Este ano era para ser o momento em que a Barbie finalmente recuperaria a coroa de rainha das prateleiras de brinquedos.
Depois de várias tentativas fracassadas, a Mattel Inc. achava que tinha encontrado uma maneira de tornar a lendária boneca um brinquedo essencial para meninas de todas as idades - e também para impulsionar a combalida receita da empresa. A Mattel está gastando milhões de dólares para promover suas novas Barbies "Fashionistas" e contratou até um coreógrafo de celebridades para criar uma dança chamada "The Barbie", divulgada num vídeo que estreou no programa matinal da TV americana "Today Show" e também no YouTube.
Mas duas novas bonecas chegaram às lojas antes da Barbie e podem ameaçar seu renascimento, dizem pessoas a par do setor de brinquedos. Uma delas é produzida pela empresa que talvez seja a fabricante de brinquedos norte-americana mais quente do momento, a Spin Master Ltd. A outra foi criada por projetistas furiosos com a Mattel, que conseguiu tirar da empresa deles, na justiça, o direito de vender as populares bonecas Bratz.
Assim, uma batalha campal se avizinha no mundo das bonecas, num conflito tão feroz que amedrontaria até os Comandos em Ação.
No centro de desenvolvimento da Mattel em sua sede, em El Segundo, a segurança é máxima e guardas checam os notebooks e pastas dos visitantes na entrada e na saída. Humanos estranhamente parecidos com a Barbie - de salto alto, rabo de cavalo no cabelo e joias brilhantes - se reuniram aqui na Sala Rosa no fim do mês passado. É onde estão tramando a estratégia de batalha para a nova Barbie, que vem com roupinhas inspiradas nas passarelas da moda e conta com 12 articulações que permitem às meninas deixá-las com pose de supermodelo.
A alguns quilômetros de distância dali, no estúdio em Los Angeles da canadense Spin Master, os projetistas quebram a cabeça para descobrir como arrumar as bonecas Liv - com duas articulações a mais que a Barbie - mais rapidamente na vitrine.
Enquanto isso, na sede da MGA Entertainment Inc., em Van Nuys, Califórnia, ex-designers da Bratz criavam acessórios que as próprias meninas podem colorir, para a nova linha de bonecas da empresa, a Moxie Girlz.
A troca de farpas já começou. "As Barbies Fashionistas não vêm nem com escova de cabelo", diz o fundador e diretor-presidente da MGA, Issac Larian.
A batalha pelos corações e mentes das meninas americanas ocorre num momento crucial para a Mattel. As vendas da empresa, das quais um quinto, ou US$ 1,3 bilhão, vem da marca Barbie, estagnaram há anos, e em 2008 o lucro caiu 37%, para US$ 379,6 milhões. Semana passada, a Mattel informou que a receita do terceiro trimestre caiu 8% e o lucro líquido, 3,5%. As vendas de Barbies no mundo caíram 8%.
A Barbie continua a ser a boneca mais vendida do mundo. Desde março, a ação da Mattel vem subindo constantemente em relação ao resto do mercado, em parte devido à expectativa dos investidores sobre a revitalização da Barbie, dizem analistas. A empresa aposta na boneca para sustentá-la durante a temporada de fim de ano.
"A Barbie, nosso principal negócio, é algo com que contamos muito este ano diante da falta de produtos relacionados a filmes e desenhos", disse durante uma teleconferência com analistas em meados de julho Robert Eckert, presidente da Mattel.
Mas alguns analistas duvidam , argumentando em relatórios que a Mattel já tinha dificuldades para executar seus planos mesmo quando não tinha muita concorrência.
A Mattel fez de tudo em termos de marketing para comemorar os 50 anos da Barbie este ano, e até transformou uma casa na elegante cidade de Malibu, na Califórnia, numa versão em escala real da Casa da Barbie. A empresa também relançou cinco bonecas Barbie de outras eras.
Tanto esforço ajudou a rejuvenescer as vendas no primeiro trimestre, mas depois a Barbie voltou a capengar, com queda de 15% nas vendas mundiais do segundo trimestre.
"A Barbie reinava sozinha na prateleira das bonecas no primeiro semestre, na crista da onda do aniversário de 50 anos, mas mesmo assim não conseguiu gerar um alta geral nas vendas", diz Gerrick Johnson, analista de varejo da BMO Markets, um banco de investimentos de Toronto.
Desde que foi lançada, em 1959, a Barbie é um ícone cultural para as meninas, sempre vestida com a última moda - de um corte no estilo Jacqueline Kennedy, quando ela residiu na Casa Branca, aos terninhos nos anos 80. Quando o homem pousou na Lua, a Mattel lançou uma Barbie astronauta, a primeira de 130 carreiras que a boneca de 29 centímetros adotaria, de acordo com a lema "Eu posso" da empresa.
No decorrer dos anos, várias outras empresas tentaram roubar um pouco da participação considerável da Barbie no mercado, mas a Mattel sempre conseguiu derrotá-las. Com 45 linhas diferentes de produtos, de lençóis a bagagens, a Barbie continua a ser uma marca gigantesca. Mas os analistas calculam que as vendas mundiais da Barbie atingiram seu auge quando chegaram a US$ 1,9 bilhão em 2002.
Em 2001, a Mattel encontrou um rival à altura nas bonecas Bratz, da MGA, apresentadas com uma atitude mimada, lábios carnudos e roupas provocantes. Embora muitos pais achem que as bonecas são sexualizadas demais, as meninas adoraram as proporções exageradas e estilo rebelde das bonecas.
Enquanto as vendas das Bratz decolavam, a Mattel tentou sua própria linha moderna, chamada Flavas - e o resultado foi desastroso. As bonecas ficaram à venda por menos de um ano.
A vitória da Mattel num processo judicial contra um projetista de brinquedos fará com que a Bratz desapareça do mercado em janeiro próximo, e a própria Mattel informou recentemente que lançará uma nova linha Bratz alguns meses depois.
Mas mesmo antes que o processo fosse resolvido as meninas pareciam estar perdendo interesse nas bonecas, migrando em vez disso para iPods, videogames e a internet. As vendas da Bratz e da Barbie caíram.
As fabricantes de bonecas não estão desistindo, nem mesmo a MGA, que está ainda se recuperando da milionária batalha legal com a Mattel. A empresa passou um ano criando as Moxie Girlz. A Spin Master, por sua vez, está tentando cavar um nicho com bonecas que parecem adolescentes comuns. "A Barbie foi tantas coisas diferentes", diz Ben Varadi, um dos fundadores da Spin Master. "A Liv é uma amiga. A Liv é o presente."
No fim do ano passado, a própria Mattel decidiu fazer uma geral na Barbie e reuniu uma nova equipe executiva para cuidar da tarefa. Daí saiu a Fashionista.
Richard Dickson, o novo gerente geral da marca Barbie, diz não estar preocupado com a nova concorrência. "Nascemos em 1959 e milhares de marcas surgiram e se foram desde então", diz ele. "Entendo a conversa sobre concorrência. Mas a Barbie permaneceu a boneca número 1 do mundo.
Veículo: Valor Econômico