O verde na vitrine

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Varejo adota novos critérios nas negociações com fornecedores para reduzir impactos ambientais.

 

Quando a Johnson&Johnson decidiu neste ano reduzir em 20% o tamanho das embalagens do Band-Aid, um de seus mais antigos e lucrativos produtos, o propósito foi economizar matéria-prima e diminuir o lixo após o uso pelo consumidor. Mas uma questão econômica quase impediu a ideia: pelos critérios comerciais de praxe, com volume reduzido, a mercadoria ocuparia menos espaço nas gôndolas. Sabendo que a exposição no ponto de venda é necessidade primordial do negócio, a rede de supermercados Walmart garantiu para a marca o mesmo espaço linear ocupado pela embalagem antiga - o que tempos atrás seria algo inconcebível.

 

Em nome da sustentabilidade, fórmulas de negociação para ocupar disputadas prateleiras, tradicionalmente baseadas na quantidade de produtos, preço e volume de vendas, foram modificadas. E permitiram ao fabricante manter o projeto, disseminando-o do Brasil para o resto do mundo, tendo em vista que a sede da multinacional no país atende 80% do mercado de Band-Aid das Américas.

 

A partir das mudanças nessa conta, a Kimberly-Clark lançou o papel higiênico Neve Naturali, produzido com 100% de fibra reciclada e embalagem 25% menor, com alça que dispensa o uso de sacolas. Até o fim do ano, a estimativa é a chegada de quinze novos produtos de marcas tradicionais com essas características, dentro do programa "Sustentabilidade Ponta a Ponta", do Walmart. Em 2009, foram dez lançamentos. "A iniciativa é fruto de novas rotinas na gestão de um supermercado", afirma Christianne Urioste, diretora de sustentabilidade.

 

O tema permeia diferentes operações - da construção de novas lojas ao gerenciamento de resíduos - e as decisões são tomadas a partir de reuniões trimestrais de dez grupos de trabalho, liderados por executivos-sêniores. A eficiência é medida pela avaliação de metas e indicadores de desempenho.

 

O grupo focado na expansão da rede, por exemplo, é coordenado por um vice-presidente e planeja lojas com diferentes formatos, desde o hipermercado até pontos de venda menores, de bairro, reduzindo em 40% o consumo de água e 25% o de energia. Já o setor comercial e de marketing, também sob responsabilidade de um vice-presidente, define operações de venda e novas práticas de negociação com fornecedores. "Sinalizamos a prioridade por produtos sustentáveis e o mercado já entendeu o recado", diz Urioste.

 

Na seção de pescados, fornecedores terão origem e localidade identificadas e até 2016 toda a cadeia de peixes e crustáceos será rastreada, com prioridade para compra de pescadores artesanais. No departamento de higiene e limpeza, entre os exemplos está o amaciante de roupas Comfort Concentrado, lançado pela Unilever com embalagem menor, que significa menos plástico, e rendimento que permite economia de água na lavagem. O preço é 20% inferior à versão tradicional do produto. "A estratégia é operar produtos de qualidade e conceito sustentável, que não custem mais caro por essa característica, fator importante para incentivar o consumo responsável e o aumento das vendas", revela Urioste.

 

Novos procedimentos chegam ao chão da loja, dentro de um trabalho que vai além de reabastecer e arrumar prateleiras. Oitenta mil funcionários recebem treinamento como "agentes de mudança", incluindo temas como uso consciente de sacolas plásticas e preferência por produtos com embalagens recicláveis. O objetivo é fazer a preocupação chegar aos consumidores - desafio que levou o Walmart a participar de um consórcio internacional, coordenado pelas universidades americanas do Arizona e do Arkansas, que desenvolve atualmente índices para diferenciar empresas e produtos sustentáveis. A questão está em debate também na União Europeia e no Brasil, inclusive com intenções de regulação do governo.

 

Cresce o uso de selos ambientais nas embalagens. Uma caixa de suco tem hoje pelo menos quatro diferentes carimbos. "O problema é que não há clareza sobre o seu significado, como exige a lei", ressalta Lisa Gunn, coordenadora do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec).

 

"Há pouco entendimento do consumidor sobre como suas decisões de compra impactam o meio ambiente", opina Roberta Cardoso, coordenadora do Centro de Excelência em Varejo, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo. "Pela grande capilaridade e contato direto com o consumidor final", acrescenta Roberta, "redes de supermercados podem fazer a diferença na questão da sustentabilidade". O tema decolou, segundo ela, com o debate sobre o uso abusivo de sacolas plásticas, que teve o setor como vilão e culminou na criação do Fórum de Sustentabilidade Social do Varejo.

 

Apesar dos avanços, há barreiras a vencer: "Se o comprador não confia na veracidade de informações sobre produtos sustentáveis, como irá pagar por eles?", questiona ela.

 

O desafio chega aos pequenos e médios varejistas, conforme os resultados do 5º Prêmio de Responsabilidade Social e Sustentabilidade no Varejo, recém-divulgado pela FGV. Se o Mercadinho Mangueira, de São Bernardo do Campo, investe em projetos sociais com comunidades do entorno, a rede Caçula Pneus criou um selo para provar ao cliente os caminhos da logística reversa e o destino final dos materiais substituídos nas revisões do carro.

 

Entre iniciativas de maior porte, estão as que fecham o ciclo de vida dos produtos, da fabricação ao consumo final, evitando o descarte no ambiente. No Grupo Pão de Açúcar, as embalagens de papelão da linha de bem estar Taeq - das torradas às barras de cereais - são confeccionadas com papéis recicláveis deixados pelos clientes nas estações de coleta das lojas.

 

A rede recebe em São Paulo uma quantidade de embalagens equivalente a 20% de todo resíduo reciclável recolhido pela prefeitura na capital. O material é repassado para cooperativas de catadores.

 

Supermercados tornam-se, assim, prestadores de serviços ambientais. Nas lojas brasileiras do Carrefour, onde transitam diariamente 2 milhões de pessoas, os pontos de coleta para reciclagem serão triplicados até o fim do ano e, em 2014, as sacolas plásticas serão banidas. "Temos o poder de mobilizar consumidores e pressionar cadeias produtivas para ações responsáveis", ressalta o diretor de sustentabilidade, Paulo Pianez.

 

"Recente pesquisa mostra mudança de perfil dos clientes, hoje interessados em saber onde e por quem os produtos foram fabricados", revela o executivo. A maioria deseja que o supermercado faça seleção prévia da oferta, descartando opções nocivas ao ambiente. Isso justifica a adoção de instrumentos eficientes para comprovação de origem, a exemplo do que faz com 45% da carne que comercializa no Brasil.

 

 
Veículo: Valor Econômico


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