Déficit de embalagens afeta variedade de sucos no varejo e faz cervejarias optarem por vidro
Estão faltando latinhas no mercado, sejam elas de cerveja, de bebidas alcoólicas ou de sucos. Um pico além do esperado no consumo de bebidas neste verão pegou a indústria de latas de surpresa e o resultado é um déficit de 1,5 bilhão de unidades, conforme cálculos da Associação Brasileira dos Fabricantes de Latas de Alta Reciclabilidade (Abralatas).
"Está muito difícil conseguir latas na quantidade em que precisamos", diz o presidente da Diageo no Brasil, Alexandre Louro. A empresa usa latas para parte de sua linha de vodcas Smirnoff Ice. Da mesma maneira reclama o presidente da AmBev, João Castro Neves. "Os fornecedores não estão dando conta do aumento da demanda", afirma ele. No ano passado, segundo dados Nielsen, o mercado brasileiro consumiu 7,7 bilhões de litros de cerveja - quase 400 milhões de litros a mais que em 2008. Este ano, conforme a previsão do Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja (Sindicerv), o salto deve ser ainda maior, ficando em torno de 8%, por conta da Copa do Mundo, entre junho e julho. "É como se tivéssemos um mês a mais no verão. O consumo de junho e julho, que fica entre 600 milhões e 700 milhões, pula para 1 bilhão", afirma Enio Rodrigues, superintendente executivo da entidade.
Para acompanhar esse crescimento, a três principais indústrias de latas do país - Rexam (que tem 65% do mercado), Crown (com 20%) e Latapack Ball (com 15%) - estão investindo no aumento da capacidade de produção. "A capacidade de produção em 2008 era de 14,4 bilhões de unidades e subiu para 16,8 bilhões no ano passado. O aumento previsto na capacidade em 2010, com as fábricas em construção e ampliação de linhas de montagem, vai fazer a produção chegar a 18 bilhões", diz Renault de Freitas Castro, diretor executivo da Abralatas.
Mas porque, então, faltam latas agora? "No início do ano passado, a indústria, como vários outros setores da economia, freou a produção. Mas o consumo não parou. O reflexo dessa 'parada para pensar' está atingindo a indústria de bebidas agora", explica ele.
Até que os investimentos se transformem em produção, a falta de latas deve continuar. "Enquanto a situação não se normaliza, vai ser preciso importar latas, cerca de 1, 5 bilhão de unidades", diz o executivo. A associação, segundo ele, está em negociação com o Ministério da Fazenda para que a alíquota de importação do produto caia de 16% para zero. Mesmo assim, a indústria de bebidas vai ter que aguentar a falta de embalagens por pelo menos mais um mês. "Caso a importação seja liberada agora, ainda leva de um a dois meses para que a situação comece a se normalizar", afirma Castro.
Enquanto isso, a indústria tenta encontrar alternativas. Na WOW!, que produz as linhas de sucos SuFresh e a de chás Feel Good, os pedidos dos pontos de venda estão sendo atendidos com até dois dias de atraso. "Produzo uma certa quantidade de sucos de uva, por exemplo. Mas na hora de embalar, me entregam latas para suco de maçã. Isso tem acontecido com todas as indústria de suco", diz William de Angelis Sallum, diretor-geral da empresa e presidente da Associação Brasileira dos Produtores e Envasadores de Néctares e Sucos (Abrasuco). A falta de latas, segundo ele, não vai gerar desabastecimento de sucos no mercado. "Mas a variedade de produtos nas prateleiras já não é mais a mesma. A indústria está produzindo os sabores conforme as latas que tem."
Na indústria de cervejas, conforme o Sindicerv, a solução será dar mais foco a outras embalagens, principalmente às de vidro. Hoje, 27% da produção é enlatada. "Nos supermercados, onde a maior parte dos produtos é lata, a alternativa vai ser a garrafa 'long neck' de vidro", diz Enio Rodrigues. Para Martinho Paiva Moreira, vice-presidente da Associação Paulista de Supermercados (Apas) a mudança não deve ser bem recebida. "O consumidor não aceita a 'long neck'. Ele prefere a lata porque é mais leve e não quebra", diz. "Essa preferência só mudaria se o preço da lata descolar do da 'long neck'. Ou seja, se a indústria aumentar o preço da latinha, que hoje custa o mesmo que a embalagem de vidro." Nas cervejarias, que reajustaram preços em novembro, ninguém ainda fala de uma nova tabela de preços. Por enquanto.
Veículo: Valor Econômico