Na disputa entre os Peralta, o caixa do grupo encolheu

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Os herdeiros do grupo Peralta, fundado nos anos 60 em Cubatão (SP) e que chegou a liderar o varejo de supermercados na Baixada Santista, travam uma disputa judicial há nove anos e no lance mais recente, no fim de agosto, a Justiça determinou a penhora de R$ 86 milhões nas contas das empresas que estão em apuração de haveres (avaliação do montante devido a sócio que se retira de uma sociedade). Foram encontrados menos de R$ 5 milhões.

A rede Peralta chegou a ter 37 lojas no litoral e interior de São Paulo. Ao longo do tempo, a família Peralta ampliou e diversificou os negócios. Criou outra rede de supermercados, o Paulistão; construiu shoppings centers; e comprou fazendas de rebanhos de gado. Em 1999, o Grupo Pão de Açúcar comprou o fundo de comércio dos supermercado Peralta.

Com a venda para o Grupo Pão de Açúcar, o maior grupo varejista do país, atualmente, a bandeira do supermercado Peralta deixou de existir. A rede Paulistão permaneceu ativa. Segundo o site da empresa, o supermercado conta hoje com 33 lojas espalhadas por 20 cidades do interior do Estado de São Paulo. A cidade que concentra o maior número de lojas é Bauru, com cinco endereços.

Herdeiros do grupo que chegou a liderar o setor de supermercados na Baixada Santista estão na Justiça há nove anos

A partir da venda do Pão de Açúcar, as desavenças entre os quatro herdeiros - já existentes desde a morte do pai e fundador do grupo Joaquim Peralta, em 1992 - acentuaram-se, culminando com a saída do primogênito Armando Peralta do comando dos negócios.

Em 2001, ele entregou aos irmãos um pedido formal de retirada das sociedades do grupo, por meio da cisão dos bens das empresas. O pedido foi aceito, mas o patrimônio não foi dividido nos termos propostos por Armando, considerados "absurdos e leoninos" pelos outros filhos Antonio, Basílio e Fernando. Os três entraram na Justiça com uma ação de apuração de haveres para definir o valor correspondente aos herdeiros.

Os três irmãos disseram, por e-mail, que a saída de Armando "foi o resultado de um prolongado processo de distensões entre os sócios, provocado substancialmente pela postura egocêntrica e autoritária do Armando, que, mesmo na condição de sócio com 27,5% de participação, agia como se tivesse 100% dos votos nas decisões das empresas".

"Sempre tive, não oficialmente, o gerenciamento geral do grupo. Eu era aquela pessoa que criava mais atrito porque não tinha como deixar de ser exigente. Ninguém consegue, a partir de uma mercearia, fazer um patrimônio desses sem muita austeridade", diz Armando. Segundo ele, a decisão dos irmãos de recorrer à Justiça ao invés de dividir o patrimônio no ato de seu desligamento foi estratégica, já que o embate nos tribunais costuma levar anos, esgotando as partes. "Com isso, buscavam forçar um acordo em condições menos favoráveis", explica um dos advogados de Armando, Marcelo Guimarães da Rocha e Silva.

No início de julho, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ratificou decisão da 3ª Vara Cível de Santos e concedeu antecipação de tutela determinando o pagamento de R$ 86.385.039,06 a Armando. O montante corresponde a 27,5% do valor de R$ 314.127.414,76, apresentado pelo assistente dos autores da ação como sendo o total dos bens imóveis (ativos) das dez empresas do grupo em apuração de haveres, com base em outubro de 2002. O valor é um quarto do apresentado pelo perito assistente de Armando, que computou um patrimônio imobilizado quando ele deixou o grupo avaliado em R$ 1.283.807.800,00. A perícia do juiz estimou em R$ 649.090.504,00.

"Com base nisso, foi pedido que o juiz determinasse o pagamento de 27,5% sobre o valor incontroverso (incontestável, já reconhecido), ignorando por ora o valor do perito judicial e do nosso assistente", diz Sérgio Luiz A. Marcondes, outro advogado que representa Armando. Em 19 de agosto, o juiz Gustavo Antonio Louzada, da 3ª Vara Cível de Santos, determinou o bloqueio online nas contas das empresas, para resgatar o valor de R$ 86 milhões mais a correção monetária. Foram encontrados menos de R$ 5 milhões.

"Tudo indica que eles estejam desviando altos valores do grupo para não pagar o que devem. Eles criaram seis outras empresas paralelas com as mesmas atividades para investir os recursos advindos dos shoppings, dos aluguéis e do próprio Paulistão", diz Armando. "Se uma empresa tinha um patrimônio de R$ 1 bilhão em 2002 e hoje só tem R$ 5 milhões na conta corrente, está mais do que caracterizada a fraude à execução", diz Marcondes. No dia 5 de setembro, os advogados de Armando entraram com uma petição solicitando a nomeação de um administrador judicial. "É um pedido de intervenção. Chegamos a uma fase extrema, essa é a razão do pedido de um administrador judicial, porque eles não têm mais condição de administrar, eles estão desviando o patrimônio, dilapidando", diz Marcondes. A Justiça ainda analisa o pedido.

Antonio, Basílio e Fernando recorreram da ordem de penhora online. Responderam que o valor de R$ 86 milhões foi fixado apenas com base nos valores dos bens imóveis, apurados pela perícia de engenharia, "sem computar, portanto, como seria de rigor, os passivos sociais". Estes ainda estão em análise por uma outra perícia, de natureza contábil. "Tal questão, relacionada à necessidade do cômputo dos passivos, foi objeto de recurso e ainda está sub judice. Não se trata, portanto, de um valor incontroverso", sustentam.

Segundo eles, a ausência de montantes de vulto em caixa deve-se ao fato de a quase totalidade do patrimônio das sociedades ser representada por "aplicações no ativo permanente". Negaram qualquer desvio de bens para frustrar o pagamento de haveres de Armando. Informaram que "já existe um bem caucionado judicialmente para permitir o pagamento dos haveres, escolhido pelo próprio Armando, cujo valor, conforme reconhecido por ele na ocasião, é mais do que suficiente para garantir o pagamento que foi agora determinado, sem a necessidade da constrição de outros bens imóveis e/ou de dinheiro".

Armando diz temer se haverá dinheiro suficiente para receber sua fatia ao fim do processo. "Dependendo do prazo que demorar a ser finalizado, todo o patrimônio das empresas que estão em apuração de haveres e das pessoas físicas talvez não sejam suficientes para pagar os 27,5%, porque os juros contam desde aquela época".

Desde 2007, Armando e os filhos recebem uma pensão mensal de quase R$ 280 mil que será abatida do valor objeto da antecipação de tutela, conforme despacho do Tribunal. Ele ressente-se da forma como saiu do grupo. Após seu pedido de desligamento, diz, os irmãos o teriam excluído das empresas por meio de uma assembleia para a qual não foi convocado: "No dia seguinte fui trabalhar normalmente e tinham 12 seguranças armados à minha espera e dos meus filhos, quatro supervisores do grupo, e mais dois detetives à paisana". Os irmãos negam a expulsão, classificando-a de falsa.


Veículo: Valor Econômico


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