Frete corrói ganho com safra recorde

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Custo para levar uma tonelada de soja de Sorriso, em Mato Grosso, para Paranaguá, no Paraná, aumentou 33% desde março de 2012


Na boca da safra de grãos, a agricultura brasileira está num momento inusitado. A super safra, estimada em 180 milhões de toneladas, entre arroz, feijão, milho, trigo e soja, que já começou a ser colhida no Centro-Oeste, deve proporcionar uma receita recorde, apesar de todas as incertezas que há sobre o ritmo de atividade no mercado interno e externo. Nas contas da RC Consultores, a renda agrícola desses cinco produtos deve somar neste ano R$ 145 bilhões, 18% a mais que em 2012. Mas parte do ganho recorde pode ser corroído pela alta do preço do frete no custo de produção do agricultor.

Entre março de 2012 e janeiro deste ano, o frete rodoviário de soja entre Sorriso (MT), o maior município produtor desse grão no País, e o Porto de Paranaguá (PR) já subiu 33%, segundo os cálculos do Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea). O valor cobrado para transportar uma tonelada de soja entre os 1,6 mil quilômetros que separam as duas localidades é hoje de R$ 260, ante R$ 195 em março do ano passado. "A tendência é que o preço do frete suba mais 30% até o final de março, atingindo 60% de alta em 12 meses", prevê o analista de grãos do Imea, Cléber Noronha.

"Tem um caos logístico. O Mato Grosso nunca colheu tanta soja em janeiro como neste ano", afirma o analista sênior da consultoria Safras & Mercado, Paulo Molinari. A produção do Mato Grosso neste ano é de 24,1 milhões toneladas, com crescimento de 12,7% em relação a safra de 2012, segundo o Imea. E o Mato Grosso é o principal Estado produtor de soja.

Para Gilberto Perusi, presidente da Cooperativa Agropecuária e Industrial Celeiro do Norte (Coacen), que reúne 145 grandes produtores de soja em 5 municípios e que tem sede em Sorriso (MT), "o frete é uma catástrofe".

Lei do caminhoneiro. O custo elevado e as condições precárias do frete sempre foram apontados como problemas na época da safra. Só que neste ano há novos fatores que fizeram com que o quadro piorasse.

"Essa é primeira safra transportada com a 'lei do caminhoneiro' em vigor", lembra Neuto Gonçalves dos Reis, diretor da NTC (Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística), apontando esse como um dos fatores que complicaram a situação. De acordo com a lei, a cada quatro horas rodando na estrada, o caminhoneiro tem de descansar meia hora. Após uma jornada de 11 horas, é obrigatória uma parada de 24 horas, diz Reis.

Com isso, as transportadoras tiveram de contratar mais motoristas e já faltam profissionais no mercado. Reis calcula que existam hoje cerca de 80 mil vagas de motoristas em aberto no País.

Além desse, há outros fatores que pressionam o custo do transporte. Com a mudança no sistema de motorização dos caminhões, o preço do veículo novo subiu entre 8% e 15% e isso onerou o frete. Também o uso do óleo diesel com menor teor de enxofre tornou o litro do combustível R$ 0,10 mais caro, ressalta o diretor da NTC.

De toda forma, o pano de fundo é o volume recorde de produção, que não só amplia a procura por frete, como estrangula a capacidade de armazenamento nas regiões produtoras. Nas contas de Noronha, do Imea, o custo do frete corresponde a 25% do preço da saca de soja, que hoje está em R$ 50, com alta de 28% em relação a igual período do ano passado. "Qualquer baixa que houver no preço da soja, o frete será sentido", adverte o analista do Imea.

Efeito multiplicador. Enquanto o preço da soja se mantém em níveis elevados, sustentado pela escassez do grão no mercado internacional, pelo menos até a colheita da produção americana em setembro, o efeito riqueza proporcionado pela safra recorde brasileira já se espalhou pelo comércio e pela indústria nas regiões produtoras.

Projeções da RC Consultores mostram que a produção de soja deste ano representa 45% dos volume total de grãos e quase 60% da renda agrícola. "O Mato Grosso é a síntese do bom desempenho do agronegócio", afirma o sócio diretor da RC Consultores, Fabio Silveira, responsável pelo cálculo das estimativas, que consideram dados do IBGE e da FGV. Ele ressalta que, sozinho, o Estado responde pela produção de um terço da soja brasileira.

Neste ano o efeito multiplicador dessa riqueza na economia local foi maior não só pelo fato de a cotação da soja estar mais alta, mas também porque parcela mais ampla de agricultores realizaram a venda antecipada do produto. "Cerca de 70% da produção foi vendida antecipadamente", diz Perusi, da Coacen .

O número é confirmado pelo Imea. Em 2012, 60% da safra foi vendida antecipadamente. Noronha conta que o Imea está finalizando um estudo para avaliar o efeito multiplicador da renda da soja na economia do Estado e adianta que o indicador está acima de dois dígitos.


Veículo: O Estado de S.Paulo


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