O Carrefour e o Grupo Pão de Açúcar (GPA) venderam praticamente o mesmo montante no primeiro trimestre, R$ 12,3 bilhões, cada um - fato inédito desde que as duas companhias divulgam seus dados trimestrais. O empate reflete o crescimento maior do GPA no "atacarejo" - modelo de comércio que reúne atacado e varejo - onde o Carrefour desacelerou. Ainda espelha o fato de o Carrefour ter obtido números melhores em um negócio que tem perdido peso nas vendas do grupo, o de supermercados e hipermercados.
O Carrefour é a maior rede de varejo alimentar do país, em receita anual e, em termos trimestrais também era líder até a publicação dos números do primeiro trimestre na semana passada.
De janeiro a março, as vendas brutas do Carrefour subiram 6%, enquanto no GPA a alta foi de 7,6%. No principal negócio dos grupos, o atacarejo, a expansão foi mais forte no Assaí, do GPA, que avançou 25%, versus alta de 5,7% no Atacadão. Pesa, em parte, o fato de a cadeia do Carrefour ter uma base de comparação mais forte, o que tende a comprimir as taxas neste ano. Já para o Assaí, há o efeito favorável de conversões de hipermercado Extra em Assaí, como ocorre há trimestres seguidos.
Essa estratégia eleva o desempenho do atacado, mas afeta a receita do varejo do GPA. Inclusive isso ajuda a explicar os dados mais fracos do GPA em supermercados e hipermercados neste ano. Nesse caso, o Carrefour está numa posição mais confortável, com expansão num ritmo melhor.
No entanto, apesar disso, o negócio é menos representativo nos resultados do Carrefour - os supermercados e hipermercados respondem por pouco mais 30% da receita trimestral do Carrefour.
Enquanto a venda bruta de supermercado e hipermercado do Carrefour subiu 6,7%, no GPA houve queda de 3,3% nas bandeiras Extra e Pão de Açúcar. Nesse negócio, há retração em receita no GPA há alguns trimestres seguidos.
Ainda é preciso considerar o efeito da queda da inflação (e também da deflação dos alimentos) para as empresas. Os índices mais baixos têm reflexo na taxa de expansão da receita das cadeias. É que preço menor reduz o crescimento nominal, pois deflação não leva, imediatamente, a um aumento no volume vendido. O brasileiro não passa a comprar mais quilos de mercadorias básicas porque o preço caiu.
O efeito é maior na rede mais dependente de itens considerados "commodities" (como leite, arroz, açúcar etc). Segundo analistas, esses produtos pesam mais na venda do atacarejo - negócio que representou 68% da receita do Carrefour e 45% para o GPA.
Ao se analisar outro indicador, de vendas "mesmas lojas" (unidades em operação há mais de 12 meses), o quadro se repete. Assaí cresce 10,7% e Atacadão, 1,4%, afetado pela base com números mais fortes de 2017 - um índice classificado por analistas como "mais morno". Mesmo ao se descontar do Assaí o efeito das conversões, a rede ainda se expande cerca de 6%.
"Olhando para o futuro, acreditamos que o GPA manterá a diferença, já que a empresa parece estar melhor posicionada contra os efeitos da deflação, ao mesmo tempo que completou uma reestruturação ampla de sua estratégia comercial", escreveu Guilherme Assis, analista do Brasil Plural, em informativo aos clientes. O GPA divulgou no relatório de vendas, na sexta-feira, que fez mudanças em sua política comercial em março, após "tendência negativa" em janeiro e fevereiro no negócio de supermercados e hipermercados.
O GPA sentiu efeito negativo de um incêndio no centro de distribuição de Osasco (SP), de itens refrigerados, logo após o Natal. A perda estimada de vendas pela ruptura foi de R$ 200 milhões.
Na semana passada, em relatório sobre o Carrefour, os analistas do Bradesco afirmaram que os números foram fracos, como se esperava - Brasil Plural e UBS destacaram GPA com desempenho "melhor que o rival" - e comentaram que os "os investidores estão preocupados que a deflação possa permanecer forte por mais tempo".
Apesar disso, no longo prazo, o Bradesco continua "a ver valor nas ações do Carrefour Brasil, devido à expansão do atacado de alto retorno", diz. "Continuamos a ter uma preferência pelo Carrefour sobre o GPA", informa o relatório.
A equipe do Goldman Sachs menciona iniciativas do Carrefour neste ano para avançar com o Atacadão (foram quatro aberturas da atacadista de janeiro a março, e o Goldman previa três). Refere-se ainda à expectativa de conversões de hipermercados Carrefour em Atacadão, num movimento semelhante ao já tomado pelo GPA, mas também menciona que o Atacadão "é particularmente exposto" à queda de preços de itens commodities nas lojas.
O destaque positivo do Carrefour, para o Bank of America Merrill Lynch, foi o desempenho "impressionante" da operação do Banco CSF. O Brasil Plural mencionou a "forte contribuição das operações de comércio eletrônico, com um surpreendente crescimento de 103% nas vendas brutas totais [chamado GMV], que elevou em um ponto a contribuição [da área] na venda total do varejo do Carrefour", disse Assis. Essa venda considera a comercialização de eletrônicos no site do Carrefour. A maior parte dessa venda no rival está na Via Varejo, controlada pelo GPA.
Fonte: Valor Econômico