Campanhas publicitárias que marcaram época, como os inesquecíveis mamíferos da Parmalat, o famoso anúncio "Compre Baton", da Garoto, ou o clássico "Me dá danoninho", da Danone, dificilmente voltarão a conquistar o público infantil. Esse é o principal objetivo do compromisso espontâneo sobre publicidade dirigida às crianças, assinado ontem por 24 empresas e grupos líderes da área de alimentos e bebidas. A iniciativa prevê limitações nas propagandas para menores de 12 anos, incluindo promoções em escolas e pontos de venda.
As restrições são para inserções publicitárias em televisão, rádio, mídia impressa ou internet que tenham 50% ou mais de audiência constituída por crianças. Produtos cujo perfil nutricional atenda a critérios específicos baseados em evidências científicas estão liberados, podendo circular livremente em todos os canais e horários. O compromisso foi assumido junto à Organização Mundial de Saúde (OMS).
De acordo com uma pesquisa realizada pela psicóloga Paula Carolina Dantas, especialista em nutrição e comportamento, a publicidade influencia as crianças a consumir alimentos ricos em gordura, como hambúrgueres, bolachas recheadas, salgadinhos, doces e refrigerantes. O hábito de assistir televisão pode aumentar o consumo desses produtos e promover o sedentarismo.
Publicado em 2007, o estudo concluiu que cerca de 82% das propagandas do setor sugerem o consumo imediato dos alimentos. Em 78% dos casos, os personagens os consumiam de forma explícita; 57%, apresentavam desenho animado, e 58%, representavam alguma situação cotidiana. Satisfação, prazer e alegria foram os sentimentos mais explorados, junto com a ideia de diversão.
É exatamente essa publicidade que está com os dias contados. Segundo o presidente da Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia), Edmundo Klotz, o compromisso espontâneo que veta os anúncios infantis deverá contribuir com a educação alimentar, além de estimular a prática esportiva. "A partir de dezembro, o foco será direcionado exclusivamente aos pais. O conteúdo dos anúncios abordará os benefícios da alimentação balanceada."
Uma pesquisa da consultoria InterScience comprova que 85% das crianças entre 2 e 14 anos influenciam as compras da família. O setor em que elas têm maior poder é justamente o de alimentos – 42% dos filhos determinam o que será levado do supermercado.
No entanto, o presidente da Associação Brasileira de Anunciantes (Aba), Ricardo Alves Bastos, não acredita em um impacto direto nas vendas. "O que pode acontecer é a migração de um produto para outro mais saudável. Nosso objetivo principal é a saúde do consumidor", afirma.
Para a Mars Brasil, detentora de marcas como Uncle Ben's, Twix e M&M's, o compromisso assinado representa um avanço nas relações de consumo e publicidade e propaganda no Brasil. Segundo o presidente da Mars para a América Latina, Filipi Ferreira, a empresa dará continuidade à filosofia de não criar anúncios infantis. "Não compramos espaços de mídia em veículos ou horários quando a audiência de menores de 12 anos ultrapassa os
25%."
De acordo com o Instituto Alana (organização sem fins lucrativos com atividades voltadas à defesa dos direitos da criança e do adolescente), a legislação brasileira já proíbe propagandas dirigidas às crianças, baseada na interpretação conjunta da Constituição Federal, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O artigo 37 do CDC, por exemplo, veta qualquer tipo de publicidade enganosa ou abusiva e repudia a mensagem publicitária que se aproveita da deficiência de julgamento e experiência da criança. Dentre as indústrias que assumiram o compromisso estão Sadia, Mc Donald's, Batavo, Nestlé, Grupo Schincariol e Coca-Cola.
Veículo: Diário do Comércio - SP