pelos ativos naturais
Sustentabilidade e sociobiodiversidade que há pouco mais de uma década soavam como palavrões na área cosmética—até então baseada no processamento de produtos sintéticos — dão cada vez mais provas de sua capacidade de trazer lucro às companhias. Tornaram-se também um grande atrativo para as companhias estrangeiras que buscam no Brasil meios de agregar esses conceitos às suas marcas.
Além da vasta flora brasileira, investimentos em pesquisa, marketing enovas tecnologias foram centrais para que o mercado de cosmético nacional alcançasse a posição que temhoje: é o terceiro maior do mundo, e segundo colocado em consumo masculino. Ao todo, movimentou R$ 65 bilhões no ano passado, com perspectiva de expansão de 10% neste ano, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec)—oque,naturalmente, também o torna disputado tanto por gigantes do ramo quanto por empreendedores e traz prestígio aos fabricantes nacionais.
O uso de ativos naturais é um dos pontos que mais chamam a atenção no mercado internacional e um dos principais itens de investimento. Victor Fernandes, diretor de ciência, tecnologia, ideias e conceitos da Natura, reforça que chegar a esse ponto exigiu longo esforço. “Há grande complexidade nesses processos, que envolvem, além da extração em si, tecnologias de planejamento, de relacionamento e a necessidade de a comunidade fornecedora ganhar escala junto com o crescimento de venda do produto.” O desafio agora, segundo ele, está na expansão das cadeias. E as possibilidades vão alémda Amazônia. A companhia pesquisa também em biomas comoo cerrado e a caatinga.
Potencial
Segundo Filipe Sabará, diretor de negócios da Beraca, fornecedora de insumos amazônicos para a indústria de cosméticos, os bons resultados são reflexo do ótimo momento do mercado. “Para 2011, a expectativa é de crescimento acima da média dos últimos anos, podendo ultrapassar 30%.” Nos últimos cinco anos, a companhia investiu US$ 15 milhões em tecnologia, instalações fabris e melhorias nas práticas de extração. Cerca de 1,5 mil pessoas estão envolvidas nos núcleos comunitários parceiros dos projetos.
“A ligação entre cosmética e sensibilidade sempre foi muito forte. É natural que essa indústria cresça mostrando preocupação com o entorno e com a sustentabilidade”, diz Lígia Amorim, diretora da Nürnberg Messe Brasil, empresa organizadora das feiras FCE Pharma e FCE Cosmetique, marcadas para a próxima semana emSão Paulo. Segundo a executiva, porém, será difícil o Brasil acompanhar o crescimento mundial nos próximos anos se continuar preso ao fornecimento de matéria-prima.
“A cosmetologia no país ainda carece de investimentos em inovação tecnológica de ponta para competir internacionalmente. Neste quesito, estámuito atrás de países como Estados Unidos, França e Japão, que têm nível de consumo grande como o brasileiro”, diz. O Brasil investe cerca de 40% menos que outros grandes países produtores de cosméticos.
Ainda assim, o país começa a entrar na mira das aquisições de grandes empresas internacionais do segmento. Favorecidos pela crise financeira internacional, Brasil, Índia e China são as principais rotas dos investidores, em geral grandes grupos que não querem ficar fora de um mercado que cresce dois dígitos há 15 anos. “O Brasil é um mercado prioritário.É um dos países que mais se desenvolveram nos últimos anos”, diz Angel Lizárraga, diretor executivo da Associação Brasileira de Cosmetologia (ABC). Dados do Instituto Data Popular revelamque as classes C, D e E são maioria no que se refere ao consumo de cosméticos e perfumaria no Brasil. E ,mesmo comsinais de desaceleração econômica, o potencial para os negócios mantém se admirável.
L’Oréal tenta levar a vaidade das brasileiras dos cabelos para o rosto
Além de encarar as concorrentes de vendas diretas, grupo francês tenta motivar consumidoras a cuidar mais da pele
Cerca de 50% das brasileiras usam algum creme no rosto, segundo estimativas da L’Oréal, maior grupo de beleza domundo. Isso significa que a outra metade passa o dia todo sem um único hidratante facial. Mais do que a falta de cuidado coma pele, o que favorece o surgimento precoce de rugas e linhas de expressão, o levantamento revela que o país ainda tem um mercado em potencial adormecido.
O Brasil é um grande consumidor de sabonetes, produtos capilares e desodorantes. Em perfumes, o país também acaba de se tornarcampeãomundial emvendas. Mas, emprodutos para o rosto, as vendas não só estão aquém de seu potencial como também se concentram nas mãos de grandes nomes de vendas diretas, como Avon e Natura.
Esse cenário tornou-se um desafio para a L’Oréal Paris, maior divisão do grupo francês no Brasil, com faturamento de R$ 1,1 bilhão em 2010 e responsável pela produção de itens de grande volume, como xampus, condicionadores, tinturas para cabelos e produtos para cuidado do rosto. “Globalmente, o negócio da pele responde por 25% do faturamento do grupo. No Brasil, esse percentual é claramente inferior”, diz Pierre-Emmanuel Angeloglou, diretor da divisão de produtos de grande público da L’Oréal, sem revelar o percentual.
Apesar da baixa incidência no uso de produtos faciais, a companhia busca desenvolver o negócio no país, o que significa levar produtos feitos sob medida às brasileiras e com embalagem, inovação e preço específicos para o varejo, de forma a competir frontalmente comas vendas diretas.
Como boa parte das brasileiras tem uma pele que vai de mista a oleosa, a empresa busca fórmulas específicas, mais adaptadas às necessidades dessas consumidoras. “Abrimos um centro de pesquisa e desenvolvimento no Rio, cuja estratégia é criar, cada vez mais, produtos voltados às brasileiras. Também investimos em educação, como forma de explicar que a prevenção é a melhor atitude para minimizar efeitos solares”, diz Angeloglou.
Depois de lançar, no ano passado, o Revitalift Clareador, creme que combina efeito anti-idade com ação clareadora da pele, agora a L’Oréal despeja nas prateleiras sua grande aposta do ano. Trata-se do Revitalift Roll-on, com embalagem parecida com a dos desodorantes, e indicação para olheiras. A tecnologia foi importada e adaptada no Brasil.
A grande sacada, segundo Angeloglou, é lançar um produto com embalagem e forma de utilização diferenciada, a um preço acessível (R$ 39), e uma forte campanha de marketing. “Este é nosso lançamento mais importante no ano em cuidado da pele.” Essas estratégias são necessárias para elevar as vendas de uma categoria ainda pouco desenvolvida no país — que privilegia mais o cabelo que o rosto. Na China e no Japão, explica ele, a preocupação maior é coma face.
Além de tecnologia, a L’Oréal também aposta na educação da brasileira como formade estimular as vendas de produtos como o filtro solar e hidratantes com o protetor adicionado à fórmula. “Esta foi a forma encontrada para desenvolver o nosso negócio de cuidados da pele no Brasil”, explica. Talvez esses esforços venham a atrair as clientes de farmácias e supermercados que, até agora, passavam longe das gôndolas de produtos para o rosto.
Veículo: Brasil Econômico