Estudo encomendado pela Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) indica a parceria público-privada (PPP) nos serviços de limpeza urbana e manejo do lixo como a melhor solução para os municípios brasileiros se adequarem às exigências da nova política nacional de resíduos sólidos, regulamentada em dezembro de 2010 depois de 20 anos de debate no Congresso. Pelo menos quatro cidades paulistas já planejam PPPs com esse objetivo.
De acordo com a lei federal, a partir de 2014 será proibido o uso de lixões e os aterros sanitários legalizados só poderão receber rejeitos, ou seja, tudo aquilo que não pode ser reutilizado ou reciclado. Essas diretrizes obrigam as prefeituras a investir para melhorar os sistemas de tratamento do lixo e aumentar extraordinariamente as práticas de reciclagem - apenas 3% das cidades brasileiras têm mecanismos de coleta seletiva regulamentados, segundo o Ministério do Meio Ambiente.
O estudo da Abrelpe destaca que a maior parte dos municípios, principalmente os pequenos, não conta com recursos suficientes nem capacidade técnica para modernizar a cadeia produtiva do lixo, da varrição e coleta até a correta destinação final dos resíduos e a operação de aterros ou estações de tratamento. "A PPP é o melhor e, talvez, único arranjo institucional para fazer frente às novas demandas regulatórias da política nacional", aponta o documento.
Carlos Silva Filho, diretor da Abrelpe, salienta que 4% do orçamento municipal são destinados para serviços de limpeza pública, em média. "É fundamental que se busquem novas formas de financiar os custos resultantes das novas obrigações", diz ele. Segundo o levantamento da associação, as concessões tradicionais ou terceirizações, via lei 8.666, têm uma série de limitações para a operacionalização de uma central de tratamento de lixo moderna: "Entre 75% e 80% dos contratos de limpeza urbana hoje são terceirizações baseadas na lei de licitações, que permite contrato máximo de 60 meses e investimento só do poder público. De onde virão recursos para coleta seletiva ou centrais de tratamento de resíduos?", pondera Silva Filho.
São Sebastião, no litoral paulista, Osasco e Barueri, na região metropolitana de São Paulo, e Jacareí, no interior do Estado, desenvolveram editais para adotar o modelo de PPPs na limpeza pública. A Haztec, que opera uma central de tratamento de lixo em Nova Iguaçu, no Rio, participa de concorrências de parcerias com o poder público em outras sete cidades.
"A lei das PPPs [de 2004] permite que a iniciativa privada tenha interesse em serviços que dependam de investimentos vultuosos, com garantias definidas. E com a política nacional dos resíduos sólidos, o empresário passa a olhar o lixo como um negócio. São dois instrumentos fortes, complementares no setor", avalia Artur Oliveira, diretor de marketing da Haztec.
O gasto anual da prefeitura de São Sebastião com limpeza pública é de cerca de R$ 20 milhões. Um quarto desse valor é destinado só para levar as 110 toneladas diárias de lixo até o aterro sanitário mais próximo, em Tremembé, a 165 quilômetros da cidade. A lei federal aprovada no ano passado fez o prefeito Ernani Bilotti se inquietar: "Quando o aterro de Tremembé ficar saturado vamos ter que levar nosso lixo mais longe? Não dá mais para continuar assim."
No ano passado, ele lançou concorrência para avaliar projetos de uma central de tratamento de lixo no município. "No litoral e na nossa região do Parque da Serra do Mar não se aprova a abertura de um aterro sanitário. A única saída é a construção de uma usina térmica ou biomecânica de lixo. Tivemos seis estudos apresentados e escolhemos a segunda opção. Agora vamos licitar a usina por PPP, porque não temos R$ 150 milhões do investimento nem condições técnicas para tocar o projeto."
Segundo o prefeito, a usina biomecânica de tratamento de lixo que será instalada em São Sebastião recicla quase 100% dos resíduos secos recebidos. O lixo orgânico e aquele que não pode ser reaproveitado é transformado numa substância que serve de combustível para autofornos, que pode ser vendido e aumentar o potencial de receita do projeto. "É tecnologia muito avançada, faz a separação de vidro até por cores e sem contato manual", conta Bilotti.
A contrapartida da prefeitura para o fechamento da PPP é o pagamento para depositar o lixo da cidade na usina. Estima-se que o preço seja 26% inferior aos R$ 5 milhões gastos anualmente para transportar o lixo por quase 200 quilômetros. O tempo de exploração do serviço será de 30 a 35 anos, com possibilidade de renovação do contrato. "Nossa expectativa é que feche em 35% do nosso gasto atual com transporte. Não vamos ter mais caminhão levando lixo para cima e para baixo. A economia com a PPP, que será de pelo menos R$ 1,3 milhão, será direcionada para investimentos em serviços na região em que a usina será construída", explica o prefeito.
O desafio agora é convencer a população. Moradores da área escolhida para sediar a indústria não gostaram da ideia de ser vizinhos de uma usina de tratamento de lixo. "Nos próximos meses, vamos começar as reuniões de esclarecimentos. Vamos explicar para os moradores que se trata de um empreendimento com os aspectos de uma fábrica e não de um lixão. Nos Estados Unidos existem estabelecimentos comerciais e até lanchonetes que funcionam lado a lado com essas usinas", comenta Bilotti.
Veículo: Valor Econômico