Família Negrão começou importando havaianas e hoje tem marca própria de suco, presente em mais de oito mil pontos de vendas
O primeiro contêiner que o paraense Cláudio Negrão levou do Brasil para os Estados Unidos, em 1983, tinha sandálias havaianas, bombom sonho de valsa, arroz branco, feijão, pão de queijo, farinha - coisas que um imigrante brasileiro sentia saudade de consumir e não encontrava nas prateleiras de supermercados americanos (ou encontrava a preços impraticáveis).
Era o olhar empreendedor de um também imigrante, recém-chegado com mulher e filhos, que não queria ficar sem trabalho. De importador de produtos brasileiros, Negrão virou empresário de sucos tropicais em território americano. Em mais de oito mil pontos de venda no País, a marca Brazil Gourmet faturou no ano passado, R$ 13 milhões, vendendo sucos de manga, goiaba, pêssego e caju. "É como se a pessoa estivesse mordendo a fruta", diz a filha Simone Anewalt, hoje diretora comercial da empresa ao lado da mãe, Glória, que está na função de presidente. O pai atua nos bastidores.
O relacionamento da família com o mercado americano é de longa data. Ainda na época em que viviam em Belém, na década de 70, Cláudio Negrão exportava peixes ornamentais para os Estados Unidos. Manteve a atividade até a Pan American suspender os voos para a capital paraense. Insistente, deu um jeito de continuar exportando flores ornamentais. Até que os filhos adolescentes foram estudar nos Estados Unidos, fizeram a vida por lá e convenceram toda a família a deixar o Brasil.
"Fomos uns dos primeiros a abastecer a comunidade brasileiro com produtos nacionais", conta Glória. "Os contêineres eram verdadeiros supermercados." Com o passar dos anos, a família percebeu que estava indiretamente fortalecendo marcas brasileiras nos Estados Unidos sem ganhar nada por isso. Foi quando surgiu a ideia de seguir por conta própria.
De início, só sabiam que não queriam mais vender produtos dos outros. Chegaram a cogitar a possibilidade de produzir e vender chocolates - como o Sonho de Valsa, sucesso entre os brasileiros. Mas acabaram buscando uma alternativa mais saudável, e que pudesse atingir uma clientela mais endinheirada, os próprios americanos.
Frutas. Os sucos foram desenvolvidos à distância, com polpas de fruta levadas do Brasil para lá. Os testes eram feitos em casa, com as famílias dos genros (todos americanos) e entre vizinhos. Com o suco na caixinha, o desafio era entrar em grandes redes de supermercados. Até hoje, é Simone quem faz esses contatos e apresenta a empresa a parceiros. "Sabe aquele ditado? Água bate, bate até que faz um buraco? Foi assim que conseguimos", diz ela, que, apesar de visitar o Brasil quatro vezes por ano, vez ou outra esquece palavras e expressões em português.
Cautelosa, a Brazil Gourmet lança novos produtos aos poucos. Os quatro sabores são os mesmos desde 2003. Este ano, a família planeja novidades, provavelmente com uma nova linha de produtos, "Mas ainda é segredo", diz Simone. Todas as estratégias são voltadas para o mercado americano. Glória diz que, depois de tantos anos fora, estender a operação para o Brasil, onde já não conhecem o mercado, seria arriscado demais. Por enquanto, do País, eles só querem a polpa.
Veículo: O Estado de S.Paulo