Produção diária de 10 milhões de litros no Rio Grande do Sul é insuficiente para atender à demanda da cadeia industrial
A atuação de transportadores que negociam junto às indústrias a venda de leite adquirido de produtores veio à tona a partir da operação que revelou a ocorrência de fraude justamente nesse elo da cadeia. Sondados pela indústria, que depende cada vez mais do produto para atender à capacidade industrial instalada no Estado, os transportadores viam a possibilidade de ampliar a margem de lucro adulterando a composição do leite com a adição de água e ureia - que, segundo a chefe da Divisão de Defesa Agropecuária do Estado do Ministério da Agricultura (Mapa), Ana Lúcia dos Santos Stepan, contém moléculas de formol.
Como tentativa de contornar essa atuação, o secretário estadual de Agricultura, Luiz Fernando Mainardi, sustentou, na quarta-feira, o fim da atuação dos transportadores, defendendo que a indústria assumisse essa etapa do processo - sugestão refutada pelo superintendente federal de agricultura do Rio Grande do Sul, Francisco Signor. “Temos milhares de transportadores que são responsáveis por fazer com que todas as pequenas propriedades cheguem à indústria. Se banirmos o transportador, o supermercado não vai ter mais leite amanhã”, argumentou. “As empresas não têm como tomar conta disso e adquirir frotas para transportar o leite. Esqueçam isso. Não é viável”, acrescentou.
O presidente da Associação Gaúcha de Laticinistas e Laticínios (AGL), Ernesto Krug, explica que a presença do “caminhoneiro comprador” no setor já havia sido eliminada da cadeia, sendo retomanda nos últimos anos por conta da demanda da indústria. Krug conta que os transportadores que intermediavam o comércio do leite cru começaram a ser tirados da cadeia, ano a ano, a partir de 1976 e que no início da década de 1980 apenas as empresas menores dependiam desse profissional - habitualmente, esclarece, a indústria e as cooperativas tendem a fazer contato direto com os produtores. “Os caminhoneiros compradores voltaram a atuar na medida em que começou a faltar leite e que outros estados começaram a buscar o produto gaúcho. E, com isso, essa figura passou a ser o grande químico da paróquia”, conta.
Na quarta-feira, quando a Operação Leite Compensado foi noticiada, Mainardi destacou como fundamental o aumento na produção de leite. “A indústria tem uma capacidade instalada de 18 milhões litros e precisaria, para atender essa capacidade, de 15 a 16 milhões. Então, temos aí uma possibilidade de aumentar em 50% a produção de leite para atender à demanda da indústria”, esclareceu. O secretário afirma que a produção diária de leite é de 10 milhões de litros.
Para conseguir leite em maiores quantidades, as indústrias remuneram os transportadores pelo volume transportado. “O pagamento por volume de leite e não por quilômetro foi uma das coisas que acabou causando isso”, avalia Ana Lúcia. “Na medida em que começarmos a remunerar produtores pela qualidade e pagar transportadores pelo quilômetro rodado, isso pode ser reduzido”, orienta. Signor acrescenta que é preciso criar mecanismos para equilibrar a conta entre volume e rodagem.
Os representantes do Mapa reforçaram junto à imprensa que a responsabilidade em validar a qualidade da matéria-prima entregue às indústrias é das empresas, que, conforme o regramento do Ministério, são responsáveis também pelo produto que estão disponibilizando para o mercado – o órgão atua como fiscalizador desse processo. Signor salientou que em abril todas as marcas que atendem ao mercado gaúcho foram testadas sem que houvesse identificação de irregularidades, sendo injustificada a retirada de lotes das marcas que tiveram lotes comprometidos com a presença de formol – retirados preventivamente do mercado ainda durante o período de investigação, quando as indústrias ficaram condicionadas ao Regime Especial de Fiscalização.
Veículo: Jornal do Comércio - RS