Serviços: Entrega eletrônica de contas esbarra no custo da cobrança registrada e falta de cultura
"A administradora de condomínio Hubert, de São Paulo, aderiu ao Débito Direto Autorizado (DDA) assim que a novidade entrou no ar, há um ano. A primeira providência tomada pelo diretor financeiro, Rodrigo Gebara, foi migrar seu sistema de contas a receber para a chamada cobrança registrada - o serviço de emissão e postagem de boletos, antes feito pela própria empresa, passou para o banco, pré-requisito para o DDA. Mas da base mensal de 35 mil boletos que potencialmente poderiam então ser entregues eletronicamente, apenas 3 mil estão sendo efetivamente pagos via DDA. Ao que parece, os condôminos não se animaram com a ideia.
Já a rede de franquias Puket recomendou aos seus lojistas que voltassem atrás e se descadastrassem do sistema, após identificar várias falhas na entrega da cobrança eletrônica e até a apresentação de boletos em duplicidade, segundo a gerente de atendimento Beatriz Pires. O diretor de uma das franquias conta que aderiu ao DDA, mas desistiu do serviço porque deixou de receber as faturas de pagamento das mercadorias pelos Correios, mas também não recebia pelo DDA. "Muitas vezes, a gente só ficava sabendo do débito quando o título era protestado pelo banco."
Passado um ano da criação do DDA, esses casos mostram que a cobrança eletrônica tem não só resistências culturais a vencer como também carece de algum aperfeiçoamento. Nesse período, o DDA alcançou a marca de 4,605 milhões de sacados, 80% deles pessoas físicas. Pela Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP) passaram mais de 150 milhões de boletos. A estimativa é que o número total de boletos processados pelo sistema bancário chegue a 3 bilhões neste ano. A meta da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), divulgada à época da criação do serviço eletrônico, é de que 50% desse volume migre para o DDA em cinco anos.
Mas, para alcançar tal objetivo, o maior desafio dos bancos talvez seja o de converter para a cobrança registrada o universo de boletos que hoje são impressos e postados pelas próprias empresas, em geral do segmento de serviços. As estimativas são de que 70% dos boletos sejam entregues, hoje, dessa forma. O motivo é preço. Na administradora de condomínios Hubert, a mudança para o sistema de cobrança registrada saiu 50% mais cara, segundo Gebara. Ele avalia, porém, a experiência como positiva. "Ganhamos agilidade por não termos mais de manusear todas as contas", diz.
São poucas as empresas, entretanto, que estão dispostas a arcar com custos bancários maiores para ganhar comodidade e também oferecer comodidade a seus clientes. Até mesmo as instituições financeiras contribuem para essa situação, já que sua própria carteira de cobrança, de áreas como financeiras e cartões de crédito, não integram a cobrança registrada. Ou seja, não adianta o cliente se cadastrar no DDA, porque vai continuar recebendo a sua fatura de cartão e o carnê do financiamento de veículos pelos Correios.
"Os consórcios e financeiras imprimem de uma só vez os carnês, estão acostumados a trabalharem dessa forma, assim como os clientes", justifica Sandro Marcondes, diretor comercial do Banco do Brasil. "Para alterar essa prática vai demorar um pouco." O BB registrou a adesão de 1,186 milhão de contas ao serviço de DDA, 94% de pessoas físicas. Foram processados, nesse período, 56 milhões de boletos por via eletrônica. Em quase todos eles o sacado eram empresas, ou seja, tratava-se de pagamento a fornecedores. Segundo Marcondes, 60% dos cerca de 2 milhões de contas pessoa jurídica utilizam o modelo de cobrança registrada.
Se os próprios bancos têm de fazer ajustes em sistemas e rotinas para migrar para a cobrança registrada, o mesmo vale para as empresas, que têm que se adaptar tecnologicamente para mandar os arquivos para a instituição financeira eletronicamente. "O esforço de migrar para a cobrança registrada não pode ser isolado, tem de ser do mercado como um todo", defende Leonardo Ribeiro, superintendente de produtos de "cash management" do Santander.
No banco de capital espanhol, desde que o DDA passou a integrar o cardápio de serviços, 780 mil clientes se cadastraram como sacados eletrônicos, 90% deles pessoas físicas. Só que na carteira global de cobrança do banco, pouco mais da metade é registrada. Para 2011, o planejamento das diversas áreas de negócio inclui aperfeiçoamentos tecnológicos para que a financeira e a divisão de cartões transfiram o seu sistema de contas a receber para a cobrança registrada.
No Bradesco, a adesão de clientes ao DDA somou 1,9 milhão de contas, 80% delas de pessoas físicas. Foram processados nesse primeiro ano de funcionamento do serviço 50,3 milhões de boletos, de um total de 540 milhões de títulos registrados no banco. Para estimular a adesão das pessoas, o Bradesco lançou há um mês um serviço de pagamento por mensagem de celular SMS. "O cliente não precisa ir ao banco ou acessar a internet para fazer o pagamento, basta autorizar o débito, respondendo à mensagem que enviamos."
Veículo: Valor Econômico