Os franceses do Casino traçam o plano de expansão do grupo, que prevê a inauguração de mais de 100 pontos por ano, abertura de lojas de menor porte e expansão da marca própria
A quarta-feira 11 foi um dia marcante para a história do grupo Pão de Açúcar (GPA) e do seu controlador, o francês Casino. Nessa data, aconteceu em São Paulo a primeira reunião do conselho de administração do grupo para a definição de estratégias trienais desde que os franceses assumiram o comando da maior rede do varejo brasileiro. O encontro também aconteceu na véspera da oferta de ações da Via Varejo – seu braço no comércio de eletroeletrônicos –, que marca o início da despedida da família Klein do bloco de controle acionário do grupo. O lançamento movimentou R$ 2,85 bilhões. O Pão de Açúcar, enfim, é do Casino.
E de um homem, em especial: Jean-Charles Naouri, que acumula desde setembro os cargos de presidente dos conselhos de administração das operações no Brasil e na França. Majoritário, agora sem a participação do antigo controlador do GPA, o empresário Abilio Diniz, Naouri está livre para implementar a sua visão de varejo, baseada em práticas aplicadas com sucesso em seu país. A expectativa apresentada pelos executivos brasileiros ao conselho do Casino é de que 2014 trará os melhores resultados financeiros da história do GPA, em especial devido à Copa do Mundo.
Isso favorece a intenção de Naouri de temperar com uma dose maior de molho francês as operações no Brasil. “Não sou herdeiro de um grupo de varejo”, disse o empresário, formado em matemática e que foi sócio do banco de investimentos Rothschild. “Isso pode até ser um defeito, mas comecei a minha carreira sem nenhum tostão e hoje estou à frente de um grande grupo mundial.” Os pilares da filosofia que garantiu a ele esse resultado são a exploração de diversos modelos de lojas ao mesmo tempo, com destaque para a fragmentação da rede em um grande número de pequenos varejos localizados próximos dos clientes – as chamadas lojas de vizinhança – e o desenvolvimento de operações eficientes para diminuir continuamente os preços ao consumidor.
Esse segundo aspecto pode contemplar o corte de custos, a autossuficiência energética e a venda de mais produtos de marca própria. “Meu pai sempre diz que as palavras podem mentir, mas os números não”, afirma Gabriel Naouri, 32 anos, filho do CEO e diretor de marcas próprias, marketing digital e inovação do Casino. Um exemplo das ideias de Naouri que estão sendo colocadas em prática no Brasil é a expansão da bandeira de lojas MiniMercado Extra, que possuem um espaço entre 250 e 300 metros quadrados. Atualmente, são 155 unidades em São Paulo, mas a rede deverá crescer.
“Em varejo de proximidade, não se deve contar o número de pontos em centenas de unidades, mas em milhares”, diz Naouri. Segundo Enéas Pestana, presidente do GPA, será possível manter um ritmo de abertura de 100 lojas por ano no Brasil pelos próximos exercícios fiscais. A grande dificuldade será estabelecer uma rede logística que acompanhe a expansão. Mas, resolvida essa questão, a empresa poderá adotar modelos mais flexíveis de lojas, que podem ter perfis de preços e formatos bem diferentes, de acordo com a região. Isso é algo que o Casino conhece bem. Em 29 de novembro, o grupo iniciou na França sua experiência mais radical na operação de pequenos comércios de proximidade, com o lançamento da bandeira Nano, de lojas de conveniência com espaço entre 50 m² e 150 m².
“É surpreendente que o Brasil, por seu tamanho, esteja atrasado nos pequenos formatos”, diz Antoine Giscard D’Estaing, diretor-financeiro e membro do conselho do Casino, além de sobrinho do ex-presidente francês Valéry Giscard D’Estaing. Nada impede que o modelo minimalista inspire uma versão ainda mais enxuta do MiniMercado Extra. Outro modelo que se tornará mais comum no País é o de shopping centers no entorno dos supermercados atuais da rede – na França, o grupo abriu mais de 60 desses centros de compras. No Brasil, o piloto dessa estratégia foi a abertura de um centro comercial, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro, construído por sua empresa de desenvolvimento imobiliário, a GPA Malls & Properties.
Outras unidades já estão previstas para Belo Horizonte e São Paulo. Ligada a essa iniciativa está a chegada ao País da divisão de negócios de energia solar Green Yellow. Nos maiores espaços do grupo na França, a empresa instalou painéis fotovoltaicos para atender às necessidades energéticas da operação. A Green Yellow, criada em 2010, mantém operação independente e a melhor rentabilidade do grupo. Também vende energia para 55 lojas Casino que não possuem sistema de energia solar. O investimento total no negócio já atingiu € 500 milhões, que devem ser somados a mais algumas centenas de milhões de reais no Brasil.
“O investimento se justifica, porque gastamos ao ano € 320 milhões em energia elétrica em todo mundo, sendo € 120 milhões no Brasil”, afirma Otmane Hajji, diretor-geral da Green Yellow. A operação local já conta com dois funcionários contratados no Brasil e começa a funcionar no início de 2014. No entanto, um dos maiores desafios trazidos pelo plano estratégico será fazer as marcas próprias do grupo pegarem no Brasil, o que aumentaria a rentabilidade por produto vendido. Na França, elas representam 30% das vendas – US$ 7,5 bilhões. Por aqui, representam apenas 6% do dinheiro que entra nas registradoras. O desafio deve exigir fortes investimentos e, mais do que tudo, que Naouri exerça uma de suas principais características: a persistência.
Veículo: Isto É Dinheiro