A busca do consumidor por preços menores, impulsionada pelo cenário recessivo e pela queda da renda, tem pelo menos um beneficiado: o atacado de autosserviço. O segmento está atraindo cada vez mais o cliente final e roubando espaço dos hipermercados. Das compras feitas no atacarejo, mais da metade já é de pessoas físicas.
O estudo Ranking Abad/Nielsen 2016, divulgado ontem pela Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores (Abad) e pela consultoria Nielsen, mostra um crescimento nominal de 12% no volume de vendas desse segmento, no ano passado. As lojas, que atendem os varejistas e o cliente final, têm atraído mais por oferecerem preços menores, aponta a diretora da Nielsen, Daniela Toledo. Segundo ela, a economia ao comprar no atacarejo pode chegar a 12%, em comparação com o valor gastado nos hipermercados.
A oferta de preços mais em conta fez com que a participação do consumidor final no volume de vendas do segmento no ano passado chegasse a mais da metade do total, ultrapassando a participação dos comerciantes e transformadores - tradicionalmente os principais clientes do setor. De acordo com a executiva, 50% a 70% dos compradores do atacarejo já são pessoas físicas.
Apesar do crescimento da importância do cliente final, quando se trata do faturamento a maior parte da fatia ainda vem de pessoas jurídicas. "O tíquete médio desses compradores é muito maior do que o do consumidor final, por isso a participação deles no faturamento ainda é superior", explica ela. "Mas com a crise, as pessoas preferem trocar a comodidade que encontram nos hipermercados pelo preço menor do modelo cash & carry", afirma Daniela.
Mudança nas lojas
De olho nesses novos clientes as lojas de cash & carry já vêm realizado algumas mudanças. O aumento do mix de produtos e a implantação de novos serviços são algumas delas.
Em entrevista recente ao DCI , Arthur Raposo, diretor de operações e logística de uma das maiores redes do setor, o Roldão Atacadista, afirmou que o número de produtos comercializados nas unidades da empresa aumentou de 7 mil, no meio do passado, para mais de 8 mil itens neste ano. Segundo ele, estão sendo implementados nas lojas da companhia serviços como açougue e a venda de frios fatiados, justamente com o intuito de atrair e de fidelizar o cliente final.
Outros líderes são o Atacadão e o Assaí Atacadista, que também afirmam ter aumentado consideravelmente o portfólio de produtos nas gôndolas. Segundo comentou o presidente do Assaí, Belmiro Gomes, a variedade de itens ofertados cresceu em cerca de 30% no último ano.
Tendência em longo prazo
Apesar do forte crescimento do segmento nos últimos anos e do aumento da participação do consumidor final nas vendas, a tendência é que com a estabilização da situação econômica do País o ritmo de expansão diminua, apontam especialistas. Em outras palavras, com o fim da crise o consumidor que havia migrado para o atacarejo pode voltar a os outros canais como os hipermercados. "Estamos diante de um fenômeno em que as pessoas buscam preços melhores. Mas a tendência é que com o fim da recessão o consumidor de classe média retorne para os outros canais", avalia o pesquisador da Fundação Instituto de Administração (FIA), Nelson Barrizzeli.
De acordo com ele, essa substituição de canais também ocorreu em outras crises econômicas brasileiras. Movimento que foi revertido com a estabilização da economia. Daniela, da Nielsen, parece concordar. "O movimento para o atacarejo é irreversível e veio para ficar, mas não deve se manter nesse ritmo. Quando a economia retomar, a tendência é que alguns consumidores retornem para os outros canais."
Troca de marcas
Além dessa substituição nos canais de compra, outra tendência apontada pela pesquisa é a troca de marcas. Segundo o estudo, 44% dos consumidores entrevistados trocaram produtos de marcas mais caras por bandeiras com um preço mais em conta no ano passado. O levantamento mostrou ainda que metade das categorias pesquisadas apresentou trade down - troca por marcas mais baratas.
"Mesmo no atacarejo, as pessoas têm procurado itens mais baratos, e por produtos mais básicos", diz Daniela. A ida ao pontos de venda (PDV) também vem diminuindo, como aponta o estudo. Em 2015, a frequência de idas ao ponto de venda caiu 4,3%. Para a diretora da Nielsen, isso ocorre porque os consumidores estão mais propensos a realizar compras mensais em grande quantidade, em detrimento de compras em menor número.
Faturamento do setor
Em relação ao segmento atacadista distribuidor como um todo, o faturamento no ano passado apresentou um crescimento nominal de 3,1%, registrando o total de R$ 218,4 bilhões. Em termos reais, no entanto, a Abad diz que houve uma retração de 6,8%. Após dois anos de expansão, a participação do segmento dentro do setor de mercearia (que considera produtos de uso comum das famílias, como alimentos, bebidas, limpeza, higiene e cuidados pessoais), sofreu uma queda de 1,1%. A porcentagem, que em 2014 era de 51,7%, passou no ano passado para 50,6%.
Veículo: Jornal DCI