A imagem dos conselhos administrativos - justamente cobrados sobre decisões equivocadas tomadas pelos executivos - tem sofrido abalos com a crise. Isso deve acelerar ainda mais a busca das empresas por conselheiros que entendam profundamente de gestão de riscos, tendência que já vinha se intensificando. A prova de que a necessidade de reformar a gestão era um fato conhecido é o alastramento das análises formais de desempenho. Na América do Norte, os percentual de empresas que avaliam seus conselheiros individualmente, e não em grupo, saltou de 29% em 2003 para 45% para 2007. No Reino Unido, a evolução foi de 52% para 75%. Os dados estão no recém-divulgado 34º Estudo Anual de Conselhos de Administração, elaborado pela consultoria de gestão de talentos Korn/Ferry com mais de 850 companhias listadas no ranking da revista Fortune.
Embora a pesquisa contemple prioritariamente Ásia, Europa e América do Norte, o Brasil não é uma exceção no que diz respeito à necessidade de revisão dos processos administrativos. "Hoje vivemos um momento de profundo questionamento das estruturas da governança. É hora do País também olhar para seu próprio modelo", avalia o sócio-diretor da Korn/Ferry, Paulo Amorim. "Ainda é comum haver empresas nas quais o conselho não tem interferência prática no direcionamento estratégico ou gerenciamento de riscos, ou que seja formado apenas por familiares. Esta postura não funciona nesse novo cenário econômico mundial", sustenta.
Cúpula sob escrutínio
Segundo o estudo, a implantação de ferramentas de avaliação - seja de conselheiros individualmente, seja do conselho como um todo - tem ganhado terreno. "Isso está se tornando cada vez mais importante para que os conselhos possam atuar de modo mais eficiente em gerar valor para a empresa. Não há uma estatística sobre isso no Brasil, mas essa não é uma prática comum aqui", diz Amorim.
Conselheiro em cinco empresas e sócio da consultoria de governança corporativa ProxyCon, Paulo Conte Vasconcellos concorda que a avaliação é uma prática incipiente no País. E ele ressalta outro empecilho além da mera ausência de uma cultura de mensuração: "diversas empresas têm um controlador definido e que faz parte do próprio conselho de administração. Imagine fazer uma avaliação e chegar à conclusão de que o controlador não está agregando nada como conselheiro." Mas o consultor considera os obstáculos contornáveis e apoia a prática. "Vejo a avaliação como um direcionamento para o conselheiro. Ele pode, a partir dela, tomar iniciativas para corrigir e aprimorar seu desempenho", diz. "Acho importante que eles tenham humildade e reconheçam suas deficiência. Eles não são super-homens."
Para Vasconcellos, uma avaliação de conselho precisa verificar se cada membro está cumprindo o seu papel, se o grupo possui estrutura e pessoas adequadas e se sua dinâmica de trabalho permite que as reuniões tenham bom rendimento. "É preciso definir os papéis de cada membros do conselho", acrescenta Amorim.
Atenção aos riscos
O relatório da Korn/Ferry indica ainda a crescente importância da inclusão de um conselheiro responsável pela gestão de risco das companhias. Porém, segundo a consultoria, no Brasil este profissional ainda está mais ligado a atividades operacionais. "É importante haver um conselho balanceado, não composto apenas por figurões. Os membros devem agregar valor nas práticas de recursos humanos, gestão de riscos e estratégia", orienta Amorim.
Vasconcellos concorda que a gestão de risco é algo indispensável. "Desde a criação da Sabanes-Oxley começou a haver uma demanda por especialistas em auditoria e riscos. Casos recentes mostraram que a gestão de risco no Brasil ainda deixa muita margem a erros e prejuízos aos acionistas. Tais fatores geram uma demanda adicional por conselheiros que tenham bom conhecimentos no assunto", observa. O consultor considera a gestão estratégica, a gestão de capital intelectual e o monitoramento de performance - juntamente com as gestão de risco - as principais atribuições de um conselho administrativo.
Menos é mais
Os participantes do estudo também apontaram mudanças no modo de funcionamento dos conselhos de administração. Os conselheiros profissionais estão atuando em menos empresas. Nas regiões pesquisadas, os conselhos tem em média dez membros. Em 1973, quando a Korn/Ferry fez o estudo pela primeira vez, um quinto dos conselhos de administração tinha entre 16 e 25 membros. "No Brasil, temos notado muitos profissionais participando de um número demasiado de conselhos. Neste caso, a qualidade pode deixar a desejar", afirma Amorim.
Outra mudança detectada foi a redução do total de encontros, enquanto o tempo de dedicação aos conselhos tem crescido. Hoje, as companhias norte-americanas realizam em média oito reuniões de conselho anuais. Há 20 anos, pelo menos um quarto fazia um encontro por mês. Ao mesmo tempo, na América do Norte os conselheiros gastam 16 horas por mês com suas atribuições (para cada uma das companhias em que atuam). Há vinte anos, esse tempo era de aproximadamente 9,5 horas mensais.
Veículo: Gazeta Mercantil