Assis Moreira, de Genebra
A desvalorização do dólar americano e a alta dos preços de energia (notadamente do petróleo) nas ultimas semanas podem exercer novas pressões de alta sobre as cotações internacionais de produtos agrícolas. O diagnóstico é da FAO, agência das Nações Unidas para agricultura e alimentação.
Apesar da forte valorização observada desde o início deste ano, as cotações da maioria das commodities agrícolas de base continuam abaixo dos níveis recordes alcançados em 2008, o que para a FAO sinaliza um retorno ao equilíbrio em diversos mercados.
No rastro de uma queda média de 30% a 35% em relação aos picos de junho do ano passado, a agência estima que a fatura dos países importadores de alimentos deve cair em 2009 quase US$ 226 bilhões, para US$ 789,1 milhões. Mas a FAO adverte que, na prática, boa parte do efeito positivo dessa baixa de 22% na fatura das importações globais poderá ser anulada pela deterioração da economia global.
O braço da ONU diz que a erosão do poder de compra, por causa das reduções de rendimentos e das taxas de cambio real, reduz o acesso aos alimentos, mesmo que a preços mais baixos. A preocupação da FAO, antes ligada essencialmente à alta dos preços dos alimentos, agora esta mais voltada ao impacto da recessão mundial sobre a demanda agrícola, em particular por produtos de alto valor agregado.
"Os vínculos mais e mais fortes entre o setor agrícola e os mercados de energia, de finanças e de divisas tornaram os preços agrícolas ainda mais vulneráveis aos choques externos", diz a FAO em relatório divulgado na quinta-feira.
Em seu novo trabalho sobre as perspectivas agrícolas, a agência constata, em todo caso, que no momento a crescente produção global parece ser suficiente para atender à demanda por alimentos e para outros usos; além disso, os estoques tendem a crescer.
Com a colheita da safra 2009/10 em fase inicial no Hemisfério Norte - que concentra 90% da produção global -, as previsões continuam a ser positivas graças a gorda produção de cereais, prevista em 2,219 bilhões de toneladas. Trata-se de um volume 3% menor que o recorde da temporada 2008/09, mas esta baixa, conforme a FAO, tende a ser compensada pelos estoques e pelo crescimento menos acelerado do consumo, que deve engordar cerca de 1,3%.
Segundo as primeiras estimativas da agência da ONU para o novo ciclo, o comércio mundial de cereais em 2009/10 deve movimentar 257 milhões de toneladas, recuo de 4% na comparação com 2008/09. A retração está diretamente ligada ao trigo, cujas importações mundiais podem ser 10 milhões de toneladas menores diante do aumento da produção em países importadores.
Já o segmento de oleaginosas encontra-se em situação mais problemática, segundo a FAO. A soja, "estrela" do grupo, está em alta nos mercados mundiais por conta do tombo da produção em grandes países produtores, especialmente na Argentina, e pela maior demanda para a produção de rações na China e na India. No total, a produção de oleaginosas deve somar 405,9 milhões de toneladas nesta safra 2008/09, em fase final de colheita no Hemisfério Sul, 0,7% mais que na temporada 2007/08.
"A alta da cotação da soja nas últimas semanas, no rastro da contração das reservas mundiais, aparece como uma fonte de preocupação por influenciar os preços de alimentos destinados à alimentação humana e animal", afirma o relatório da agência.
Destaca-se no trabalho da FAO, ainda, a previsão de aumento no consumo mundial de açúcar, ainda que em ritmo menor do que nos últimos dois anos. Já os preços de pescados, carnes e produtos lácteos de uma maneira geral degringolaram por causa da queda da demanda provocada pela recessão e por problemas sanitários, prejudicando seriamente a lucratividade nesses segmentos, segundo a agência.
Veículo: Valor Econômico