A expectativa de o Brasil se consolidar como uma plataforma de exportação de arroz começa a mudar a cara de um segmento até pouco tempo desprezado pelos grandes players do agronegócio. Diante do recente aumento dos excedentes na produção de arroz, multinacionais como Louis Dreyfus Commodities (LDC), Archer Daniels Midland (ADM), Noble, Olam e Novel já marcam presença nesse mercado.
O caso mais emblemático é o da francesa LDC, que começou a originar arroz no Rio Grande do Sul apenas em 2010 e deverá encerrar o ano como principal exportadora de cereal do país, com cerca de 700 mil toneladas.
O Brasil nunca participou ativamente do mercado global de arroz, posicionando-se mais frequentemente na lista dos grandes importadores. Entre os anos-comerciais 2000/01 e 2003/04, o país embarcou um volume total de 187 mil toneladas. No mesmo período, importou quase 4,4 milhões de toneladas do cereal, especialmente dos vizinhos do Mercosul, segundo o Instituto Riograndense do Arroz (Irga).
O cenário começou a mudar apenas a partir da temporada 2004/05, quando os embarques atingiram, pela primeira vez, a casa das 370 mil toneladas. De lá para cá, deram um salto sem precedentes. Desde o início do ano-comercial 2011/12, iniciado em março, o volume ultrapassa a marca de 1,4 milhão de toneladas - um crescimento de 255% sobre o apurado entre março e outubro de 2010.
O aumento dos embarques reflete, em parte, a estratégia das tradings de diversificar suas origens do arroz destinado aos países africanos, em virtude dos cada vez mais frequentes problemas climáticos na Ásia. Entre 2007 e 2010, por exemplo, a LDC triplicou o volume de arroz originado na América do Sul.
Marco Aurélio Amaral, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Arroz Parboilizado, observa que o Brasil possui enormes vantagens logísticas em relação aos fornecedores de arroz tradicionais. "Levamos só 30 dias para chegar à África, enquanto navios da Tailândia levam 60 dias", observa o executivo. "Mostramos que temos um produto de qualidade, uma indústria competitiva e regularidade de entrega", acrescenta.
Para Camilo Oliveira, assessor da unidade de alimentos da Cooperativa dos Agricultores do Plantio Direto (Cooplantio), responsável por mais de 12% das exportações domésticas de arroz na safra atual, o aumento das exportações e a maior participação das tradings estrangeiras vão permitir ao setor modernizar seus instrumentos de comercialização. "Como não há um contrato futuro de arroz, negociado em bolsa, a instabilidade é muito grande. O produtor planta com a saca a R$ 30 e vende a R$ 18", afirma, referindo-se à forte queda dos preços que obrigou o governo a intervir no mercado neste ano. "Estamos chegando perto do ponto no qual a BM&FBovespa poderá montar um contrato futuro para o arroz no Brasil", acredita Amaral.
André Barretto, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Arroz (Abiarroz), afirma que a preocupação agora é criar condições para que o Brasil possa se consolidar como exportador. "Ainda estamos conquistando os mercados consumidores. As oportunidades mais evidentes estão na África e no Oriente Médio, mas precisamos investir e agregar valor para disputar o mercado europeu". Em setembro, a entidade firmou um convênio com a Apex com o objetivo de mapear oportunidades no exterior e capacitar indústrias e cooperativas a exportar.
Claudio Pereira, presidente do Irga, diz que a chegada das tradings é bem-vinda "se ajudar o Brasil a abrir novos mercados, mas prejudicial se estimular a concentração do setor".
O arroz é um dos grãos mais consumidos em todo o mundo, mas os maiores consumidores são também os maiores produtores do cereal, razão pela qual o comércio entre países é marginal. Segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), as exportações globais não deverão passar de 33 milhões de toneladas no ano-safra 2011/12, o que corresponde a apenas 8% da produção global. África e Ásia respondem por cerca de 85% desse comércio.
Pereira acredita que o mercado tende a se ampliar nos próximos anos. "Os países asiáticos têm limitações para expandir a produção e podem se tornar importadores nos próximos anos, e o aumento da renda na África tem estimulado o consumo no continente ", afirma Pereira, do Irga. "Estamos nos firmando como produtores de excedentes. O Mercosul caminha para ser, no futuro, um grande fornecedor global", anima-se.
Veículo: Valor Econômico