Tempo para análise, de 90 dias, é descumprido pela agência e empresas chegam a esperar até um ano; Anvisa diz que precisa contratar funcionários, credenciar laboratórios e aumentar prazos
Uma nova vertente de judicialização na área de saúde ganha força no País. Agora, além de ter as secretarias estaduais e o Ministério da Saúde como alvo, as ações são movidas contra a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O movimento é formado por empresários que, cansados de esperar, recorrem à Justiça para que a agência apresse a análise de pedidos para registro de remédios e produtos de saúde - documento indispensável para entrar ou permanecer no mercado.
Por lei, a agência tem 90 dias para julgar as solicitações de registros de novos medicamentos ou produtos como luvas, órteses e aparelhos de diagnóstico. Mas o prazo nunca é respeitado. Muitos pedidos ficam na fila por mais de um ano.
A reação dos empresários começou timidamente há dois anos e agora ganha corpo. O procurador da Anvisa, Maximiliano D'Avila Cândido, afirma que todas as semanas chegam entre 6 a 12 mandados de segurança com determinações para que a Anvisa analise, com prazo determinado, o registro de algum produto.
O diretor administrativo da Associação Brasileira de Empresas Certificadas (Abec), Evaristo Araújo, conta que todos os meses ingressa com pelo menos um mandado de segurança. "Não perdemos nenhum." Ele afirma que, no início, empresários resistiam em ingressar com ação contra a Anvisa porque receavam ser vítimas de perseguição. "Mas a situação ficou insustentável."
Araújo, também advogado da Abec, explica que quanto mais se adia o ingresso de um produto no mercado, mais a empresa perde dinheiro. O impacto, avalia, não se restringe às empresas. "Se não há competição no mercado, preços se mantêm altos, o que não é bom nem para consumidor nem para o governo, um dos maiores compradores de produtos de saúde para o SUS."
Cândido reconhece o atraso da análise, mas avisa que não há como o problema ser resolvido de um dia para o outro. Para maior agilidade, diz, seria necessária a adoção de pelo menos três medidas: contratação de encarregados da análise, credenciamento de novos laboratórios para testar produtos, insumos e medicamentos e mudança na lei que define prazos. "Não temos condições de seguir o tempo estabelecido na norma. Não se encaixa mais no mercado atual, com complexidade dos produtos a serem analisados nem com o volume de pedidos que chegam todos os dias."
Soluções. O procurador da Anvisa diz que parte do problema será solucionada, em 2012, com um concurso para contratar encarregados de analisar os pedidos de registro. Também serão credenciados laboratórios públicos oficiais para auxiliar na análise dos produtos em processo de registro. Mesmo com as mudanças, avisa, o prazo de 90 dias dificilmente será cumprido. "É preciso mudar a lei."
Cândido diz que nem todos os juízes concedem mandados. Quando isso ocorre, geralmente a decisão estabelece novo prazo para que a Anvisa analise o pedido. Nunca ocorreu, completa, de a agência ser obrigada a dar registro sem o cumprimento de todas as etapas de avaliação.
A estratégia de recorrer à Justiça para garantir o cumprimento de prazos, na avaliação do procurador da Anvisa, pode resolver pontualmente problemas dos empresários, mas, a médio prazo, tumultua o sistema. "É uma bola de neve. Técnicos saem do trabalho para cumprir os mandados judiciais, deixando a fila original de lado." Para ele, tal situação provocará duas filas, a dos pedidos com e sem mandado de segurança. Uma anda rápido; a outra, cada vez mais lentamente.
Além de trazer insegurança ao mercado, a avalanche de processos impede o planejamento do trabalho. "Fica apenas uma atividade reativa. Se falar nos custos para o Estado e a Justiça."
Veículo: O Estado de S.Paulo