Lidl e Aldi, as alemãs que mudaram a França

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Supermercados: As redes de descontos, com suas marcas próprias, obrigaram grupos como Carrefour e Casino a reagir

 

Quando as redes de supermercados alemãs Lidl e Aldi chegaram à França, no final dos anos 80, os dirigentes dos tradicionais grupos franceses do setor sorriram, menosprezando a concorrência. Afinal, a imagem dessas empresas, que adotaram o modelo de varejista de descontos, estava longe de ser das melhores: vendiam apenas produtos de marca própria, vistos então como artigos de qualidade inferior e destinados a pessoas de baixíssima renda; e ofereciam um número limitado de artigos. Suas lojas, sem nenhuma decoração, mais pareciam depósitos de mercadorias. As varejistas de "maxidescontos" não representavam uma ameaça.

 

O grupo Carrefour já havia lançado, no fim dos anos 70, uma rede de "maxidesconto", a ED (mais tarde se tornaria a rede Dia, que teve o capital aberto na bolsa de Madri, recentemente). Na ED havia um mix de produtos de marca própria e de grandes fabricantes.

 

Mas as duas varejistas alemãs, pesos-pesados mundiais desse setor de lojas de descontos, conseguiram espaço nos últimos anos no concorrido mercado francês com suas políticas agressivas de preços. Ampliaram consideravelmente seu parque de lojas (1,5 mil no caso da Lidl e cerca de 900 supermercados Aldi) e obrigaram o sofisticado varejo francês a reagir.

 

Todos os grandes grupos, como Carrefour, Auchan, Leclerc e Casino (sócio do Pão de Açúcar), reforçaram o lançamento de produtos de marca própria, que se tornaram fundamentais na estratégia de aumentar o faturamento. No caso do Carrefour, as marcas próprias já representam 25% das vendas e deverão passar a 40% no médio prazo, segundo o CEO Lars Olofsson.

 

Apenas neste ano, serão lançados mais de mil produtos Carrefour na Europa, principalmente nas áreas de congelados e orgânicos. O grupo também havia criado em 2009 a linha Carrefour Discount, com preços ainda mais acessíveis do que os artigos da marca Carrefour. A nova gama mais barata vem sendo ampliada, inclusive com eletrodomésticos de pequeno porte, lançados neste ano. "A linha Carrefour Discount é voltada para concorrer com os artigos das varejistas alemãs", diz uma fonte da empresa francesa.

 

No Casino, os produtos de marca própria já correspondem a mais da metade do volume total de vendas. O grupo também possui uma filial de lojas de descontos, a Lider Price, que prevê ampliar sua rede de 585 lojas para mil em 2014.

 

É certo que as alemãs Lidl e Aldi têm uma fatia pequena do mercado francês (4,7% e 2,5%, respectivamente), mas nem por isso sua importância é minimizada. Suas lojas - com iluminação em néon, piso linóleo de plástico, corredores lotados de caixas empilhadas e produtos expostos nas prateleiras nas embalagens em papelão - continuam as mesmas, sem nenhum charme. Mas as empresas mudaram e muito.

 

Os dois grupos alemães, que não são cotados em bolsa e mantêm segredo em relação às suas estratégias e contas, tiveram uma ascensão espetacular nos últimos dez anos. A Lidl passou de 49ª no ranking global de varejistas em 2000, para 5ª neste ano, segundo a consultoria Deloitte, que publica anualmente um estudo sobre os "campeões mundiais do varejo".

 


A Aldi passou da 23ª posição em 2000, para 8ª, neste ano. Ou seja, ambos estão no grupo das dez maiores varejistados do mundo, liderado pela americana Walmart, seguida pelo Carrefour. O Pão de Açúcar, a maior varejista do Brasil, ocupa o 75º lugar no mundo.

 

Segundo a Deloitte, a Lidl (principal empresa do grupo Schwarz) faturou US$ 77,2 bilhões em 2009 e registrou expansão médio anual de 9,8% das vendas mundiais entre 2004 e 2009. No mesmo período, o faturamento da Aldi cresceu 6,3% ao ano, atingindo US$ 67,7 bilhões. As duas redes não têm loja em grandes países emergentes da Ásia ou da América Latina.

 

A Lidl, líder mundial das redes de descontos, possui cerca de 10 mil lojas, todas na Europa, em 26 países. O processo de internacionalização da empresa foi acelerado a partir dos anos 90. A empresa foi criada em 1973 por Dieter Schwarz, filho de um atacadista de frutas e legumes, que se inspirou no modelo da rival Aldi.

 

Em uma entrevista ao jornal alemão "Lebensmittel Zeitung", o presidente do grupo Schwarz, Klaus Gehrig, afirmou que não há interesse em se instalar nos mercados emergentes. "Rússia não, China, duplamente não", declarou, ressaltando acreditar não ser possível obter ganhos suficientes de escala nesses países, já que a burocracia impediria uma rápida multiplicação da rede de lojas.

 

Diferentemente da Aldi, a Lidl passou a introduzir marcas tradicionais em suas lojas, o que foi considerado uma "sofisticação" de seu estilo e uma mudança para o chamado "soft discount".

 

Uma polêmica ofusca, no entanto, a trajetória da Lidl: a política trabalhista da empresa. Ela é acusada de não respeitar a legislação. Também foi envolvida em um escândalo de espionagem de seus empregados, com câmeras de vídeo e gravações sonoras.

 

O grupo Aldi, abreviação de Albrecht Discount, conta com uma rede de mais de 8 mil lojas e também está presente na maioria dos países europeus, mas possui filiais nos Estados Unidos e na Austrália. Como a Lidl, a companhia também é uma familiar. Foi fundada em 1913 pela mãe dos irmãos Theodor e Karl Albrecht, que assumiram o negócio (na época apenas uma loja de alimentos) após a Segunda Guerra Mundial.

 

Eles adotaram uma mudança determinante para o sucesso da empresa: em vez de aplicar reduções nos preços no final do ano, em função do total das compras dos clientes (que juntavam cupons ao longo do ano), eles decidiram aplicar descontos imediatos sobre o valor dos produtos. Pouco a pouco a Aldi instalou lojas em toda a Alemanha e começou a se desenvolver internacionalmente. Hoje, está presente em 18 países.

 

Após ter tido bons resultados no auge da crise econômica mundial, em 2008 e 2009, as lojas de "maxidesconto" na França perderam fatia de mercado no ano passado, que passou de quase 15% para 13,6% das vendas globais do setor, segundo a Kantar Worldpanel.

 

A explicação para isso é que os supermercados tradicionais, para lutar contra os efeitos da crise, fizeram uma guerra de preços e inundaram o consumidor de promoções. Mesmo assim, os alemães resistiram e mantiveram suas participações estáveis. Já a rede Dia, do Carrefour, não pode dizer o mesmo. A fatia do Dia caiu 0,2%, atingindo 2,3% do mercado francês, no ano passado. Na França, as vendas do Dia encolheram 8,4% em 2010. Prova que a concorrência com os alemães não é brincadeira.

 


Veículo: Valor Econômico


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