Natal é tempo de fraternidade, desde que não haja um velhinho pagando tranquilamente as suas compras no caixa do supermercado. Quando isso acontece, homens e mulheres de boa-vontade, e menos idade, esquecem a máxima aquela de respeitar os mais velhos. E a fila vira um festival de reclamações.
Admiro os velhinhos e as velhinhas com disposição para ir ao supermercado, eu que só me animo a abastecer a casa quando a geladeira já virou um deserto. Velhinho no supermercado pode tudo, apertar os pãezinhos até achar o mais crocante, fazer o rapaz da fiambreria tirar e recolocar as fatias até completar exatas cem gramas de queijo, pedir bis nas mesas de degustação. É um prazer ver as senhoras de cabelos brancos escolhendo tomates com os critérios que só as muito experimentadas em molhos têm. E os senhores que estacionam os carrinhos para uma conversa no meio do corredor, coisa boa de se ver.
Para a minha mãe, passada rápida no supermercado foi algo que jamais existiu. Qualquer produto com remota cara de novo merecia um certo assombro e nunca faltou o trololó com a moça do caixa. A senha do cartão de débito era digitada com concentração máxima e zero de pressa. Se fosse o caso de procurar moedas na carteira, aí quem estava atrás na fila já começava a bufar. Eu, esperando para carregar as sacolinhas dela, bufava.
Quando não se tem mais um velhinho por perto, olhar para os outros velhinhos dá uma saudade danada. Fora a culpa de não ter encarado com paciência as idas ao súper em busca de um amaciante alguns centavos mais barato.
Por isso, se um velhinho trancar a fila do caixa porque não pesou as maçãs ou porque não se afoba para pagar, o jeito é encarar a situação com bom humor e, principalmente, com a tal da fraternidade. E não só no Natal.
Sem esquecer que, se tudo der certo, um dia a gente também vai chegar lá.
Veículo: Zero Hora - RS