Os bons preços pagos pela soja, cujos valores chegam a R$ 60,00 a saca de 60 quilos, têm levado muitos produtores gaúchos a optar pelo sistema de rotação de culturas não muito convencional: o cultivo da oleaginosa em áreas de arroz e também de pastagem, especialmente na Metade Sul do Estado. Essa tendência, verificada há pelo menos três safras, fez aumentar a área de soja no Rio Grande do Sul. Um levantamento do Instituto Rio-Grandense do Arroz (Irga) aponta que, da safra 2011/2012 para a atual, houve um incremento de 70% na área cultivada com a oleaginosa em regiões de várzea, saltando de 160 mil hectares para 272 mil hectares semeados. No caso das áreas de pecuária, a Emater-RS estima o plantio de 80 mil hectares de soja em 20 municípios das regiões da Campanha e Fronteira-Oeste.
Além da boa remuneração pela saca da soja, a motivação dos produtores se deve também à possibilidade de melhoras em termos de produtividade do arroz e engorda do gado. O coordenador da Divisão de Assistência Técnica e Extensão Rural (Dater) do Irga, Eraldo Jobim, diz que, entre as regiões que mais têm feito rotação de cultura entre arroz e soja, em área de pousio, estão Santa Vitória do Palmar, Camaquã e Pelotas. “Essa forma de manejo permite a eliminação de sementes contaminadas com arroz vermelho e arroz negro, a partir do plantio da soja, limpando o campo e permitindo o cultivo do arroz livre desse problema”, disse. Segundo o especialista, com essa prática, muitos produtores conseguiram um aumento de 15 sacas por hectare ao plantar um ano de soja, e de 25 sacas ao cultivar a oleaginosa por dois anos. A vantagem de liquidez imediata da soja, com a possibilidade de venda antecipada em mercado futuro, também mobiliza os produtores. “Se vende a soja antecipadamente, ele liquida as contas mais cedo.”
Mas para que as lavouras tenham o resultado esperado, é preciso tecnologia. O assistente-técnico estadual de soja da Emater-RS, Alencar Rugeri, lembra que o produtor corre sérios riscos caso decida plantar “usando apenas a emoção”, com possibilidade de degradação do solo. “Não adianta apenas plantar para aproveitar os bons preços. É preciso usar tecnologias para evitar prejuízos”, enfatiza. Em função disso, a Emater-RS vê com cautela o aumento do cultivo de soja em áreas consideradas não tradicionais para a cultura, uma vez que os solos da região da Campanha são mais arenosos, com alto teor de argila e mais vulneráveis à falta de chuvas. “Não é à toa que ali se planta arroz irrigado”, defende.
Jobim concorda que plantar sem técnicas de manejo corretas pode ser um tiro no pé e ressalta que novas tecnologias têm surgido a cada ano para auxiliar os produtores. É o caso da máquina para plantio de soja em microcamalhão, lançada no ano passado e que permite cultivar soja em áreas alagadas, sem que as raízes da planta fiquem encharcadas. “Essa tecnologia protege as raízes, deixando-as mais secas quando há abundância de chuvas e também que as plantas sejam irrigadas, quando passamos por estiagem”, afirma Jobim. O especialista não acredita na possibilidade de o arroz vir a perder definitivamente espaço para a soja, pois a motivação de plantio pela alta dos preços não durará para sempre. “Plantar arroz é sempre mais seguro. Não ocorrerá substituição, mas, sim, a tendência de rotação de culturas, com uma respaldando a outra”, disse Jobim.
Áreas de pecuária no Rio Grande do Sul aumentam produtividade com rotação de cultura
Os ganhos prometidos com a valorização da soja também começam a redesenhar o cenário da pecuária no Estado. Áreas antes ocupadas por pastagens estão sendo transformadas em território para o cultivo da soja. O membro da comissão de Pecuária da Farsul Carlos Simm diz que os pecuaristas apostam na oleaginosa como melhoradora das áreas ocupadas com aveia e azevém. “No verão, plantamos soja e depois entramos com o gado em cima da lavoura com culturas de inverno. É uma forma de deixar o solo mais fértil e incrementar a produtividade do rebanho, além de obter maior rentabilidade com a colheita da soja”, destacou.
Apesar dos benefícios, é importante que, antes de iniciar o cultivo, os produtores observem o zoneamento agrícola, pois há uma limitação de clima e de solo em parte da Metade Sul. É importante ainda evitar o cultivo em campo nativo, prática que tem se tornado comum no Estado. “Existe uma grande preocupação em relação a isso, pois, com a invasão da soja sobre campo nativo, acabamos prejudicando a produção pecuária, que fica apenas com áreas marginais de pasto, com baixa qualidade”, diz Simm.
O gerente da regional Bagé da Emater-RS, Luis Fernando Fabrício, lembra que a degradação de campo nativo pode ser irreversível ou levar até oito anos para que a área se recupere. “É preciso preservar o bioma Pampa e, além disso, ter em mente que não basta sair plantando soja, é preciso conhecer as técnicas de manejo”, alerta.
Veículo: Jornal do Comércio - RS