O clamor das pequenas e médias empresas pela melhoria de produtividade e eficiência - que já foi privilégio das grandes organizações, com bolsos fundos e muita ajuda contratada - está mudando o mercado de software de planejamento de recursos empresariais (Enterprise Resource Planning, ou ERP).
Mas metas ambiciosas demais, o fraco gerenciamento de projetos e o fracasso no desenvolvimento de software em toda parte ainda perseguem as empresas em sua busca por melhoria nos negócios, criando histórias tenebrosas que, segundo alguns especialistas, prejudicam injustamente a credibilidade dos sistemas que deveriam ser a salvação dessas companhias.
Tim Welburn, um especialista em tecnologia da informação (TI) da PA Consulting, observa que para muitas companhias a instalação de ERPs tem sido traumática. "Elas vêm produzindo poucos benefícios, frequentemente fazem muitas tentativas na implementação e gastam milhões de libras para implementar soluções bem comuns, que fazem pouca coisa mais do que os sistemas que elas já tinham", afirma o consultor. "Essa visão da implementação grandiosa e cara do ERP mete medo em organizações de médio porte."
Mas as coisas estão mudando, afirma Welburn. "Provedores menores de ERP estão crescendo e começando a desafiar os vendedores estabelecidos. Inversamente, os grandes vendedores de ERP estão fornecendo módulos mais fáceis de manejar, em pacotes de serviços e hosting [modelo pelo qual o cliente usa a infraestrutura de computação de terceiros]."
Essas duas abordagens, diz o especialista, "estão se encontrando, com a queda dos custos de ERP, o aumento da concorrência dos fornecedores, as arquiteturas modernas e ágeis e uma capacidade de entrega madura resultando em menos projetos falhos."
Até mesmo as abreviaturas, uma relíquia das décadas de 60 e 70, quando os principais clientes eram as grandes empresas, estão sob ataque. "Eu acho que é hora de mudar o nome", diz Alastair Sorbie, executivo-chefe do grupo de software IFS. "Eu prefiro 'soluções centradas em projetos'."
Mas, talvez, "sistemas empresariais" possa hoje descrever melhor esses produtos amplos e multimodulares. A SAP da Alemanha, estabelecida em 1972, é uma das poucas companhias de software da Europa que, com 82 mil clientes no mundo, pode alegar ser uma líder global.
Ela foi pioneira no conceito do ERP - um conjunto de programas para gerenciar e coordenar a maioria dos aspectos das atividades de uma companhia -, ao desenvolver programas dispendiosos que exigiam uma personalização substancial para as empresas. Nos Estados Unidos, a Oracle, com a aquisição da PeopleSoft e da JD Edwards, tem uma posição de liderança entre as grandes companhias, com recursos disponíveis para investimentos.
Hoje, os mercados tradicionais de ERP na Europa Ocidental e EUA estão ficando saturados: o centro de gravidade está mudando tanto para o leste como para o mercado intermediário. Sorbie, presidente de uma companhia que se orgulha de ter respostas rápidas para os novos mercados, diz que seus clientes deverão agora vir mais dos setores de defesa, segurança nacional e energia do que do setor de manufatura. "Não estamos prevendo crescimento nos EUA e na Europa Ocidental para os sistemas de ERP voltados para o setor industrial. Essa demanda mudou para o Leste Europeu e a região da Ásia-Pacífico".
Portanto, para empresas como a SAP e a Oracle, o truque vem sendo reescrever seus sofisticados sistemas para que eles se encaixem nas companhias menores, ao mesmo tempo em que enfrentam outros fornecedores, como Microsoft, IFS, Infor, Epicor e Sage, que veem o mercado intermediário como seu território de caça natural.
"Inside-ERP", um guia de compras dedicado ao mercado de companhias médias e publicado pela Tippit, observa que os vendedores estão reduzindo a complexidade de seus sistemas. Ele afirma: "Os vendedores estão facilitando o uso das soluções de ERP e simplificando sua implementação, além de reduzir o grau de personalização necessário para que elas se encaixem nas necessidades do cliente, principalmente com a criação de características que suportam certos aspectos dos negócios que são comuns a organizações de médio porte de um determinado setor. Por exemplo, um sistema de ERP desenvolvido para a indústria da moda precisa usar matrizes específicas para roupas, como tamanhos, cores e estilos".
Alan Bowling, presidente do grupo de usuários da SAP no Reino Unido, diz que a companhia está reduzindo o custo total de propriedade com o uso inovador da tecnologia: "Isso pode proporcionar uma abordagem mais integrada. O custo de uma atualização tecnológica pode ser dolorosa".
Bowling diz que as companhias começam a perceber que os custos são afetados de uma maneira crítica pelo nível de personalização: "É importante não fazer muita personalização. Em vez disso, você deve se concentrar naquelas coisas que realmente fazem diferença para o seu negócio. Isso é algo que as pessoas não entendiam antes. Elas realmente entendem isso agora".
Ele acrescenta que, ao contrário da doutrina do setor, os sistemas da SAP nunca foram especialmente difíceis de personalizar. "Os processos de gerenciamento de mudanças que as pessoas estavam usando não eram lá muito inteligentes", diz.
Os ERPs modernos são formados por um conjunto de módulos centrais, normalmente de inteligência empresarial, gerenciamento de relações com os clientes, administração financeira, gerenciamento de capital humano, operações de produção e gerenciamento da cadeia de fornecimento. São programas, segundo Sorbie, que pegam todas as informações complexas associadas a um projeto e as apresentam de uma maneira que permite a alguém da cúpula administrativa ver rapidamente onde a empresa está, em vez de recorrer a uma infinidade de planilhas.
O guia Inside-ERP sugere que um sistema de produção enxuto, a administração dos processos de negócios, o gerenciamento dos ativos da empresa e a administração das relações com os fornecedores são possibilidades adicionais. A publicação observa que "a queda dos custos dos equipamentos, da tecnologia de infraestrutura e dos programas de ERP colocam uma versão moderna desses outrora pacotes épicos de gerenciamento empresarial ao alcance de qualquer companhia de médio porte".
E as vantagens são reais. Segundo uma pesquisa realizada pela consultoria Accenture, 76% das empresas consultadas na América do Norte e no Reino Unido disseram que os sistemas de ERP contribuíram para a vantagem competitiva e o valor estratégico de suas organizações.
Karl Havers, diretor de tecnologia da consultoria Ernst & Young para a Europa, diz que a melhoria de eficiências observada por uma companhia com um sistema de ERP bem estabelecido e bem executado é quase palpável, muito embora a maioria das empresas use apenas pouco mais da metade das funcionalidades de seus sistemas.
"Os sistemas de ERP permitem a um grupo trabalhar de maneira eficiente e a administrar os estoques, a cadeia de fornecimento e a distribuição global, além de obter informações administrativas efetivas", diz ele. "E ainda tem mais. Para aproveitar a economia de custos com os centros de serviços compartilhados - seja isso para financiar processos de compras, crédito ou processamento de cobranças ou reclamações -, é quase imperativo ter um sistema de ERP."
Mas Havers alerta: "O ruim é que implementar um sistema de ERP complexo parece ser realmente difícil para muitas organizações". Assim como Bowling, ele também acredita que raramente a culpa é do software. "Os problemas aparecem quando as organizações começam a personalizar o software, mas na verdade eles começam com o gerenciamento ruim do programa, com a pouca atenção dada às mudanças culturais exigidas e a falta de entusiasmo para se adaptar os processos de negócios para que eles funcionem com o software", afirma o especialista.
Além disso, o custo continua sendo um ponto controvertido. Sachin Shah, sócio da prática de TI da Bain & Company, diz que as necessidades de preço dos vendedores e dos compradores são diametralmente opostas. Ele diz que hoje as licenças são baseadas numa mistura de preços que levam em conta as receitas, as exigências de processamento e as necessidades do usuário, o que coloca muitas empresas em desvantagem.
O preço baseado nas necessidades do usuário, por exemplo, significa que algumas companhias precisam comprar uma licença plena para cada funcionário, embora usem um pequeno número de funções. "As estruturas de preço precisam mudar", diz ele. "Os vendedores de ERP precisam deixar que as empresas paguem pelo que elas vão usar em termos de funções, sem coagi-las com base no número de usuários ou seus níveis de receita.
Ao que parece, para que o ERP seja empregado com sucesso tanto pelas pequenas como pelas grandes empresas, será necessário mais que uma simples mudança de nome.
Veículo: Valor Econômico