Fazer compras de itens do dia-a-dia em farmácias se tornou um hábito mais frequente para pessoas solteiras que moram sozinhas. De acordo com uma pesquisa nacional feita pela Nielsen, 10,4% mais consumidores com esse perfil aderiram a esse costume no ano passado. Na comparação com os supermercados, atacados e outros pontos de venda, a farmácia foi o canal que mais ganhou compradores.
Com uma população estimada em 2,2 milhões de pessoas, os solteiros que moram sozinhos - também chamados de 'singles', para diferenciar dos que vivem com os pais - formam 5,9% dos lares brasileiros. De acordo com a pesquisa, em 2007, 45% dessa população manifestou ter o costume de comprar em farmácias. Esse número pulou agora para 63%. Ou seja, passou de 1 milhão para 1,140 milhão no ano passado.
"O dado deixa clara a busca pela conveniência, pela variedade e pela compra rápida", diz Olegário Araújo, gerente de atendimento a varejistas da Nielsen. Nas drogarias, segundo ele, os itens mais procurados são produtos de higiene e cuidados pessoais, como creme para cabelo e protetor solar.
Esse consumidor, entretanto, também vai ao supermercado. Mas prefere adquirir esses itens na farmácia. "Ao contrário das famílias, que compram regularmente para manter a casa abastecida, os solteiros só compram quando o xampu ou o cosmético está acabando. Aí vão à farmácia da esquina, que é perto, é rápida e fica aberta até tarde", explica Araújo.
Mas, nessa hora de ir comprar o condicionador que está acabando, o consumidor 'single' acaba levando para casa também algo mais. "Já cheguei a colocar uma geladeira com lasanha congelada nas lojas e vendemos tudo", diz Francisco Deusmar Queirós, presidente da cadeia de farmácias Pague Menos, com 302 lojas. "Mas a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) mandou retirar", conta o empresário.
Segundo a norma vigente, as farmácias e drogarias só podem vender medicamentos e itens de cuidado pessoal. Mas para várias lojas a Pague Menos diz ter liminares na Justiça dando permissão para a comercialização de outros itens. No mês passado, a empresa vendeu 100 mil quilos de sorvete: uma média de 11 quilos por loja diariamente. "Queremos que o Brasil tenha o mesmo conceito de farmácia que os Estados Unidos têm. Lá, as 'drugstores' são praticamente minimercados que vendem alimentos e mercadorias para o cotidiano", afirma.
Em São Paulo, existe uma lei desde 2007, a 12.623/07, que permite a venda de artigos de conveniência como pilhas, cosméticos, balas e outros itens, em drogarias do Estado. Mas o governador José Serra (PSDB), abriu uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (4093) contra a permissão. Ontem, a Procuradoria Geral da República (PGR) enviou um parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF) manifestando-se sobre a ação do governador. A PGR aprova a proibição de alguns produtos (cartões telefônicos, isqueiros, bebidas lácteas, cereais matinais, balas, doces, barras de cereais e artigos para bebês). Mas é favorável à liberação de outros, como leite em pó, pilhas, meias elásticas, cosméticos, água mineral, produtos de higiene pessoal, dietéticos, repelentes elétricos, mel, produtos ortopédicos e de higienização de ambientes.
Até o final de março, essa pendenga poderá ser resolvida. A Anvisa deve publicar até lá a resolução que define critérios para venda de alimentos e prestação de serviços em farmácias. A agência é contra a liberação. A decisão, porém, será tomada com base em uma consulta pública feita em 2007.
"Somos totalmente contra a transformação das farmácias em supermercados", diz Marcos Arede, diretor comercial da Drogaria Onofre, com 34 lojas em cinco estados. Itens de higiene pessoal e cosméticos, entretanto, devem, na opinião do executivo, continuar nas farmácias.
Independentemente da disputa, os supermercados, por sua vez, tentam se adaptar para não perder a clientela de solteiros para a farmácia. "Por muito tempo as redes enxergavam somente as famílias como público-alvo", diz Martinho Paiva Moreira, vice-presidente da Associação Paulista de Supermercados. "Mas essa visão começa a mudar, principalmente nos supermercados menores, os preferidos desse público." A rede Econ, por exemplo, tem 12 supermercados em São Paulo que funcionam 24 horas por dia. "Esse tipo de loja só dá certo em regiões onde há mais gente vivendo sozinha. Em bairros familiares, elas não vingam".
A indústria também procura se adaptar a esse consumidor. Na fabricante de alimentos Fugini metade dos produtos é embalada em porções individuais, que não precisam ser guardadas em refrigerador. "O solteiro não tem freezer grande como as famílias", diz Auro Ninelli, presidente da companhia. No ano passado, impulsionada pelo consumo dessa população, segundo o executivo, a empresa aumentou em 27% seu faturamento.
Veículo: Valor Econômico