A inesperada venda de 74 mil sacas de café dos estoques públicos federais, programada para hoje e anunciada oficialmente ontem, causou divergências de opiniões entre os representantes da cadeia produtiva. Os representantes dos produtores receberam a notícia com indignação e subiram o tom nos discursos contra o atual governo. Dizem que o fato reflete a indiferença com a situação financeira da cafeicultura e com o bem-estar social das famílias que trabalham na cultura. A indústria, por sua vez, afirmou que defende boa remuneração aos produtores. Porém alegou que o volume ofertado pelo governo é muito pequeno e não exercerá pressão de baixa nas cotações.
O lote foi adquirido por meio de leilão de opções públicas realizadas na safra 2002/03 para retirar o excesso de oferta do mercado e favorecer a retomada dos preços. A Conab, órgão responsável pelo leilão, não se manifestou em relação ao assunto. O leilão de venda surge em meio ao cenário de baixa remuneração e endividamento de parte da cafeicultura nacional.
Em janeiro, as lideranças dos produtores em Brasília reivindicaram a amortização de R$ 4,4 bilhões em dívidas do setor por meio da troca em mercadorias. A proposta era financiar a dívida em 20 anos com o pagamento anual de 5% da produção. No entanto, o governo atendeu parcialmente às exigências, com renegociação de cerca de 10% do total. À época, lideranças dos produtores disseram que funcionários do Ministério da Fazenda emperravam as negociações por causa de "questões ideológicas".
A alegação é que os preços praticados atualmente não remuneram a atividade. O café negociado hoje no mercado é cotado em média a R$ 260 a saca (60 quilos). Porém o patamar ideal para os cafeicultores seria de R$ 320,00 a saca. O temor dos produtores é que o leilão de venda pode provocar um efeito psicológico negativo, trazendo descrédito às informações de baixa oferta. "Esse leilão é um absurdo. Trata-se de uma falta de direção política e indiferença. Por isso a cafeicultura está nessa situação", protestou Gilson Ximenes, presidente do Conselho Nacional do Café (CNC).
Almir Filho, presidente da Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic), afirma que o volume não deve causar impacto no mercado. Segundo disse, a indústria consome 1,5 milhão de sacas mensais. "O mercado só reage a partir de 150 mil sacas de oferta", avalia. Explicou que o leilão é importante para a indústria em cenário de crédito escasso e caro porque permite parcelamento em até seis vezes. Para ele, a venda também pode ser positiva. "É um sinal de que pode faltar mercadoria e o governo está se antecipando para evitar escassez".
Veículo: Gazeta Mercantil