A Procter & Gamble criou no Brasil seu segundo clube de assinaturas da marca Gillette no mundo - a primeira iniciativa está no Reino Unido. Segundo a empresa, o volume de vendas esperado é incomparavelmente menor ao que ela obtém nas grandes redes de varejo, mas a iniciativa abre caminho para conhecer melhor os hábitos de um consumidor cada vez mais voltado para a internet.
Nos Estados Unidos, a P&G foi surpreendida com o crescimento do Dollar Shave, um clube de assinaturas de lâminas de barbear masculinas fundado em 2012 que ano passado contabilizava mais de 3 milhões de assinantes e 5% do mercado americano de lâminas para homens. A empresa decolou com um vídeo cômico do fundador, Michael Dubin, questionando a necessidade de produtos muito sofisticados para fazer a barba, quando duas lâminas bastavam, a preços mais baixos. A startup foi comprada pela Unilever em julho de 2016, por US$ 1 bilhão. Desde então, a P&G está de olho não apenas no consumidor compra, mas também em como ele faz isso.
Segundo Juliana Moretti, diretora de marketing de Gillette no Brasil, a estratégia está voltada para a expansão no meio digital, onde está o público jovem. A iniciativa está hospedada no Home Refill, site de compras de reabastecimento para a casa. Os produtos de três linhas masculinas - Proshield (cinco lâminas), Mach 3 Sensitive (três lâminas) e Prestobarba 3 (descartável), com preços de R$ 35,29, R$ 20,59 e R$ 15,69, respectivamente, serão vendidos com uma recorrência de entrega que pode ser mensal, bimestral ou trimestral. Por enquanto, apenas para São Paulo.
"O volume que Gillette vende no varejo é incomparável ao que pretendemos vender no canal on-line neste momento. O grande ponto é sentir a reação do consumidor a novos modelos de negócio", diz Juliana. Como muitas empresas de consumo, a P&G enfrenta dificuldades com o público mais jovem, mais disposto a trocar de marca e a adotar comportamentos inspirados nas redes sociais.
As gigantes do setor estão interessadas em garantir sua fatia no varejo on-line, cujas vendas globais mais que dobraram entre 2010 e 2015, para quase US$ 1 trilhão. Segundo a plataforma de inteligência Hitwise, os americanos fizeram 21,4 milhões de visitas a sites de assinatura de serviços em janeiro de 2016, ante 722 mil um ano antes. Grande parte desses visitantes tem entre 25 e 39 anos.
Diferentemente de setores como transporte e hotelaria, que passam por uma ruptura em seus modelos de negócios após a criação do Uber e do Airbnb, o setor de beleza não testemunhou uma mudança radical por conta da economia compartilhada, afirma Hannah Symons, analista da Euromonitor International, em relatório. "Neste caso, o que é oferecido pela economia compartilhada é principalmente adicional, e não uma substituição de hábitos", escreve.
Segundo Hannah, os conglomerados de consumo podem usar o serviço de assinatura como uma forma de distribuição sem intermediários, uma ferramenta puramente de marketing, para tutoria ou experimentação, ou como uma maneira de alcançar nichos de consumo, por exemplo, de cremes para tipos específicos de pele.
Para o especialista em marcas Maximiliano Bavaresco, da consultoria Sonne, a iniciativa da Gillette responde a uma mudança no comportamento causada pela influência da tecnologia e a escassez de tempo. "A indústria viveu décadas criando inovações - gel de proteção, mais lâminas, novos cabos - para adicionar valor por unidade vendida. Então alguém questiona por que pagar tanto se o mesmo resultado por ser alcançado com duas lâminas e um preço menor, e o mercado muda", afirma. "O preço será determinante para os serviços de assinatura, assim como a distribuição, a qualidade do serviço e a marca."
Para Bovaresco, a disputa entre as empresas tradicionais pelos clubes de assinatura, vistos como uma importante ferramenta de relacionamento, vai se acirrar. Iniciativas tomadas por multinacionais na área de serviços compartilhados incluem também as redes de lavanderias das marcas de sabão em pó Tide, da P&G, e Omo, da Unilever - a última, lançada ano passado no Brasil.
Cada homem gastou, em media, menos de US$ 5 com cuidado pessoal em 2014, enquanto a média no setor de beleza é de US$ 65, segundo a Euromonitor. Portanto, há um espaço significativo para o aumento do uso e da frequência de compra de produtos masculinos. No Brasil, as lâminas masculinas da Gillette responderam por 84,9% do mercado em 2015, contra 84% em 2014. A Bic é a segunda colocada, com fatia de 8%. Em 2016, a Euromonitor estima que 832 milhões de aparelhos foram vendidos por todas as marcas no país, movimentando R$ 6,35 bilhões. Procurada, a Unilever não comentou os planos para a startup Dollar Shave no Brasil.
Fonte: Valor Econômico