Schmidt sai de São Paulo para cortar despesas

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A fabricante de porcelanas Schmidt dará início hoje a mais uma etapa do processo de enxugamento de custos e recuperação de margens que começou há 15 meses, quando estava prestes a fechar as portas. A empresa vai desativar a unidade de Mauá, interior de São Paulo, e transferir para Campo Largo, no Paraná, o trabalho de decoração de peças que era executado lá. Serão feitas 250 demissões até o fim do mês e o restante do pessoal, de um total de 389, deve receber o aviso de desligamento em fevereiro e março.

A intenção é vender para construtoras o terreno de 70 mil metros quadrados localizado no centro do município paulista, avaliado em cerca de R$ 40 milhões, e usar o dinheiro para o pagamento de dívidas e para fazer investimentos em modernização.

Parte da estratégia executada até agora já envolveu a negociação de ativos. A Schmidt tinha 69 imóveis, entre urbanos e áreas de reflorestamento, e metade foi vendida para quitar débitos trabalhistas (R$ 15 milhões em 2011), impostos atrasados e empréstimos. A empresa, que entrou em recuperação judicial em 2008, ainda acumula dívidas de R$ 200 milhões, mas seu presidente, Nelson Lara, garante que o pior já passou. "Em novembro e dezembro voltamos a operar no azul", conta.

O faturamento, que foi de R$ 70 milhões em 2001, despencou para R$ 46 milhões em 2010 e, no ano passado, chegou a R$ 75 milhões, mas com prejuízo de R$ 8 milhões no exercício. Com os planos em andamento, o objetivo é alcançar R$ 120 milhões em receitas em 2012 e, com o fechamento de Mauá, que gerava R$ 1 milhão em prejuízo por mês, voltar a dar lucro. Os investimentos para o ano estão estimados em R$ 6 milhões.

Lara estava afastado da Schmidt desde 2001, depois de ter trabalhado 23 anos na área comercial. Ele foi casado com uma das sócias e estava atuando como consultor quando foi chamado para voltar, em setembro de 2010. Na ocasião, parte da família, detentora de 68% das ações, decidiu retirar do comando Harry Schmidt, que ocupava o cargo de presidente, e seu filho Walter, que era diretor financeiro. Eles são donos de 32% da empresa e comandavam o negócio desde a morte de um dos fundadores, Arthur, em 1993. A situação não era boa.

Entre julho e agosto de 2010, a fabricante de porcelanas criada em 1945 ficou sem produzir por 45 dias. "Os 1,1 mil empregados estavam sem perspectivas de futuro, não havia estoque e clientes e fornecedores não tinham expectativas", lembra Lara. Foi com a antecipação de R$ 1,5 milhão feita por dois clientes que a produção recomeçou. "Compramos matéria-prima, demos R$ 400 para cada empregado e pedimos para eles voltarem a trabalhar", lembra.

A concorrência com a porcelana chinesa, hoje dona de aproximadamente 60% do mercado brasileiro, fez mal para a Schmidt, mas na opinião de Lara foram decisões erradas que levaram a empresa a se afundar.

Na sua avaliação, a direção da companhia errou ao promover especializações das fábricas, a partir de 1994. Em Pomerode (SC) são feitas xícaras, pires e canecas; de Campo Largo (PR) saem pratos, travessas e bules; e em Mauá (SP) era feita a decoração das peças, com pintura e colocação de decalques.

"A logística ficou complexa", afirma o executivo. "O custo de ter três unidades não fazia mais sentido", diz, sobre a decisão de fechar as portas de uma delas.

Um forno de decoração já foi transferido para o Paraná há cinco meses e outro virá em breve. Em Campo Largo (PR), a empresa contratou 200 pessoas e outras 50 devem ser chamadas. Vilmar Fior, por exemplo, que aprendeu a filetar manualmente as peças com ouro líquido nos anos 80 na Schmidt, estava trabalhando em outra empresa e foi chamado para voltar.

Outra estratégia classificada como errada, tomada em 1998, foi a abertura de 18 lojas próprias. Além das despesas geradas pela decisão, Lara diz que foi criada uma confusão no mercado e a Schmidt passou a concorrer com o varejo. Hoje, há apenas três lojas, instaladas ao lado das fábricas.

Com o passar do tempo e as dificuldades de caixa, a marca, que era símbolo de status, fazia parte de quase todas as listas de casamento, estava nas porcelanas da presidência da República e nos melhores hotéis e restaurantes, envelheceu.

Além das chinesas, mais baratas, concorrentes como Oxford e Germer ganharam espaço. "Quando há falta de dinheiro, você desvia o foco e passa a pensar só nisso", diz Lara.

Hoje, os jogos de jantar tradicionais, decorados com flores, ainda respondem pela maior parte das vendas, mas a empresa passou a fazer peças mais modernas e vai reduzir o portfólio. Em vez de 1.870 artigos, passará a fazer cerca de 300, e deixarão de ser produzidos itens como cinzeiros e copos para ovos. O cliente que quiser algo especial, como os exibidos em salas e paredes da fábrica de Campo Largo (PR), vai pagar mais caro.

Lara observa que há um grande potencial de venda no segmento de bares, hotéis e restaurantes, devido ao crescimento do turismo e de eventos esportivos que o Brasil vai sediar.

O executivo acredita que, como os pagamentos estão em dia, a recuperação judicial possa ser levantada em breve, abrindo as portas do crédito bancário.

Em fevereiro, a Schmidt passará a ter escritório em São Paulo, focado na área comercial. "Vou ficar dois dias em São Paulo, dois no Paraná e um visitando clientes", conta o executivo, que tem outros planos para o futuro.

"Meu sonho é deixar Pomerode voltada para o varejo e Campo Largo para bares, hotéis e restaurantes", conta. "Vamos pensar nisso em dois ou três anos."

Questionado sobre a possibilidade da entrada de um sócio, como foi estudado em 2010, ele não descarta a possibilidade, mas diz que "ainda não é o momento".

Em relação a estratégias para recuperar o espaço perdido, afirma que a tentativa de acompanhar o preço chinês foi um erro. "Dobramos os preços em quatro meses", conta. "Alegamos que em dez anos não fizemos reajustes."

"O que temos de melhor é a marca e a tecnologia", diz o presidente da Schmidt. Mas se nada for feito pelo governo para frear o crescimento das fabricantes chinesas, ele não descarta a possibilidade de também virar um importador. "Não corremos mais riscos, mas a situação ainda exige cuidado."


Veículo: Valor Econômico


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