Para Francisco Turra, da ABPA, considerando a alta dos custos, "frango não subiu tanto quanto imaginávamos" A poucos dias do início da semana mais importante do ano para as vendas de carnes, indústria e varejo têm poucos motivos para comemorar. Pelo segundo ano seguido, a ceia de Natal será acanhada e menos rentável. Em meio à deterioração da renda das famílias, frigoríficos e varejistas não só não conseguiram repassar integralmente o forte aumento dos custos de produção, como dificilmente o farão em 2017 - ao menos no primeiro semestre.
Enquanto trabalham com a expectativa de nova queda nas vendas de peru - tradicional item das festas de fim de ano - e de migração de vendas para marcas mais baratas, a indústria de carne de frango espera a recomposição das margens por meio da redução de custos, sobretudo do milho. E, como a economia não reage, a chance de um reajuste mais forte para o consumidor, que chegou a ser aventada há alguns meses como uma possível pressão inflacionária para 2017, é cada vez menor. Na verdade, a demanda mais fraca do início do ano já fez com que a queda dos preços entrasse no radar, afirmou o analista da MB Agro, César Castro Alves.
"Vai ser bastante complicado repassar preço. Nossa visão nesse sentido é bastante pessimista", admitiu o diretor comercial de multivarejo do Grupo Pão de Açúcar (GPA), Robson Parreiras, em relação ao próximo ano. De acordo com o executivo, a varejista não conseguiu reajustar, "na magnitude necessária", os preços da carne de frango neste ano. Mais que isso. Diante da resistência do consumidor brasileiro, as promoções se tornaram frequentes. "Por isso, você vê a gente fazendo ofertas mais agressivas", justificou Parreiras.
Ainda assim, a rede varejista viu as vendas de carne de frango diminuírem. "Perdemos bastante volume de frango este ano", disse Parreiras. A avaliação do executivo é corroborada pelos dados de consumo divulgados terça-feira pela Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). Em 2016, o consumo per capita de carne de frango diminuiu 4,9%, passando de 43,2 para 41,1 quilos, o menor nível da década. Nesse contexto, o tradicional aumento de margens obtido pela indústria de carnes nos últimos meses do ano tende a ser limitado, concordou o diretor de relações comerciais da consultoria GFK, Marco Aurélio Lima. No ano passado, as carnes natalinas movimentaram R$ 670 milhões, segundo a consultoria Nielsen. Desse total, R$ 130 milhões são oriundos da carne de peru e R$ 270 milhões de aves especiais.
"Tenho a sensação que a crise vai limitar o aumento. As pessoas aprenderam na crise a trocar de produto. Se houver um aumento mais expressivo, veremos queda de consumo", avaliou o especialista da GKF, consultoria responsável por elaborar o indicador de preços da Associação Brasileira de Supermercados (Abras). Entre as principais indústrias de frangos e suínos do país, apenas a Seara - subsidiária da JBS - planejou um incremento substancial das vendas das carnes natalinas. Para o diretor de marketing da Seara, Eduardo Bernstein, pode haver um "pequeno movimento" de migração para marcas mais baratas no Natal, mas a JBS tem no seu leque de marcas regionais - mais baratas- um trunfo para atravessar o 'downtrade' que vem marcando o ano.
Diante disso, a JBS aumentou o volume de itens natalinos produzidos em "dois dígitos", afirmou Bernstein. "Estamos preparados para atender qualquer necessidade de maneira democrática", afirmou ele, citando as marcas regionais Big Frango e Macedo. "[Mas] vamos ter que segurar nossa margem", acrescentou. Afora a JBS, executivos de outras indústrias ouvidas pelo Valor esperam vendas estáveis de aves especiais neste fim de ano. De acordo com o diretor comercial da catarinense Aurora, Leomar Somensi, o volume de produtos natalinos oferecido é praticamente o mesmo de 2015.
Os preços desses produtos, disse, ficaram entre 7% e 10% mais caros, percentual insuficiente para compensar o aumento de custos visto em 2016, o que parece ser um consenso na indústria. "Pelo custo que a gente teve, o frango não subiu tanto quanto imaginávamos", afirmou o presidente-executivo da ABPA, Francisco Turra. No Grupo Pão de Açúcar, o volume de carnes natalinas também será repetido, afirmou Parreiras. Mas o 'mix' de produtos será diferente, com maior participação da marca própria da varejista. Em receita, a expectativa é de crescimento de 10% nas vendas de natalinos.
Líder nessa área com as marcas Sadia e Perdigão, a BRF prevê que o Natal terá um comportamento similar ao do ano passado, com vendas estáveis de frangos especiais e queda nas vendas de peru, disse o gerente-geral da empresa no Brasil, Rafael Ivanisk. Em contrapartida, a tendência é que cresça a demanda por cortes de suínos, relativamente mais baratos do que a carne bovina. Assim como os concorrentes, a BRF também perdeu margens, afirmou Ivanisk. "Por causa do milho, fizemos repasse, mas estamos absorvendo alguma coisa [custo]".
Embora indústria e varejo lamentem a inviabilidade do repasse integral, Castro Alves, da MB Agro, argumenta que seria impossível compensar toda a alta do milho mesmo que o país não estivesse em grave recessão. Em média, o cereal subiu 55% em 2016, de acordo com o Cepea. Já o frango resfriado subiu 19%, conforme o Instituto de Eco nomia Agrícola (IEA). "Os preços do frango já estão perto do recorde", salientou, lembrando que as cotações já arrefeceram em relação ao pico, o que fez as margens das indústrias de aves e suínos voltarem ao azul. Conforme o indicador Esalq/BM&Fvofespa para o milho, o pico de alta foi em junho, quando atingiu R$ 53,81 por saca. Ontem, o cereal estava cotado a R$ 38,80 por saca, queda de 27,9% ante a máxima histórica.
Por Luiz Henrique Mendes e Kauanna Navarro | De São Paulo
Fonte: Valor Econômico