Imposto menor, renda e câmbio sustentam planos de crescimento

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A Lupo está contratando 300 pessoas para a nova fábrica de Araraquara (SP), que será inaugurada até junho. A Cosméticos Jequiti & Hydrogen, do Grupo Silvio Santos, vendeu em janeiro 20% mais do que havia previsto e espera encerrar o ano com uma expansão de 150% na receita. A IRB Tatuzinho 3 Fazendas, dona da marca Velho Barreiro, projeta crescimento de 4% sobre o ano passado. As informações parecem ter saído de um banco de notícias de 2007 ou 2008, quando a economia brasileira crescia a ritmo acelerado, mas são expectativas para 2009. 

 

No conjunto da economia e da indústria, há incertezas sobre quanto a economia brasileira irá reduzir o ritmo este ano, após ter crescido apenas 3,1% em 2008. Há empresas, contudo, que ainda operam com perspectiva de crescimento em relação a 2008 - e parte destas, está contratando. Entre as razões estão o câmbio (que melhora a competitividade e reduz a concorrência dos importados), a menor queda na renda da população das classes C e D, a inflação mais baixa em alimentos e algumas das medidas de estímulo adotadas (ou anunciadas) pelo governo federal, especialmente na construção civil. 

 

A Lupo, sediada em Araraquara (SP), encerrou o ano passado com crescimento de 25% na receita, alcançando R$ 380 milhões. Para 2009, a expectativa é crescer menos, mas alcançar 12%. "Em janeiro o volume de pedidos foi menor que em janeiro do ano passado porque os clientes estão mais cautelosos com a reposição. O pior período vai ser o primeiro trimestre porque há muita incerteza, mas não mudamos os planos", afirma o diretor comercial, Valquírio Cabral Júnior. Apesar do menor volume de pedidos, a empresa registrou crescimento de 26% na receita em relação a janeiro de 2008. 

 

A Lupo contratou 700 pessoas em 2008, elevando o quadro para 3,8 mil empregados. Neste ano, a Lupo iniciou a contratação de outras 300 pessoas para a nova fábrica, que custará R$ 30 milhões e começou a ser construída em setembro para readequação das linhas de produção. A decisão da Lupo, diz Cabral, está calcada nos estoques baixos da empresa, na perspectiva de inflação mais baixa e na natureza de seu produto. 

 

O executivo acredita que a demanda por bens de consumo semi-duráveis e não duráveis pode se manter aquecida, já que os consumidores tendem a comprometer menos a renda com itens de alto valor agregado. As medidas adotadas pelo governo federal para estimular o setor produtivo e o câmbio mais favorável também são apontados como fatores de estímulo ao crescimento. Em 2008, a empresa exportou 40% mais, alcançando R$ 26,6 milhões. "Quando o dólar passou de R$ 2 facilitou, porque o custo no mundo aumentou e nós ficamos mais competitivos", afirma. A empresa negocia com clientes externos uma espécie de gatilho, que permitirá o reajuste do preço se o câmbio ficar acima ou abaixo de determinada faixa. 

 

O presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Aguinaldo Diniz Filho, confirma que a alta do dólar em relação ao real ajudou o setor têxtil a, no último trimestre do ano, reduzir o déficit na balança comercial do setor. Para ele, o câmbio entre R$ 2,20 e R$ 2,35 reduz riscos de uma 'enxurrada' de importações e pode contribuir para que o setor alcance a meta de crescimento para este ano de 3% a 3,5%. "A indústria têxtil e de confecções cresce em média de 1 a 1,5 ponto [percentual] acima do PIB. Se o PIB crescer 2%, como dizem alguns economistas, é possível alcançar esse crescimento", afirma Diniz. 

 

O presidente da Abit também condiciona a previsão à expectativa de redução da taxa básica de juros e dos juros de mercado e ao fechamento de acordos de comércio com União Europeia e Estados Unidos. A indústria têxtil foi uma das que mais demitiu em dezembro, com corte de 29.346 vagas, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). No ano, o saldo de geração de vagas ficou positivo em 22.009 postos. "Entre novembro e fevereiro as indústrias reduzem o número de contratados porque a demanda é muito fraca. O efeito sazonal foi agravado pela crise, mas tenho certeza que o setor vai recuperar esses postos mais à frente", afirma Diniz. De acordo com dados do IBGE compilados pela LCA Consultores, o setor industrial responde por 28,8% do Produto Interno Bruto (PIB). As indústrias têxteis , de artigos de vestuário e acessórios respondem por 1,3% do PIB e por 3% do total de empregos com carteira assinada do país. 

 

Na avaliação do economista-chefe da LCA, Bráulio Borges, segmentos menos dependentes da oferta de crédito, como alimentação, bebida e vestuário tendem a crescer, mas em nível inferior ao de 2008. "No setor de vestuário, o câmbio mais alto vai fazer com que a indústria brasileira atenda uma parte do consumo interno que antes era atendida por importados", afirma. Em alimentos e bebidas, a previsão de inflação mais baixa e o reajuste real do salário mínimo contribuirão para estimular as vendas em 2009, acrescenta. Já setores mais dependentes da oferta de crédito, como veículos, eletrodomésticos e outros bens alto valor agregado sofrerão mais os efeitos da crise, diz Borges. 

 

Na construção civil, a falta de crédito levou as construtoras a postergar novos projetos e a efetuar um número expressivo de dispensas no fim do ano. Em dezembro, segundo o Caged, o setor fechou 82.432 postos de trabalho. Apesar do cenário ruim, o grupo Eternit, dono da Eternit (fabricante de telhas e caixas d'água) e da Sama (mineradora) mantém os planos de ampliação para 2009. Em maio de 2008, a empresa investiu em maquinário na fábrica de Goiânia, ampliando a capacidade em 8% a 10%. Em janeiro deste ano, fez o mesmo na unidade de Colombo (PR). O grupo investiu R$ 60 milhões em manutenção e ampliação das unidades, valor que incluiu a expansão da capacidade da mineradora Sama de 270 mil para 300 mil toneladas em 2008. 

 

"Mesmo que no primeiro semestre as vendas caiam um pouco, vamos trabalhar para manter o mesmo patamar de crescimento de 2008", afirma Elio Martins, presidente do Eternit. Segundo ele, a empresa vai aproveitar o começo de ano mais fraco para repor estoques, que ficaram muito baixos no fim de 2008. A empresa não antecipa dados de balanço, mas Martins diz que o grupo fechou 2008 com alta de dois dígitos. De janeiro a setembro, a receita do grupo cresceu 43%, para R$ 293 milhões. Em 2008, a companhia contratou cerca de 100 pessoas, chegando a 1,6 mil funcionários. "Não há intenção de contratar, mas também não há previsão de cortes", afirma. 

 

O otimismo do empresário também está relacionado às medidas do governo para ampliar a oferta de crédito à construção civil. "Se for ampliado o financiamento ao consumidores de renda mais baixa, haverá estímulo ao aumento do consumo", afirma. O governo federal estuda reduzir o IPI para a construção e ampliar o crédito para consumidores com renda mensal de até R$ 2 mil de atuais R$ 7 mil para R$ 25 mil. Segundo Martins, mais de dois terços das vendas da Eternit são ao consumidor final. 

 

A Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat) prevê para 2009 expansão de 5% a 6% em receita, resultado que, se alcançado, já representará uma desaceleração significativa sobre 2008, quando a receita cresceu 33%. "A crise está afetando o setor, mas as indústrias ainda mantêm o otimismo", afirma o presidente da Abramat, Melvin Fox. Ele cita pesquisa da entidade feita em janeiro em que 68% dos entrevistados disseram estar otimistas em relação aos efeitos das ações de governo sobre o setor. 

 

Segundo Fox, as indústrias de materiais não criaram 70 mil novas vagas em 2008, ampliando o quadro de empregados em 11%. As demissões da construção, diz, ficaram restritas aos canteiros de obra. Conforme dados da LCA, o setor da construção responde por 4,7% do PIB e 6,4% dos empregos formais. 

 

Na área industrial química, que fechou 14.653 postos formais em dezembro, o setor de cosméticos é o que opera com mais otimismo. O setor cresceu acima de 10% ao ano na década e encerrou 2008 com incremento de 10,4%, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec). A entidade não faz previsões, mas estima crescer em 2009. O setor responde por 0,3% do PIB e por 0,1% dos empregos com carteira, aponta a LCA. 

 

Visão semelhante possui o diretor-geral da Jequiti, Lásaro do Carmo Júnior. A empresa expandiu em 120% as vendas em janeiro - 20 pontos acima do esperado - e prevê encerrar o ano com receita 150% maior, indo a R$ 176 milhões. "A crise não nos afetou em nada. O setor de vendas diretas demora a sentir estes efeitos", afirma. A Jequiti opera com cosméticos e produtos de higiene pessoal, mas o salto virá da aposta em 80 novos produtos não cosméticos, como bijuterias, acessórios para casa, CDs e brinquedos. 

 

O grupo Suissa, fabricante de cosméticos e produtos de limpeza voltados para as classes C e D sediada no Rio de Janeiro, estima elevar a receita nominal em 20% neste ano. "Essa massa de consumidores não sofre tanto com a crise, não se ressente da falta de crédito", diz o sócio do grupo, Edison Aarnaud. Em janeiro, o volume de encomendas cresceu 5% ante igual mês de 2008. A empresa, cuja distribuição estava restrita ao Sudeste e Nordeste, amplia as vendas para a região Sul. Em janeiro, a Suissa contratou 30 pessoas, ampliando seu quadro que era de 350 funcionários. 

 

O vice-presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Nelson Pereira dos Reis, afirma que as indústrias químicas sofrem os efeitos da crise de maneira diversificada. Os setores ligados à agricultura (fertilizantes e defensivos) e ao segmento de duráveis - matérias-primas para linha branca e veículos - foram mais afetados, e os vinculados a bens como cosméticos, produtos de limpeza e embalagens plásticas para alimentos ainda mantêm a demanda aquecida.

 

Veículo: Valor Econômico


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