O Brasil vai importar este ano 15% a mais da vodca Stolishnaya, uma das mais tradicionais do mundo, controlada pela FKP Sojuzplodoimport, estatal russa. Ao todo, serão 276 mil garrafas distribuídas em bares, restaurantes e varejistas de todo o país pela Globalbev, parceira da importadora Ostalco. A vodca é a segunda mais vendida entre as importadas, só perdendo para a sueca Absolut, da Pernod Ricard. O crescimento das compras sinaliza o quanto os importadores estão animados com a possibilidade de se tornarem, definitivamente, os únicos a distribuir a bebida no Brasil, onde o consumo somou quase R$ 1 bilhão em 2009, segundo a Nielsen.
Semana passada, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) homologou uma sentença estrangeira favorável à FKP, que alega ser a legítima detentora dos direitos de exploração da marca Stolishnaya no mundo. No Brasil e em mais 13 países, a FKP briga na justiça contra a holandesa Spirits, que também vende a vodca russa com o mesmo nome, em um imbróglio que se arrasta há mais de uma década. Em oito países, os russos vêm ganhando.
"É uma briga boa", resume o advogado Thomas Felsberg, sócio fundador da Felsberg e Associados, que atende a FKP. E complexa também. Segundo Felsberg, a decisão do STJ homologa a sentença estrangeira, que diz que a VAO Sojuzplodoimport (empresa privada russa, comprada pela Spirits), não é a sucessora da VVO Sojuzplodoimport, antiga estatal soviética que controlava a Stolishnaya (atual FKP). Nos anos 90, depois do colapso da União Soviética, algumas empresas estatais foram privatizadas e, entre elas, estaria a VVO, que então teria passado a se chamar VAO. Anos depois, por iniciativa do governo, que procurava reaver suas marcas de vodca no mundo, a Justiça russa não reconheceu a sucessão e, no Brasil, o STJ homologou essa sentença.
"Em 2008, a Spirits chegou a apelar para o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, a Corte de Strassburgo, argumentando que a Justiça russa não havia lhe concedido direito de defesa na questão envolvendo a Stolishnaya, mas o Tribunal entendeu que a decisão estava correta", diz Felsberg, contratado pela FKP em 2004.
Além do pedido de homologação da sentença russa, os advogados do Felsberg entraram com uma ação no Tribunal Regional Federal (TRF) do Rio de Janeiro requerendo a nulidade da transferência da marca para a Spirits, que havia formulado o primeiro pedido em 1993 ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). A marca, no entanto, já estava no Brasil desde a década de 70. Enquanto não saía a decisão do STJ, porém, o TRF do Rio decidiu que as duas empresas poderiam vender a vodca no Brasil.
Na prática, entretanto, só a Stolishnaya do governo russo está sendo vendida no país, diz o advogado Ernani Guimarães, do Feslberg. "Encaminhamos uma representação administrativa ao Mapa [Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento] informando que a vodca da Spirits apresentada como original russa, na verdade, vem da Letônia", diz Guimarães. No Brasil, a vodca da Spirits era distribuída pela Pernod Ricard que, com a compra da Absolut em 2008, tirou o produto do porfólio.
O Ministério da Agricultura confirma que solicitou novo certificado de origem à Spirits para que o produto possa continuar entrando no país. Daniela Bessone, advogada do Lobo & Ibeas, que defende a Spirits, afirma não saber se a vodca do seu cliente continua ou não sendo vendida aqui. Segundo Daniela, a decisão do STJ só envolve a Plodovaya Compania (novo nome da VAO), e entende que as outras empresas russas rés no processo (a ZAO, a Plodimix e a Spirits) são "terceiros". "Portanto, não podem ser atingidas pela 'coisa julgada' decorrente da homologação", diz.
Seria bom para a saúde da marca que a discussão fosse encerrada o quanto antes, segundo o consultor Adalberto Viviani, especialista em bebidas. "A Stolishnaya chegou ao Brasil como uma marca 'premium', mas perdeu espaço na última década para Absolut e Smirnoff, que se modernizaram e investiram em marketing", diz.
Veículo: Valor Econômico