Qualidade de vida também no trabalho

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Quem ouve falar de qualidade de vida no trabalho e logo pensa em algum tipo de atividade supostamente capaz de trazer equilíbrio entre vida física e espiritual, certamente teria uma surpresa ao conversar com Ana Cristina Limongi, coordenadora do curso de pós-graduação Capacitação em Gestão de Qualidade de Vida no Trabalho, da Fundação Instituto de Administração (FIA). Para ela, a expressão é malcompreendida, uma vez que poucos sabem que uma verdadeira gestão da qualidade de vida no trabalho está apoiada em um tripé que envolve uma visão ampla do que seja saúde, qualidade e sustentabilidade.

 

"Temos poucos modelos teóricos. E eles ainda focam muito na saúde. É necessário dar mais atenção a questões econômicas, como o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)", declara. "O mercado começando a entender o que é gestão da qualidade de vida no trabalho. Mas há o problema da capacitação. Há muita coisa zen, que não se sustenta. Tem muita picaretagem", lamenta.

 

Apesar da falta de conhecimento do mercado sobre o tema, sua importância tem recebido atenção das instituições de ensino de ponta, como a FIA, que criou seu curso de pós-graduação na área no começo deste ano e já planeja estabelecer, no segundo semestre de 2009, um MBA sobre sustentabilidade e gestão de qualidade de vida no trabalho. Outra instituição que oferece um curso na área é o Centro Universitário São Camilo, que possui um MBA em Gestão de Promoção de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações.

 

Mas além do reconhecimento das instituições de ensino, fatores conjunturais também têm favorecido a disciplina, como os custos crescentes dos planos médicos (que levam as empresas a investir na prevenção de doenças e manutenção da saúde) e os gastos com os passivos trabalhistas. Apesar disso, Ana Cristina é da opinião de que ainda há muito por fazer: "inúmeros presidentes de empresas têm medo da gestão de qualidade de vida. Argumentam que não é possível parar a produção e cuidar de pessoas".

 

Desafios da carreira

 

Para ela, quem deseja se tornar um gestor na área precisa ter em mente que precisará estruturar bons projetos (mesmo que de curto prazo), fazer diagnósticos precisos da cultura corporativa e ser capaz de associar métricas da gestão de qualidade de vida às métricas empresariais. "Não se pode criar uma programa humanitário aleatório. A ações precisar ser profissionalizadas. Pois quando a gestão é malfeita, é difícil que a empresa volte a realizar um ação dessas - já que a prática pode ser invasiva", diz Ana Cristina, avisando que mexer com a qualidade de vida no trabalho é uma das mudanças mais difíceis na cultura organizacional, porque impacta as relações de poder e o ritmo dos processos.

 

Ela ressalta ainda que esse tipo de gestor precisa ter uma visão muito humanista do cotidiano corporativo, sendo capaz de respeitar as pessoas sem perder de vista a produtividade. Ou seja, os desafios impostos à área são consideráveis, para dizer o mínimo. "É preciso conhecer o planejamento de produção e identificar quais são os seus gargalos, por exemplo. Também é importante qualificar as lideranças", acrescenta. E, claro, não dá para deixar de lado a cultura organizacional da empresa em questão e esperar milagres do dia para a noite. "O gestor tem que saber que existem limitações. E que as questões econômicas podem tornar os programas de questão de qualidade de vida no trabalho frágeis se eles não estiverem embasados em bons números", orienta.

 

Cleise Zolin Garjulli, diretora de qualidade de vida da New Port Consultoria em Benefícios, é uma profissional com considerável experiência no assunto. Em 1995, ela implantou o Qualidade de Vida do BankBoston, programa que conduziu até 2006. Segundo ela, a iniciativa começou em um momento de crescimento do banco e serviu para integrar às pessoas que estavam chegando à cultura da empresa. "Era um programa com foco em vida e alimentação saudável e envolvia também ações antitabagistas, vacinação, práticas de atividade física e até cidadania", rememora.

 

Segundo ela, no passado a qualidade de vida no trabalho tinha um foco muito grande na saúde física, mas com o tempo as questões emocionais entraram em pauta e a disciplina passou a se preocupar também com as relações desenvolvidas no ambiente de trabalho. Por isso, houve uma significativa mudança no perfil do profissional que atua com o tema. A área não é mais dominada por médicos e professores de educação física, ou seja, pessoas oriundas da área de saúde ocupacional. "Hoje o profissional que lida com qualidade de vida no trabalho precisa ser versátil, um verdadeiro gestor, pois necessita entender a estratégia da empresa. O programa tem que trazer benefícios também para a companhia, não só para as pessoas", observa. "Hoje o funcionário é um dos maiores valores da empresa. É quem detém o conhecimento e faz a diferença", adiciona.

 

Segundo Ana Cristina, para que um programa ou projeto de qualidade de vida possa ser bem-sucedido, é preciso que seus elementos fiquem claros nos três níveis decisórios de uma empresa: estratégico, tático e operacional. No primeiro, isso significa ter os valores e a missão da companhia alinhados com as questões de bem-estar e cuidado com as pessoas. No tático, é ter agenda, métricas e projetos conectados com gestão de qualidade de vida. Por fim, no operacional, é desenvolver produtos de genuína qualidade.

 

Veículo: Gazeta Mercantil


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