Barreiras e outras turbulências levam a retração de 26,6% nos negócios feitos entre empresários mineiros e argentinos
A crise econômica da Argentina e as medidas protecionistas do governo de Cristina Kirchner contribuíram para um corte de 26,6% das exportações de Minas Gerais para o país no ano passado, queda que superou o baque observado em 2009, em plena crise financeira mundial. Naquele ano, marcado pelos efeitos da turbulência irradiada das bolsas de valores, os embarques do estado para o tradicional parceiro no comércio internacional diminuíram 25,72% ante 2008. O abalo nas vendas mineiras continua este ano, com nova redução, de 4%, das exportações no primeiro bimestre a clientes argentinos e a fuga de empresas que se sentem desestimuladas de manter negócios com o vizinho do Mercosul, a exemplo de fabricantes de calçados e de equipamentos eletroeletrônicos.
Os números seguem na mesma linha das exportações brasileiras, que minguaram cerca de 20% em 2012. Para Minas Gerais, a perda é agravada pelo fato de os clientes argentinos absorverem produtos de maior valor, em comparação ao minério de ferro, por exemplo, estrela da pauta de vendas externas do estado e comprado em grandes volume pelos chineses. As vendas mineiras para a Argentina somaram US$ 2,034 bilhões no ano passado, o equilvalente a 6,09% do total (US$ 33,429 bilhões). Entre os cinco maiores destinos das exportações do estado, os “hermanos” responderam pela segunda maior queda, depois do Japão.
No polo calçadista de Nova Serrana, no Centro-Oeste de Minas, exportadores temem prejuízos enfrentados desde o fim de 2011, quando o governo argentino bloqueou emissões de entrada de mercadorias do Brasil. Houve empresas que aguardaram liberação durante um ano e meio com produtos presos no país vizinho, recorda Pedro Gomes da Silva, presidente do Sindicato Intermunicipal da Indústria do Calçado de Nova Serrana (Sindinova). “A Argentina se tornou um negócio de risco. Quando anoitece, as autoridades agem de um jeito em relação às normas do comércio internacional, e ao acordarem encaram o negócio de outra maneira”, afirma o industrial.
Polo da produção de calçados esportivos, a indústria de Nova Serrana estima redução das exportações para a Argentina a até 8% dos volumes embarcados até 2011. Da produção total de 105 milhões de pares no ano passado, 5% foram exportados. Se confirmada a expectativa de expansão das fábricas neste ano, 115 milhões de pares serão fabricados e um percentual pelo menos semelhante deve ser mantido, mas em vez da Argentina, outros mercados vão ganhar espaço, a exemplo da Bolívia, Peru e Venezuela.
Depois de um embarque e várias tentativas de retornar ao mercado argentino, a mineira Clamper, fabricante de produtos eletroeletrônicos, também optou por investir nas exportações para outros destinos, como a Colômbia e o México. Barreiras técnicas e mecanismos de proteção nas licitações do setor elétrico tornaram difícil justificar as vendas para o país vizinho dentro do orçamento para investimentos, explica o proprietário da empresa, Aílton Ricaldoni. “Não conseguimos dar continuidade aos negócios. A Argentina se transformou num mercado difícil e terá, em primeiro lugar, de recuperar sua autoestima”, afirma Ricaldoni.
A Clamper está decidida a ampliar sua participação no mercado internacional e deverá exportar o equivalente a 10% do faturamento neste ano, como parte de um plano para chegar a 30% da receita em vendas externas. O peso da exportação de veículos na pauta mineira também ajuda a entender o resultado negativo das vendas de Minas ao país vizinho no ano passado. A Fiat Automóveis, de Betim, na Grande Belo Horizonte, reduziu em 46% os seus embarques para a Argetina no ano passado, que totalizaram 42,4 mil carros, para fortalecer presença no Brasil.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a montadora italiana informou que as fábricas brasileira e argentina trabalham em profunda sinergia, uma complementando a outra. Em 2012, a Fiat conquistou 10% do mercado do país vizinho, que se retraiu em 1%, ao passo que as vendas no Brasil cresceram 6%.
Pauta com mais valor agregado
A Argentina tem sido um cliente privilegiado dos exportadores de produtos mineiros com alto conteúdo tecnológico e se mantém entre os seis maiores parceiros do comércio de Minas Gerais com o exterior. Enquanto no ano passado, o preço médio da exportação mineira ficou em US$ 187,70 por tonelada, os embarques para o país vizinho somaram US$ 2,460 mil por tonelada e a China pagou US$ 97,40 por tonelada importada do estado. As estimativas, feitas pela pesquisadora Elisa Maria Pinto da Rocha, da Fundação João Pinheiro, indicam o grau de sofisticação da pauta mineira.
“É prova da importância da queda das exportações para a Argentina em termos de qualidade das vendas do estado. Sabemos que a concorrência internacional é enorme nos setores de intensidade tecnológica”, afirma Elisa Rocha. De 2011 para o ano passado, Minas perdeu US$ 737 milhões em exportações para a Argentina. Além da redução dos embarques de veículos, de 38,1%, pesou o recuo das vendas de máquinas e equipamentos, aço, ferro fundido e minério.
No campo dos produtos agropecuários, as relações comerciais seguem um padrão diferente, lembra Pierre Santos Vilela, assessor técnico da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg). “A Argentina nos exige um papel mais de parceria. É mais fornecedora do que compradora de itens agropecuários”, afirma. O estado importa do país trigo e frutas de clima temperado, como pera, maçã, nectarina, pêssego e uva, para complementar a oferta mineira. Os produtores de Minas embarcam frango e suínos.
Veículo: Estado de Minas