O mercado não conta com um eventual insucesso da Aracruz na negociação com os bancos para pagamento das perdas de US$ 2,1 bilhões sofridas com derivativos de dólar alavancados. Na segunda-feira à noite, a companhia comunicou o adiamento da conclusão do acordo, antes previsto para o fim de novembro, porque não houve consenso entre as partes envolvidas. O novo prazo estabelecido é dia 11 de dezembro. A companhia não quis comentar as informações.
Catarina Pedrosa, analista da Banif Corretora, explicou que a geração de caixa da empresa indica que ela precisa de dez anos para pagar os prejuízos. No entanto, é preciso considerar, segundo a especialista, que a companhia deve investir, no mínimo, o equivalente a depreciação de seus ativos, para que os bens não se deteriorem.
Apesar disso, ela acredita que haverá acordo com os bancos. Catarina lembrou que o setor de celulose é considerado uma das prioridades do governo na área industrial. Dessa forma, não descarta a possibilidade de o BNDES auxiliar a empresa. O banco de fomento é sócio, com 12,5% das ações ordinárias.
No acumulado até setembro, a companhia teve receita líquida de R$ 2,5 bilhões e o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (lajida) somou R$ 928 milhões, já considerando efeitos de provisões e itens extraordinários no período e a fatia na Veracel. O prejuízo de janeiro a setembro alcançou R$ 1,2 bilhão, afetado pelas perdas com os derivativos.
No fim de setembro, a dívida bruta, incluindo os compromissos do projeto Veracel, somava R$ 4,3 bilhões, sendo menos de R$ 500 milhões de curto prazo, e o caixa da empresa estava em R$ 1,1 bilhão. Essa situação mudou bastante com o prejuízo causado pelos derivativos que, em tese, adicionou um passivo de US$ 2,1 bilhões com vencimento imediato. O que a companhia está buscando é justamente uma forma de parcelar esse débito e ainda conseguir recursos para manter suas atividades normalmente.
Para Mônica Araújo, da Ativa Corretora, a empresa terá sucesso na negociação, pois interessa tanto para a Aracruz como para as instituições financeiras. "Não trabalho com a hipótese de a reestruturação financeira não sair."
Segundo a analista, o adiamento da conclusão das discussões com os bancos é negativo, porém esperado. "Diante do aperto de liquidez mundial, do montante significativo envolvido e da falta de visibilidade sobre o cenário de curto prazo, as divergências das partes sobre a reestruturação da dívida ficam ainda mais representativas."
A mudança da diretoria financeira já serviu como um alerta para o mercado de que a negociação com os bancos poderia atrasar, na visão da analista da Ativa.
No dia 17 de novembro , a Aracruz anunciou a saída de Valdir Roque, que havia assumido o posto de Isac Zagury na diretoria financeira após as perdas. Na época, a empresa não explicou os motivos da troca de executivos. Valdir Roque havia assumido o posto de Zagury, vindo da Votorantim Celulose e Papel (VCP), acionista do bloco de controle da Aracruz. Em seu lugar, assumiu Marcos Grodetzky.
Na Bovespa, a reação das ações da Aracruz não sinalizou grandes temores quanto à conclusão das conversas com os bancos. As ações preferenciais classe B (PNB) fecharam em queda de 0,6%, para R$ 1,76. Já as ordinárias tiveram perda mais intensa: -3,6%, para R$ 3,70. Ontem, o Ibovespa subiu 0,7%.
Além dos problemas financeiros, a companhia está convivendo com um mal estar entre os acionistas. Pouco antes do anúncio do prejuízo com derivativos, a VCP, dona de 28% do capital votante da Aracruz, havia anunciado a compra da fatia da família Lorentzen, dona de outros 28% do capital votante, por R$ 2,7 bilhões. O Grupo Votorantim comporia com a família Safra, terceiro sócio com 28% das ordinárias da Aracruz, o controle de uma empresa que combinaria as duas maiores fabricantes de celulose do país.
No entanto, a transação não foi adiante, adiada pela VCP, em função das perdas. Agora, a família Lorentzen quer receber R$ 1 bilhão de multa, segundo números que circulam no mercado, pelo fato de o acordo de venda não ter sido honrado, com o argumento de que não sabia dos derivativos.
Essa disputa levou os três conselheiros ligados aos Lorentzen a renunciarem aos cargos no conselho de administração. Até o momento, os postos permanecem vagos. Apesar desse cenário, o mercado considera que haverá um entendimento dos sócios no futuro, após a reestruturação financeira. Entretanto, há um sentimento de que muitas informações sobre o problema não são públicas, o que retira a atratividade da aplicação, de acordo com especialistas.
Catarina, da Banif Corretora, destaca que os maiores prejudicados da falta de uma solução seriam os próprios sócios, com a deterioração da empresa. Já para Mônica, da Ativa Corretora, tudo está ligado ao problema financeiro.
Veículo: Valor Econômico