Uma nova onda de desenvolvimento de variedades de café começou a ganhar corpo no Instituto Agronômico de Campinas (IAC). O foco é produzir materiais com características sensoriais distintas, com ênfase em aroma e sabor, que podem ser obtidos a partir de um banco de germoplasma com plantas originais de diversos países que permite cruzamentos com variedades já existentes no mercado. Criado em 2010, o programa deve ganhar em breve seu primeiro parceiro.
As características desejadas não serão definidas pelos pesquisadores, mas por empresas ligadas ao segmento. A intenção é fazer parcerias para ajudar a financiar os estudos e conseguir melhores sabores e aromas ainda não encontrados no mercado.
O novo modelo também tende a significar menos tempo para o lançamento de uma cultivar - para entre dez e 12 anos, ante cerca de 30 anos com o melhoramento genético tradicional.
"A ideia é produzir um café exótico", explica Gerson Silva Giomo, pesquisador científico do IAC e coordenador do novo projeto, intitulado "Programa IAC de Cafés Especiais". Algumas empresas já demonstraram interesse no modelo do projeto e uma multinacional está prestes a fechar parceria com o IAC.
O objetivo é oferecer alternativas ao mercado, de certa maneira muito uniforme em termos de qualidade, já que as duas variedades mais cultivadas no país - a Mundo Novo e a Catuaí - são "parentes" e têm muitas semelhanças genéticas.
Luis Ushirobira/Valor / Luis Ushirobira/ValorFoco das pesquisas conduzidas pelo IAC está na obtenção de cafés exóticos
Por muitos anos, o foco nas pesquisas de novas variedades de café sempre foi produtividade e resistência a doenças. Por isso, desde a década de 1930 -quando começou o pioneiro programa de melhoramento genético de café do IAC-, foram registradas no Ministério da Agricultura 63 cultivares do grão com essas características. Expertise que rendeu ao IAC o domínio do cultivo. O instituto acredita que cerca de 90% do parque cafeeiro do Brasil utiliza suas cultivares.
A necessidade de se investir em variedades com características de qualidade vem de uma espécie de "saturação" de formas de manejo e cuidados pós-colheita adequados para a produção de café especial e gourmet. Giomo analisa que, a partir de um certo ponto desse manejo não é mais possível avançar.
Novos híbridos devem ser formados a partir do cruzamento de variedades já usadas com outras provenientes do banco de germoplasma (conjunto de genótipos, neste caso de plantas nativas de diferentes países).
Os materiais foram coletados em seu estado selvagem, sem manipulação do homem. "Queremos a planta o mais original possível para ver a sua qualidade".
Esse banco do IAC foi formado até a década de 1960 com a aquisição de sementes de cafeeiros originais da Etiópia (berço do café arábica), Quênia, Tanzânia, Uganda, Costa do Marfim, Índia, Colômbia etc. Na época, havia interesse em trazer materiais de praticamente o mundo todo, diante de pouca variabilidade genética para se fazer o melhoramento no Brasil. A FAO, braço das Nações Unidas para agricultura e alimentação, patrocinava expedições para buscar material genético.
Algumas plantas vindas de outros países estão cultivadas em seu estado original na fazenda do IAC em Campinas. Outras já foram melhoradas geneticamente. Nas contas do pesquisador, existem cerca de 300 variações com o germoplasma existente, considerado o mais completo do Brasil.
Já existem de dez a 12 híbridos com possibilidade inicial de serem colocados em campo. Se a parceria com a empresa for fechada ainda neste ano, em 2013 começa o plantio. Em uma média de seis anos é possível fazer o registro do material, mas para chegar ao produtor pode levar mais três ou quatro anos. Já no sexto ano, a empresa pode usar o produto em um microlote.
O orçamento necessário para o projeto inicial é em torno de R$ 1 milhão por ano. Além dos recursos estaduais, as empresas poderiam compartilhar recursos que seriam investidos por meio de fundações. A ideia inicial, diz Giomo, era conseguir várias empresas adeptas a esta atividade de risco. "Por que não essas empresas investirem junto com a gente, dividindo riscos e benefícios?".
Veículo: Valor Econômico