Desemprego em serviços é o mais alto desde 2009

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As atividades de comércio e de serviços registraram em junho deste ano as mais altas taxas de desemprego para o mês, desde a crise global em 2009, segundo dados do IBGE. Para economistas consultados pelo Valor, o cenário acende sinal de alerta para o mercado de trabalho como um todo, porque esses dois setores respondem por mais de 70% do Produto Interno Bruto (PIB) do país e representam cerca de 75% dos empregos formais.

Segundo analistas, a piora no desempenho dos dois segmentos -os que respondem pela maior parte das vagas abertas - pode ser o prenúncio de trajetória ascendente na taxa de desemprego, atualmente em 6%.

Embora a taxa de desocupação de junho deste ano tenha sido superior a maio (5,8%), o IBGE não considera o avanço significativo. Mas as disparidades nas taxas deixam de ser tênues quando se analisa a desocupação por atividade. A taxa de desemprego para comércio, reparação de veículos e de objetos pessoais e domésticos foi de 4,1%, a mais alta para o setor na comparação com meses de junho, desde 2009 (4,7%). Em serviços prestados a empresas, aluguéis, atividades imobiliárias e intermediação financeira, a taxa foi de 3,9% em junho, também a maior desde 2009 (4,3%).

Cauteloso, o economista Cimar Azeredo, economista do IBGE, diz que essas taxas foram influenciadas por um ritmo menor de efetivação de temporários, nos dois setores. Já para José Marcio Camargo, professor do Departamento de Economia da PUC-Rio e economista da Opus Gestão de Recursos, "há tendência de aumento na taxa de desemprego". Segundo Camargo, o peso expressivo de comércio e de serviços na economia real torna mais preocupante a deterioração do mercado de trabalho nesses setores. Ele não descarta a possibilidade de que a taxa de desemprego suba para 6,5% até 2015.

O economista-chefe da SulAmérica, Newton Rosa, diz que. "as vendas do comércio estão estagnadas desde o fim de 2012", ao falar sobre os números do desemprego. Lembrou também o ainda elevado endividamento das famílias e o patamar expressivo de inadimplência. Rosa também projeta taxa de desemprego de 6,5% em um ano.

Caso as vendas do comércio varejista se mantenham fracas, com continuidade de atividade econômica menos aquecida, isso desestimulará novas contratações no comércio e serviços nos próximos meses, disse o ex-diretor do Banco Central e economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas. "Se o comércio não vende, também não contrata." Para Freitas, ainda é cedo para dizer se o atual desemprego em alta em comércio e em serviços vai continuar.

Segundo Freitas, é preciso esperar os resultados no terceiro trimestre, quando são contratados temporários para atender a demanda do fim de ano. "Esses segmentos efetivam em torno de 20% a 30% dos temporários. Caso fique abaixo disso, seria sinal mais claro de deterioração do emprego." Segundo o economista, a procura por temporários este ano será bem menor que em 2012. "As vendas em datas como Dia das Mães e Dia dos Namorados foram menores do que as do ano passado."


Atividade do setor deve perder força e dar alívio à inflação


  
A despeito do fôlego ainda mostrado em julho, a inflação de serviços deve deixar os desconfortáveis níveis em que se sustenta desde meados de 2008 em razão especialmente de um mercado de trabalho super aquecido. A perda de força do emprego e a atividade bem mais fraca do que o esperado, dizem os especialistas, devem mudar a dinâmica da inflação, com a fonte de pressão sobre os preços migrando de serviços para os chamados "tradables" (bens comercializáveis internacionalmente).

Alberto Ramos, diretor do grupo de pesquisas econômicas para América Latina do Goldman Sachs, avalia que a inflação de serviços deve terminar o ano por volta dos 8%, podendo ficar abaixo dos 7% em 2014. Segundo Ramos, o processo inercial forte sobre a inflação de serviços parece estar chegando ao fim, levado pela expectativa de debilidade da economia neste e no próximo ano e de um mercado de trabalho mais fraco. "Ou seja, tudo isso ocorre por uma razão ruim, que é a queda da atividade".

No curto prazo, a inflação de serviços, cujo peso no IPCA é de 35%, ainda assusta. Em julho, a elevação foi de 0,64%, taxa idêntica à de junho e bem acima da alta de 0,03% do IPCA cheio. Em um prazo maior, porém, é possível começar a enxergar propensão de baixa. Dados da Tendências mostram que o grupo serviços começou o ano em alta de 8,58% em 12 meses até janeiro. Entre idas e vindas, fechou os doze meses até julho em alta de 8,38% e, segundo a economista da consultoria, Alessandra Ribeiro, deve ficar abaixo disso no fechamento do ano.

Para Alessandra, a trajetória do item alimentos fora do domicílio é uma forte evidência dessa perda de força dos serviços como um todo. O item costuma ter valores próximos no IPCA e na sua prévia, o IPCA-15, mas isso deixou de ocorrer nas últimas medições. No IPCA-15, ele subiu 0,79% e apenas 0,45% no IPCA. "Essa boa desaceleração no fechamento do mês representa a demanda fraca contendo o ímpeto de alta dos serviços". O rendimento menor é outro sinal dessa perda de força. Após alta de 4,1% do rendimento médio real em 2012, a Tendências prevê alta de 1,6% em 2013 e de 1,4% em 2014.

"Não há dúvidas que chegamos no teto da inflação de serviços", diz Paulo Gala, estrategista da Fator Corretora. Segundo ele, o surto de inflação de serviços foi fruto de uma transformação única da economia brasileira, com formalização do mercado de trabalho e o ritmo mais forte de criação de vagas desde a década de 1970. Para ele, porém, o desemprego deve subir para algo ao redor de 6,5% no fim do ano, podendo chegar a 7%. E o ajuste correspondente à desvalorização do câmbio real é que vai gerar as mais fortes pressões inflacionárias daqui em diante.

Na avaliação de um economista de um grande banco que optou pelo anonimato, há, de fato, alguns fatores que jogam a favor de uma desaceleração de serviços; entre eles, a trajetória do Índice Geral de Preços no Mercado (IGP-M), cuja alta foi de 0,26% em julho, abaixo dos 0,75% registrados em junho. "É importante para a inércia de serviços. Impacta não só o item aluguel do IPCA, que é aquele pago pelas famílias, como auxilia também o aluguel pago pelo prestador de serviços, como o cabeleireiro, o mecânico, etc".

Para esse economista, serviços devem fechar o ano em alta de 8%, apresentando uma dinâmica mais fraca em 2014 (6,9%). A convergência maior para a inflação cheia, no entanto, é um sonho um tanto distante. O setor ainda tem uma produtividade muita baixa, reajustes salariais acima da produtividade e repasse de preços mais forte para compensar o quadro. "Isso ocorre no mundo todo, mas aqui talvez seja um pouco pior".

 

Veículo: Valor Econômico


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