O varejo farmacêutico continua ignorando a crise. As grandes redes de farmácias registraram no primeiro bimestre faturamento acima dos dois dígitos. Mas a indústria já começa a falar em aumentos de custos, o que poderá afetar os descontos hoje oferecidos ao consumidor.
A Pague Menos, maior rede de farmácias do país, com 300 lojas, das quais 200 no Nordeste, teve um faturamento 13% maior em janeiro e fevereiro, se forem levadas em consideração as vendas nas mesmas lojas existentes em igual período do ano passado. Se for incluída as novas lojas, o crescimento é de 20%.
"Não sentimos nenhum efeito negativo", disse o dono da Pague Menos, Francisco Deusmar. "O fato de o carnaval ter caído no fim do mês não atrapalhou as vendas." Segundo ele, a meta é atingir crescimento de 20% neste ano. "Não aceito menos."
Os planos de expansão da rede, que faturou R$ 1,5 bilhão em 2008, foram mantidos para este ano. A Pague Menos abriu quatro lojas em janeiro, duas em fevereiro e prevê outras oito unidades entre março e abril.
Os dados de fevereiro do IMS Health, empresa que audita as vendas ao varejo, ainda não foram divulgados, mas os números de janeiro apresentavam crescimento de 11,2% no acumulado dos 12 meses anteriores. Pelo mesmo critério, as vendas físicas foram 6,7% maiores.
Os fabricante de genéricos também não veem crise. "Não há sinais de queda na demanda", diz o presidente da Pró-Genéricos, Odnir Finotti, que diz que o volume de vendas das cópias dos medicamentos de marca cresceu 18% em janeiro, acima da média do mercado.
A entidade tem dito que a crise tem contribuído para o segmento, uma vez que tem notado uma migração de consumidores dos medicamentos de marca para os genéricos, mais baratos.
Os especialistas costumam dizer que o setor farmacêutico é um dos últimos a ser afetado pela crise, uma vez que o abandono do tratamento com remédios só ocorre quando outros itens do orçamento doméstico - exceto alimentos - já tenham sido cortados.
"Numa desaceleração da economia, leva um certo tempo para o setor farmacêutico sentir o efeito", diz Nelson Libbos, presidente da subsidiária brasileira da farmacêutica israelense Teva, um dos maiores fabricantes mundiais de medicamentos genéricos. Segundo o executivo, se ocorrer a desaceleração no setor, ela será sentida apenas no fim do semestre.
No entanto, imagina-se que alguns medicamentos da categoria de estilo de vida - drogas contra impotência sexual ou emagrecimento - possam cair por serem considerados supérfluos ao mesmo tempo em que drogas contra depressão ou ansiedade ganhem mercado em momentos de crise. Não existe, contudo, confirmação se essa tendência tenha sido verificada no varejo nos últimos meses.
Mas se o bom desempenho continua no varejo, há cautela em outras etapas da cadeia. O setor avalia também que a restrição e o encarecimento do crédito nos últimos tempos modificaram as condições oferecidas pelos grandes distribuidores de medicamentos, reduzindo os prazos de pagamentos e os descontos oferecidos às farmácias.
A indústria, por sua vez, já começa a sentir os efeitos dos aumentos de custos em razão da desvalorização do real. Como importam uma grande maioria das matérias-primas, os fabricantes alegam que o impacto do câmbio atinge diretamente os lucros das companhias.
"Houve uma elevação significativa nos custos", afirma Libbos. "As fábricas deverão reduzir os descontos, o que deve ter um impacto na ponta." Com a rodada anual de reajuste de preços de medicamentos, prevista para abril, os representantes do setor avaliam que o repasse autorizado pelo governo será em torno de 6%.
"Isso poderá compensar parte do aumento de custos, mas não será suficiente", diz Libbos, que prevê um aumento em torno de 20% nos custos totais das empresas. "Como o setor não pode aumentar os preços, a tendência é de ajuste nas margens de lucro", complementa Finotti, da Pró-Genéricos.
Veículo: Valor Econômico