A retomada da exigência de regularização fiscal de empresas para concessão da recuperação judicial é uma medida que busca conciliar o princípio da preservação da empresa com a necessidade de dar efetividade às cobranças de créditos fiscais.
O entendimento é da 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo ao acolher recurso da União e derrubar decisão de primeiro grau que havia dispensado uma empresa de comprovar a regularidade fiscal para a concessão da recuperação judicial.
Os autos apontam a existência de débitos exigíveis da recuperanda inscritos em dívida ativa da União, no valor de R$ 10 milhões. O juízo de origem considerou, com base no princípio da preservação da empresa, que a devedora não precisava apresentar as certidões negativas de débitos tributários para concessão da recuperação.
Ao recorrer da decisão, a União argumentou que a exigência de certidões de regularidade fiscal não passa de uma “transposição do ideal do plano de recuperação judicial à seara tributária”, já que comprova os meios pelos quais a devedora pretende sanear suas contas, provando, assim, a viabilidade da sua recuperação.
Para a União, a concessão da recuperação sem que a devedora trate das pendências fiscais não acarretará efetiva reorganização, perpetuando o estado de crise, “em detrimento do interesse público e social e do equilíbrio de mercado com a quebra da competitividade em relação às demais empresas do setor que honram seus débitos fiscais”.
O relator, desembargador Maurício Pessoa, acolheu o recurso da União e disse que, apesar do entendimento anterior adotado pelo TJ-SP quanto à dispensa de apresentação de certidão de regularidade fiscal para fins de homologação do plano de recuperação judicial, o cenário agora é outro.
“A Lei 14.112/2020 promoveu relevantes alterações às Leis 11.101/2005 e 10.522/2002 com o propósito de estimular a regularização fiscal das sociedades em recuperação judicial. Nesse sentido, foram introduzidas condições mais vantajosas para o equacionamento do passivo fiscal de recuperandas”, destacou.
Já em favor do Fisco, prosseguiu o relator, foi incluída uma nova hipótese de convolação da recuperação judicial em falência, consistente no descumprimento do parcelamento ou da transação ajustados com a devedora, “tudo a corroborar a relevância do tema e, principalmente, a indispensabilidade do saneamento fiscal”.
“Além da Lei 14.112/2020, destaca-se ainda a edição da Lei 13.988/2020 (Lei do Contribuinte Legal), resultante da conversão da Medida Provisória 899/2019, que dispõe sobre a transação tributária, inclusive com condições mais favoráveis às sociedades em recuperação judicial, como a concessão de descontos nas multas, nos juros de mora e nos encargos legais, dada a presunção legal de difícil recuperabilidade das suas dívidas fiscais”, disse.
Assim, conforme o desembargador, há, atualmente, várias facilidades concedidas às sociedades em recuperação judicial para equacionar seus passivos fiscais, de modo que a dispensa de certidões de regularidade não mais se justifica.
“A retomada da exigência de regularização fiscal nas atuais circunstâncias é medida que busca conciliar o basilar princípio da preservação da empresa com a necessidade de dar-se efetividade às cobranças de créditos fiscais, as quais não raramente acabavam frustradas ante a escassez de patrimônio penhorável de sociedades em recuperação judicial”, afirmou o magistrado.
Para ele, tal entendimento se aplica à hipótese dos autos, uma vez que a deliberação da assembleia-geral de credores só foi publicada em novembro de 2021, isto é, já na vigência da Lei 14.112/2020. A decisão se deu por unanimidade.
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Processo 2006771-91.2022.8.26.0000
Tábata Viapiana – Repórter da revista Consultor Jurídico.
Fonte: Revista Consultor Jurídico – 28/10/2022