Alta rotatividade de cargos pode ser punida

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Mudanças no mercado de trabalho preveem inclusão de barreiras nas formas de acessar seguro-desemprego e unificação de abonos


O governo estuda uma série de mudanças na legislação para diminuir a rotatividade no mercado de trabalho brasileiro. Elas vão desde a criação de taxas extras para empresas que demitirem mais funcionários do que a concorrência até a inclusão de barreiras para acessar o seguro-desemprego e a unificação do abono salarial com o salário-família. A alta rotatividade preocupa, pois eleva os gastos públicos com seguro-desemprego.

Os técnicos sabem que a rotatividade pode ser sinônimo de melhora de salários ou de condições de trabalho. Mas o que preocupa são demissões sem justificativa, que podem representar a simples troca por empregados mais baratos, diminuição de benefícios ou mesmo fraude contra o seguro-desemprego. “Rotatividade é igual a colesterol: tem o bom e o ruim”, ilustra o diretor de Emprego e Salário do Ministério do Trabalho e Emprego, Rodolfo Torelly.

A proposta que está mais adiantada é a de taxar empresas que apresentem um nível de demissões maior do que a do setor em que está enquadrada. Conforme técnicos, a ideia encontra respaldo no artigo 239 da Constituição Federal. Ele diz que o financiamento do seguro-desemprego receberá uma contribuição adicional da empresa cujo índice de rotatividade da força de trabalho superar o da rotatividade do setor. É preciso apenas regulamentar o que já foi definido em 1988.

Por outro lado, avalia-se a possibilidade de gerar descontos para o empregador que apresentar baixo nível de demissões. “Não se trata de uma medida para arrecadar, mas para incentivar a diminuição da rotatividade”, argumenta a diretora de projetos da Secretaria de Acompanhamento Estratégico (SAE), Denise Grosner. “Não queremos amarrar o trabalhador à empresa.”

 As sugestões elaboradas em conjunto entre os ministérios do Trabalho, Fazenda, Previdência e Planejamento, além da SAE, ainda serão apresentadas às centrais sindicais. Depois, têm de ser encaminhadas ao Congresso Nacional. “Com o aumento do emprego formal, o sonho de trabalhar com carteira assinada no Brasil já foi alcançado por muitos. Agora, o segundo passo é tentar proporcionar mais estabilidade ao empregado”, disse Denise.

A proposta deverá esbarrar na resistência dos empregadores. “Somos contrários a qualquer tipo de taxação”, afirma o presidente da Confederação Nacional de Serviços (CNS), Luigi Nese, que é também vice-presidente do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), que administra o seguro-desemprego. Ele diz que a ideia está na contramão das iniciativas recentes da presidente Dilma Rousseff. “O governo quer desonerar, e não onerar as empresas.” Entre os representantes dos trabalhadores, porém, não há consenso. O presidente da Central Sindical de Profissionais (CSP), Antônio Neto, acredita que a criação de uma taxa possa ser positiva. “O governo já fez isso com a questão de acidente de trabalho, e deu resultado. Quando pega no bolso, sempre ajuda”, avaliou. Já o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, vê as mudanças com reservas. “Jamais vamos nos comprometer sem que haja um debate profundo. O governo está muito distante do mundo sindical.”

O diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio, alega que a taxa terá pouco efeito. “Pode inibir uma parte das demissões, que são essas espúrias, feitas com o objetivo de reduzir salário”, argumenta, mas observa que as causas do giro da mão de obra são variadas e exigem estudos mais aprofundados. Pesquisa do Dieese para o Ministério do Trabalho mostra que os setores com maior rotatividade nos últimos anos foram construção civil, seguido por agricultura, comércio e serviços. Em muitos setores, os contratos de trabalho são curtos.
Pedidos de seguro-desemprego chegam a totalizar 500 mil em um mês no País

O mercado de trabalho tem mostrado resiliência à crise internacional, com mais contratações do que demissões de trabalhadores com carteira assinada. Mas os números assustam. Para ter um saldo de 101 mil novas vagas, como o de agosto, foram contratadas 1,8 milhão de pessoas e demitidas 1,7 milhão no período, indicadores que têm sido recordes nos últimos meses.  “Isso é complicado, pois, desse total de demitidos, de 500 mil a 600 mil pessoas vão parar no seguro-desemprego”, disse o diretor de Emprego e Salário do Ministério do Trabalho e Emprego, Rodolfo Torelly.

Uma proposta que está em análise pelo grupo interministerial é a de determinar uma seleção mais criteriosa para o acesso ao benefício concedido a quem sai do mercado. “Queremos mexer no número de meses trabalhados para acessar o benefício”, disse a diretora de projetos da Secretaria de Acompanhamento Estratégico (SAE), Denise Grosner. Basicamente, tem direito ao seguro quem recebeu salário nos últimos seis meses, trabalhou durante um semestre nos últimos três anos, não recebe nenhum benefício do INSS e nem outra renda, e está desempregado.

O pedido pode ser feito por até três vezes em dez anos. Depois disso, o profissional será obrigado a qualificar-se. O foco está no trabalhador que recebe até dois salários-mínimos e que, tradicionalmente, tem um vínculo menor com as empresas. Dados da SAE revelam que a rotatividade do mercado brasileiro é de 40%, enquanto a dos profissionais com menores salários chega a 60%.

As demissões feitas de comum acordo para permitir ao trabalhador sacar o saldo do FGTS e usufruir do seguro-desemprego são uma prática aceita, sobretudo nas pequenas empresas, segundo o vice-presidente do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), Luigi Nese. O diretor do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio, alerta, porém, que, num levantamento recente feito sobre o pagamento do seguro-desemprego nos últimos dez anos, constatou-se que o universo de benefícios passíveis de terem sido fraudados dessa forma era de 5%.

Outro tema em discussão é a unificação do abono salarial com o salário-família. O abono é liberado uma vez ao ano para os trabalhadores cadastrados no PIS. Já o salário-família é pago pela Previdência. O governo quer fazer os pagamentos mensalmente. “A intenção é tornar mais explícito o benefício para que os trabalhadores vejam a vantagem de estarem em um trabalho formal”, explica Denise.
Benefícios são maiores do que investimentos
Os governos do PT aceleraram mais os gastos com pagamento de abono e seguro-desemprego do que com os investimentos. É o que mostra levantamento feito pelo economista-chefe da corretora Convenção Tullet Prebon, Fernando Montero, um especialista em contas públicas. Em 2002, os investimentos foram equivalentes a 0,78% do Produto Interno Bruto (PIB). Este ano, eles estão em 1,1% do PIB, na soma dos 12 meses encerrados em agosto. Ou seja, houve um aumento de 0,32 ponto percentual do PIB. No mesmo período, os gastos com abono e seguro-desemprego passaram de 0,49% do PIB para 0,87% do PIB, uma expansão de 0,38 ponto percentual do PIB.

“Investimos pouco, precisando investir tanto, e gastamos muito com abono e desemprego a despeito de estarmos em pleno emprego”, comentou o economista. Ele observa que há inúmeras razões para o aumento do número de beneficiados com o seguro-desemprego, sendo o crescimento da formalização uma delas. O elevado grau de rotatividade no emprego é outra razão.

Para Luigi Nese, que é vice-presidente do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), colegiado que administra o seguro-desemprego, é preocupante o fato de haver um descasamento entre o crescimento das despesas com benefícios e a arrecadação do FAT. “Mas o dado mais preocupante é o pagamento do abono”, disse. “Ele é atrelado ao salário-mínimo e, como houve a política de valorização, as despesas cresceram bastante.” Ele aponta também o aumento da formalização como fator de crescimento dos pagamentos de seguro-desemprego.

Controvérsia. Em seu levantamento, Montero não considerou, entre os investimentos, os gastos do Minha Casa, Minha Vida. “Isso não é dinheiro do governo, é das famílias que recebem subsídio do Estado”, disse. Os ministérios da área econômica tinham esse entendimento até o ano passado, e os gastos do Minha Casa eram contabilizados como custeio. Mas, em 2012, o Tesouro Nacional passou a classificá-los como investimento.

Assim, do ponto de vista do governo, o quadro é diferente. Por esse critério, também calculado por Montero, os investimentos teriam tido uma expansão de 0,49 ponto percentual do PIB. Maior, portanto, do que o incremento de 0,38 ponto percentual do PIB dos gastos com seguro-desemprego no período.



Veículo: Jornal do Comércio - RS


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