Com rede própria de distribuição e um portfólio bem sortido de marcas premium, a cervejaria Schincariol é a cereja do bolo para as multinacionais que querem enfrentar a Ambev no Brasil
A cerveja pode não ser a mais saborosa do mercado – e talvez não seja mesmo – e a marca, embora tenha boa participação, também não está entre as mais valorizadas. Então, por que há tanta gente interessada em comprar a Schincariol? Mais do que um faturamento de R$ 5,7 bilhões ou um parque de 13 fábricas, o que interessa aos candidatos a assumir o controle da empresa de Itu, no interior de São Paulo, é a logística que levou a Schincariol a conquistar 12% do concorrido mercado de cervejas. No capítulo distribuição, a empresa familiar, de capital 100% nacional, é a única em solo brasileiro a fazer frente à gigante do setor, a Ambev.
Com uma rede de 190 revendedores, dez centros próprios de distribuição e 13 fábricas espalhadas por 11 Estados, a Schincariol chega a aproximadamente 600 mil pontos de venda – e esse é o seu grande ativo, cobiçado por grandes marcas mundiais, especialmente pela Heineken, que resolveu apostar firme no mercado brasileiro.
No ano passado, a cervejaria holandesa comprou a operação da mexicana Femsa no País – dona da Kaiser, Xingu, Bavária e Sol. Apesar do portfólio de marcas, a Femsa nunca teve distribuição própria e a Heineken continua dependendo de um acordo com a Coca-Cola para entregar suas cervejas. Além da Heineken, a dinamarquesa Carslberg e a americana SABMiller também teriam feito propostas de compra à família Schincariol.
O valor oferecido estaria entre R$ 5 bilhões e R$ 8 bilhões e, por incrível que pareça, sai mais em conta do que montar uma rede de distribuição por todo o País. “São mais de 1,5 milhão de pontos de venda no Brasil, o que torna a distribuição uma logística bastante complexa”, afirma César Ortiz, diretor de inteligência da agência de publicidade Young & Rubican.
“E, em alguns casos, há ainda as embalagens retornáveis, o que dificulta ainda mais a operação.” O que hoje é apontado como o grande ativo da cervejaria de Itu foi construído a partir da fusão entre Brahma e Antarctica, no final da década de 1990. “Naquela ocasião, a Ambev incentivava distribuidores mais competitivos e pressionava os menos eficientes a sair”, lembra o professor Timothy Altafter, do Insper. “A Schincariol nasceu como alternativa para esse pessoal, que se sentia rejeitado pela Ambev.”
Além da rede de distribuição azeitada, a aquisição da empresa favorece a estratégia de médio e longo prazos das três fabricantes estrangeiras: crescer no segmento de cervejas premium. No ano passado, o mercado brasileiro de cerveja movimentou R$ 35 bilhões. As chamadas cervejas premium respondem por apenas 5% desse total. “O Brasil é um dos maiores mercados do mundo em volume e ainda muito primário em termos de variedades”, diz Altafter.
Todas as candidatas à compra da Schincariol trabalham com marcas premium e precisam começar a apostar desde já no crescimento desse mercado para não ficar muito atrás da líder – o grupo que controla a Ambev tem entre outras a Stela Artois. E esse é outro atrativo da Schincariol.
Nos últimos anos, a companhia baseada em Itu, no interior de São Paulo, fez importantes aquisições de marcas consideradas tops de mercado, como Baden, Baden e Eisenbahn. A última tentativa nessa seara foi o lançamento da marca Devassa, em 2010. O mercado estima que a Schincariol tenha investido R$ 10 milhões só na publicidade de lançamento da cerveja.
A estratégia de fazer da provocante socialite americana Paris Hilton a garota-propaganda da Devassa, em 2010, e de contratar a recatada cantora Sandy, como sua embaixadora no carnaval deste ano, mediante um cachê estimado em US$ 1 milhão – garantiu uma invejável exposição na mídia, mas não na geladeira do consumidor. Hoje a Devassa não tem mais do que 1% do segmento premium.
Ao contrário da irmã mais nova, a marca Schincariol mostra poder de fogo e resiste não só à concorrência feroz da Ambev, como aos problemas em seu comando. Quem administra a empresa é Adriano Schincariol, filho do fundador, Nelson Schincariol. Nelson foi assassinado em frente à casa em que morava em Itu, em 2003.
Dois anos depois, Adriano foi preso, junto com outros diretores da empresa, sob acusação de sonegação fiscal – um espectro que paira sobre a Schincariol desde tempos remotos. A empresa e a marca sobreviveram aos abalos e conseguiram manter a liderança no mercado do Nordeste por um bom tempo, mas, recentemente, foram superados pela Ambev.
A família não se manifesta sobre as negociações da venda, mas pessoas próximas a Adriano dizem que ele está propenso a aceitar a melhor oferta. Primeiro, porque está ficando cada vez mais difícil para uma empresa nacional concorrer com o poder de fogo multinacional da Ambev. Segundo a fonte, Adriano pode abrir mão da Schincariol, mas não do mercado de cerveja. “Ele vai pegar o dinheiro e investir em um novo negócio. Talvez no segmento premium”, comenta o amigo.
Veículo: Isto É Dinheiro